quarta-feira, 30 de março de 2022

UM BIÓGRAFO À ALTURA DO BIOGRAFADO: breves considerações acerca do livro de Eduardo Hoornaert: “Helder Câmara, uma vida que se fez Dom”

                                        UM BIÓGRAFO À ALTURA DO BIOGRAFADO:

breves considerações acerca do livro de Eduardo Hoornaert:

“Helder Câmara, uma vida que se fez Dom” *


Alder Júlio Ferreira Calado


A editora Paulus acaba de publicar uma biografia sobre Dom Helder Câmara, elaborada pelo historiador Eduardo Hoornaert.


Acabo de ler, ou melhor, de ouvir a leitura completa de uma biografia atípica acerca da veneranda figura de Helder Câmara. Com efeito, o biógrafo Eduardo Hoornaert se mostra muito atento, ao escrever uma biografia de Dom Helder, que, por várias razões, não se apresenta como “mais uma biografia”. Hoornaert surpreende na elaboração desta biografia, por várias razões.


A atipicidade de sua biografia resulta, primeiramente, do método utilizado. “Paralaxis” é um termo grego, muito apreciado pelo autor, que diz respeito a um determinado objeto que, ao se mover, apresenta alterações; e dependendo da posição em que se coloque o observador daquele objeto, este vai apresentando alterações. Como exímio historiador, Hoornaert, expressando ou não esta metodologia, a põe em prática em seus escritos e em seus pronunciamentos. Neste sentido, ele nos faz evocar Antoine de Saint Exupéry, para quem "todo ponto de vista é a vista de um ponto”. A condição de historiador constitui, também neste caso, um fator decisivo para a excelência do desempenho do autor, ao nos apresentar a figura de Helder Câmara, ao longo de sua trajetória existencial, como alguém atípico, no sentido de desbordar constantemente do comum dos humanos, ao revelar-se “avis rara”, seja no tocante às suas relações eclesiais, seja sobretudo no tocante à sua paixão pela humanidade. Outras biografias de Dom Helder tiveram reconhecida relevância, mas o livro do historiador Hoornaert aparece como um escrito diferenciado, a começar pela metodologia aplicada para a elaboração desta biografia.


Outro aspecto a ser observado, na excelência desta biografia, tem a ver com a capacidade do biógrafo de aplicar profusamente uma abordagem literária, profundamente complementar, do labor histórico. A utilização de técnicas da linguística e da literatura constitui uma marca fortemente criativa e que bem se mostra adequada à narração e à interpretação de uma figura incomum como a de Helder Câmara. Além disto, ou por conta disto, Hoornaert não se limita a descrever uma cronologia de fatos e acontecimentos protagonizados por Dom Helder. Isto também ele faz, com maestria. Mas, vai muito além deste aspecto, é capaz de ler as entrelinhas, de ir além das palavras, de dar-se conta do que vem por trás das palavras. Isto parece tanto mais relevante, quando a gente se reporta aos predicados do biografado, alguém que se apresenta excepcional, em sua trajetória existencial. Daí o sentido do título destas notas.


Graças a esta metodologia, aliada a uma acuidade de análise, baseada, além de preciosas fontes secundárias, também em fontes primárias, como a que recolhe das “cartas conciliares”, escritas às centenas por Dom Helder, e compartilhadas a uma equipe que ele mantinha como interlocutora privilegiada. Além das 275 cartas conciliares, escritas e compartilhadas por Dom Helder, com a sua equipe, de 1962 até inícios dos anos 80, Hoornaert também trata de recolher elementos de outras biografias, em especial as que foram elaboradas por pessoas mais próximas de Dom Helder, dentre as quais as de Marcelo Barros (Dom Helder Camara, profeta para os nossos dias); Zildo Rocha (Irmão dos pobres e meu irmão. Presença de dom Helder em minha vida); Joseph de Broucker (La violence d´un pacifique) e Marcos de Castro (Dom Helder, misticismo e santidade).


Outro aspecto ainda merece realce: a perspicácia do autor, no sentido de, partindo dos relatos do próprio Dom Helder, tratar de contextualizar, de modo criativo, acentuando possíveis fontes de inspiração de Dom Helder em autores de diferentes séculos. Neste particular, a biografia elaborada por Hoornaert apresenta-se relativamente singular, à medida que consegue apresentar diversos diálogos implícitos de Dom Helder com outros tantos autores, em diferentes séculos do cristianismo.


E em relação ao biografado, o que dizer? Exercitando a memória da leitura que me foi feita, trato de pôr em relevo os aspectos da trajetória existencial de Helder Câmara que mais fortemente me impactaram, no transcurso da leitura dos seus 12 capítulos. Cuido, por conseguinte, de, ao rememorar os principais capítulos do livro, expressar aspectos e traços mais impressionantes que colho da leitura desta biografia.


É tocante observar a precocidade vocacional do biografado, ainda que não fosse uma exceção - era comum a entrada até de adolescentes para o Seminário - não deixa de nos surpreender este fato. Influenciado pela sua mãe, D. Adelaide, mais do que pelo seu pai, em função da vida religiosa que ele respira desde muito cedo, sente-se tocado a uma escolha pelo sacerdócio. Ainda adolescente vai ser matriculado no famoso seminário da Prainha, em Fortaleza. Desde então, vai ter que conviver com um regime de muita disciplina, de uma formação conservadora, apesar de contar com alguns formadores que ele aprecia. É, portanto, condicionado a uma vida de fechamento para o mundo, para as realidades terrestres, em razão de uma rígida obediência às leis eclesiásticas. Dada, por outro lado, a formação que teve em sua família, conseguia lidar relativamente bem com a disciplina seminarística então reinante. Além dos laços familiares, sua veia poética muito o ajuda, nesta direção. Desde cedo, revela-se um leitor voraz, o que lhe permite um exercício bastante salutar, dentro daquele regime dominante.


Uma marca pouco conhecida da trajetória de Dom Helder é a sua estreita ligação com as ideias integralistas então reinantes no Brasil, sob a inspiração de intelectuais tais como Gustavo Barroso, Plínio Salgado, Alceu de Amoroso Lima, entre outros. Sobretudo de 1931 a 1936/37, Helder se revela um exímio militante da causa integralista. Para tanto, sua capacidade extraordinária de comunicação, além de certa tendência ao estrelismo, Padre Helder vai assumir um papel relevante na divulgação das ideias integralistas, baseadas em valores tais como Deus, Pátria, Família, entre outros. Vale notar que, acerca deste período, o biógrafo se vale de preciosas fontes, para indicar o relevante papel intelectual e religioso cumprido por Padre Helder, sobretudo neste período.


Em uma de tantas palestras feitas pelo teólogo José Comblin, desta feita por ocasião do centenário de Dom Helder Câmara, homenagem prestada por grupos e pessoas amigas de Dom Helder, em João Pessoa, o palestrante aludia a cinco surpreendentes conversões vividas por Dom Helder. Também nesta biografia, Hoornaert, de forma criativa e com palavras próprias, narra momentos fortes de conversão vivenciados por Dom Helder, no que o biógrafo enxergava seu processo evolutivo, desde um reacionário - período que dura em torno de 12 anos - a uma posição revolucionária que ele vai vivenciando, sobretudo a partir de meados dos anos 40.


Dentre esses momentos fortes de conversão, cumpre ressaltar alguns, como ilustração. Um desses momentos fortes ocorre quando da árdua preparação à organização do congresso eucarístico mundial, no Rio de Janeiro, arquidioceses da qual Dom Helder era bispo auxiliar. Ele se destacou como o principal organizador deste congresso, juntamente com a contribuição valiosa de um grupo de mulheres. Este trabalho o levou a uma quase exaustão, dado o modo como se empenhou, visando a apresentação de um congresso que considerava de enorme importância para a vida da Igreja Católica.


Quando da realização deste Congresso Eucarístico Mundial, em que todos os esforços envidados por Dom Helder e sua seleta equipe pareciam alcançar o auge de satisfação, eis que, ao final daquele Congresso, dele se aproxima o Cardeal Gerlier para confidenciar-lhe algo inesperado. Após enaltecer as qualidades de organizador reveladas por Dom Helder, o Cardeal lhe pergunta como silenciar uma cena intrigante: enquanto aquele Congresso Eucarístico se realizava, era visível uma cena deprimente, nos morros e favelas expostas a quem quisesse enxergar. De modo didático, o Cardeal provocava Dom Helder, como se lhe perguntasse: é este o fruto desejável pela Igreja Católica, ao louvar e adorar a Jesus na hóstia, e silenciar toda aquela miséria sofrida justamente por aqueles que representavam o próprio Jesus crucificado? Dom Helder, ao ouvir essas palavras, sente-se profundamente tocado, como se estivesse diante do próprio Jesus. Esta iniciativa do Cardeal Gerlier proporcionou uma das grandes conversões de Dom Helder, que a partir de então, passa a mudar profundamente suas atitudes perante os pobres, perante os deveres mais profundos do seu ministério.


Desde então, redireciona suas leituras e sua agenda pastoral. Passa a ter um olhar mais atento àquela realidade, de flagrantes desigualdades, me que ⅔ da humanidade padecendo fome e miséria enquanto uma pequena minoria tinha um tratamento privilegiado.


Outro aspecto relevante, em sua trajetória, tem a ver com sua participação como bispo auxiliar do Rio de Janeiro, durante todas as sessões do Concílio Vaticano II (1962 a 1965).


Dois fatos merecem especial destaque, durante este período: seu papel de instigador, de articulador de vários bispos provenientes das mais distintas regiões do mundo, no sentido de angariar convicções e votos para a aprovação dos documentos conciliares, especialmente voltados à defesa e a promoção dos direitos dos pobres. Embora não atuasse propriamente nas famosas aulas conciliares, empenhava-se profundamente em reunir diferentes grupos de Bispos para refletirem, sob a inspiração dos principais teólogos conciliares comprometidos com a causa da justiça, no sentido de fortalecer uma corrente ainda minoritária, no universo dos cerca de 2500 bispos participantes, de um grupo minoritário que sustentasse a causa dos pobres. Este esforço se culmina na realização, nos arredores de Roma, mais precisamente na catacumba de Domitila, de uma reunião de 40 Bispos que, há poucos dias do encerramento do Concílio Vaticano II, ou seja, mais precisamente no dia 16 de novembro de 1965, estes Bispos, após a celebração da Ceia do Senhor, firmam o famoso “Pacto das Catacumbas”, expresso em um texto composto com 13 itens, assumindo o compromisso de, ao retornarem às suas respectivas dioceses, não mais morarem em palácios, levarem uma vida cotidiana mais próxima do povo, dos pobres, seja quanto ao morar, seja quanto ao vestir, seja quanto ao uso de transporte, seja quanto à sua fidelidade a causa do Evangelho.


Outro aspecto que o período conciliar também aparece como relevante tem a ver com o início de suas célebres cartas conciliares, circulares que ele redigia, dirigindo-as a um seleto grupo de mulheres, no Rio de Janeiro, às quais ele escreverá, de 1962 a cerca de 1980, em torno de 275 cartas circulares, não por acaso, o biógrafo Eduardo Hoornaert explora, em seu trabalho, múltiplos relatos de capital importância, colhidos destas cartas circulares.


Outro ponto relevante a destacar: sua coragem profética de denunciar os crimes da ditadura empresarial-militar brasileira. Denúncias contra assassinatos de adversários e vítimas da ditadura, inclusive religiosos e padres, a exemplo do Pe. Antônio Henrique Pereira Neto, em 1969, de Frei Tito Alencar, denunciando ainda prisões e torturas nos subterrâneos da ditadura empresarial-militar. Esta sua atitude profética rendeu-lhe além de duras perseguições no brasil, também numerosos convites feitos por diferentes figuras do episcopado internacional, especialmente da Europa, principalmente para proferir conferências sempre muito concorridas. Em certas ocasiões, tal era o número de frequentadores, que os organizadores se viam obrigados a mudar o lugar da conferência, como aconteceu em Paris, em 1970.


Acerca desta movimentada agenda de viagens pelo mundo, importa registrar que o enorme apreço internacional dirigido ao então Arcebispo de Olinda e Recife, que figuras da Cúria Romana com possível anuência do própria Papa Paulo VI, não exitou em dirigir a Dom Helder correspondência questionando a legitimidade destas viagens internacionais, alegando estar usurpando a função petrina. Situação tanto mais embaraçosa, quando por várias vezes, Dom Helder foi recebido pelo Papa Paulo VI, velho amigo ainda do tempo em que não havia assumido o papado.


No tocante a estes laços de amizade, vale a pena, com base nas Cartas Circulares, rememorar um fato curioso. Dada sua vocação profética, nas conversas com o Papa Paulo VI, ele por mais de uma vez, questionou o Papa sobre as estranhas funções de Estado exercidas pela Igreja Católica, diferentemente do espírito do Evangelho (Mc 10, 42-45: Jesus chamou-os e disse: “Vocês sabem: aqueles que se dizem governadores das nações têm poder sobre elas, e os seus dirigentes têm autoridade sobre elas. Mas entre vocês não deverá ser assim: quem de vocês quiser ser grande, deve tornar-se o servidor de vocês, e quem de vocês quiser ser o primeiro, deverá tornar-se o servo de todos. Porque o Filho do Homem não veio para ser servido. Ele veio para servir e para dar a sua vida como resgate em favor de muitos.”). A certa altura, o Papa chegou a pedir a Dom Helder que lhe mandasse por escrito seu questionamento acompanhado de sugestões tais como a de entregar o prédio do Vaticano aos cuidados da ONU, indo o Papa residir em uma casa mais simples. Dom Helder não se fez de rogado, e enviou por escrito o que lhe havia dito por palavra. O Papa terá mudado de posição? Isto fica muito evidenciado em um dos poemas escritos por Dom Helder, no qual se lê:


“O SONHO DE DOM HÉLDER


Sonhei que o Papa enlouquecia 

E ele mesmo ateava fogo 

Ao Vaticano 

E à Basílica de S. Pedro... 

Loucura sagrada, 

Porque Deus atiçava o fogo 

Que os bombeiros 

Em vão 

Tentavam extinguir. 

O Papa, louco, 

Saía pelas ruas de Roma, 

Dizendo adeus aos Embaixadores 

Credenciados junto a ele; 

Jogando a tiara no Tibre; 

Espalhando pelos pobres 

O dinheiro todo 

Do Banco do Vaticano... 

Que vergonha para os cristãos! 

Para que um papa 

Viva o Evangelho, 

Temos que imaginá-lo 

Em plena loucura!... “


Acerca ainda destes tempos de chumbo, especialmente após a decretação pela ditadura empresarial-militar do famigerado AI-5, vale ressaltar a coragem profética de Dom Helder, também no que diz respeito aos seus escritos e pronunciamentos. Datam deste conturbado período livros corajosos que apareceram, inicialmente, apenas em francês, já que proibidos no Brasil. Dentre outros: “Révolution dans la paix”; “Spirale de violence”; “Le Désert est fertile”.


Quanto aos seus pronunciamentos, cumpre rememorar não apenas suas conferências, mas especialmente sua fala cotidiana, na rádio Olinda “Um Olhar Sobre a Cidade”. Tratava-se de um momento diário enormemente apreciado também pelas centenas de comunidades espalhadas pela Arquidiocese de Olinda e Recife (e para além desta região), mais conhecidas como “encontro de irmãos”, densa experiência de animação das CEBs da região. Trata-se de um período de intenso crescimento das CEBs, no Brasil e na América Latina. Causa indignação, no entanto, a terminante proibição da Ditadura empresarial militar, de sequer o nome de D. Hélder Câmara pudesse ser publicado pela imprensa. 

A despeito de todas essas adversidades, vale destacar a tenacidade de D. Hélder, o que se pode explicar pela sua mística revolucionária (tinha o hábito de colocar o relógio para despertá-lo às 02h00 da madrugada, para exercitar essa mística, seja pela oração, seja pela composição de poemas (às centenas). Não menos importante é o humor que o caracterizava. São diversas as histórias acerca disto. Apenas uma delas como ilustração: Num período de ascenso da “Revolução feminista”, expressa também no Brasil, conta-se que foi perguntado por um/a jornalista do que achava do topless. De pronto, D. Hélder respondeu algo como: eu não estou preocupado com quem tendo o que vestir, se desnuda, mas com quem não o que vestir… 


Eduardo Hoornaert, em sua biografia, reserva os últimos capítulos a uma interpretação grandiosa do legado de Dom Helder, no qual situa a paixão de Dom Helder pelas minorias, suas “minorias abraâmicas", bem como o espírito revolucionário de Dom Helder, sua mística revolucionária.


A título de arremate 


Ao final desta leitura, pude entender melhor o que de D. Helder dizia Comblin: dele se deve publicar tudo. Rememorando os feitos de Dom Helder, sinto-me impactado, ao compará-lo ao que hoje predomina no perfil geral do episcopado e demais ministros ordenados brasileiros, sempre ressalvando as honrosas exceções. Parece haver também aí, uma preocupante escassez de profecia… Nesse sentido, o quê dizer do apelo feito por Dom Helder, já enfermo, no leito, ao ser visitado por alguns teólogos, entre os quais, Marcelo Barros: "não deixem cair a profecia” (remetendo-nos a 1Ts 5, 19-21)?


Sinto-me agradecido a Eduardo Hoornaert pela arte do seu trabalho, bem como a diversos outros biógrafos de Dom Helder. Que este livro nos desperte cada vez mais o sentimento de compromisso com a causa libertadora do povo dos pobres.


*Este texto é resultado de uma gravação de áudio, feita pelo autor e digitada por Eliana Alda de Freitas Calado, Heloíse Calado Bandeira e Luciana Calado Deplagne, enquanto coube a Elizabete Santos de Pontes a leitura integral do livro para o autor. A elas, também a Eliana pela revisão do trabalho, registro meus agradecimentos.


João Pessoa, 30 de março de 2022.



quinta-feira, 24 de março de 2022

SEM JUSTIÇA, EM VÃO SE BUSCA A PAZ: ponderações e questionamentos acerca do atual conflito bélico entre Rússia e OTAN, nos campos de batalha de Ucrânia

 SEM JUSTIÇA, EM VÃO SE BUSCA A PAZ:

ponderações e questionamentos acerca do atual conflito bélico entre Rússia e OTAN, nos campos de batalha de Ucrânia


Alder Júlio Ferreira Calado

Alcançamos, neste 24 de março de 2022, um mês do início dos ataques bélicos a Ucrânia, provenientes da Rússia. A mídia hegemônica continua a repercutir, tal como um alto falante amplificado as versões sobre o conflito convenientes à OTAN. Algumas redes sociais e canais alternativos têm buscado situar o conflito, de modo mais crítico, sem santificar a Rússia ou Putin nem muito menos canonizar a OTAN e os Estados Unidos. 

Acerca deste conflito, importa, em primeiro lugar, reconhecer que não se iniciou no dia 24 de fevereiro próximo passado. Remonta, com efeito, pelo menos a 2014. Sem buscar perceber este conflito, não como apenas um produto, mas como um processo, temos que recuar, até mesmo, para aquém de 2014. De fato, os conflitos bélicos da atualidade podem ser melhor percebidos, desde o início da chamada Guerra Fria, contrapondo, de um lado, os Estados Unidos e a Europa Ocidental, e, por outro lado, os países componentes da ex União das Repúblicas Socialistas Soviéticas URSS, opondo frontalmente os valores do Socialismo Soviético aos do Capitalismo Ocidental.

A Guerra Fria era o ambiente propício para a deflagração ideológica de propaganda dos valores correspondentes a cada polo em conflito. Neste sentido, é que se deve lembrar, de um lado a formação do bloco capitalista, mais precisamente das forças armadas ocidentais, representadas pelo Organização do Tratado do Atlantico Norte (OTAN), compreendendo, ainda na segunda metade dos anos 40, em torno de 14 membros, e, por outro lado, em resposta e reação a estas forças armadas do Ocidente, a criação do Pacto de Varsóvia, originado poucos anos após a criação da OTAN, e compreendendo todos os membros da ex-URSS.

Com o declínio progressivo do ideário sustentado pela ex-URSS, chegando a sua dissolução completa em 1991, e já não tendo mais sentido a Guerra Fria, e também não a continuidade da OTAN, pois havia sido dissolvido o pacto de Varsóvia, era de se esperar que a OTAN, enquanto tal, também se desfizesse. Isto se revela tanto mais esperado, que o então chefe do Departamento de Estado - correspondente a algo como o Ministério das Relações Exteriores -, dos EUA, James Baker, veio assegurar publicamente, em um dos encontros com lideranças russas, Boris Iéltsin, que a OTAN não avançaria sequer uma polegada, a partir dalí, em direção ao leste europeu. Dava-se, então, como resolvido o impasse, de modo a já não ameaçar a segurança da Rússia de então.

Promessa descumprida, mais de uma vez. Aquela época a OTAN se constituía de 14 membros, eis que nos dias atuais, a OTAN já conta com 30 membros, estendendo-se até os Países Bálticos (Lituânia, Letônia e Estônia). De modo a praticamente cercar a Rússia, só faltando à OTAN conquistar a Ucrânia para fechar o cerco. Por conta deste desrespeito a um acordo oral firmado pelos dirigentes das principais potências, a Rússia passou a se manifestar contrária a este quadro, passando, desde então, a tomar iniciativas que, em tempos normais, seriam condenadas por todos: a Rússia passou a anexar a Criméia, depois a controlar a Geórgia. Com relação a Ucrânia, até 2014, estava no governo um presidente de boas relações com a Rússia. No entanto, em 2015, sob a influência e manobra dos Estados Unidos, este governo foi destituído por um Golpe, resultando daí uma situação deveras periclitante para a paz. Não resultaram positivos alguns passos empreendidos pela Rússia, no sentido de conter o avanço incontrolável por parte da OTAN, ameaçando cercar a Rússia, sobretudo com a contribuição explícita do governo da Ucrânia. Ao mesmo tempo, algumas áreas da Ucrânia mais próximas da Rússia, são habitadas por populações que se reconheciam etnicamente russas, sendo, por isso, constantemente atacadas por forças milicianas, com a complacência do exército da Ucrânia, essas regiões: a de Donetsk e de Luhansk. Igualmente, no plano político-ideológico, grupos neonazistas passavam a ter uma visibilidade cada vez maior, na Ucrânia, sendo protagonistas de vários episódios sangrentos contra trabalhadores e trabalhadoras que se identificavam com a Rússia.

É assim que, a partir de 2021, a Rússia, que se preparara militarmente durante anos, para um enfrentamento exitoso desta situação, passa a cobrar do governo da Ucrânia que respeite o tratado de Minsk, pelo qual as regiões as regiões do Donbass onde se localizam as áreas de Donetsk e de Luhansk, fossem reconhecidas como não apenas regiões separatistas, mas como repúblicas autônomas. Enquanto isso a OTAN continuava a fomentar armas de guerra à Ucrânia como já havia fomentando todos os países em volta da Rússia, nações antes pertencentes a ex - URSS. O governo da Rússia dirigi-se a OTAN, cobrando o cumprimento dos acordos de Minsk. 

Recebendo negativas do Ocidente, Putin declara uma “operação militar especial” em território da Ucrânia, com os objetivos de defender a região de Donbass, buscar desnazificar a Ucrânia e exigir do governo da Ucrânia a desmilitarização do território, o que implicava não pertencer a OTAN.

A guerra continua, durante esses dias, com saldos terríveis de vítimas, de crianças, de mulheres, de civis, tanto vítimas fatais quanto centenas de feridos. Por outro lado, forma-se no Ocidente uma ampla rede de defesa a crítica do que vem acontecendo na Ucrânia, de modo a fazer crer que, neste conflito, a Rússia seja a única culpada, sem qualquer reconhecimento de responsabilidade por parte dos EUA ou da OTAN como co-protagonistas deste conflito.

Nas linhas que seguem, gostaríamos de fazer alguns questionamentos acerca de como o Ocidente em geral, inclusive os grupos cristãos, vêm analisando este drama.

No caso dos católicos, a palavra de ordem não ultrapassa o grito “PAZ! PAZ!”, indicando a Rússia como única transgressora. Pretende-se, uma paz, a qualquer custo, desde que a OTAN e os EUA estejam tomados como inocentes. Até mesmo a maior parte dos discursos proferidos pelos principais representantes da Igreja Católica também vão nesta mesma direção.

Assim agindo, parece haver um bizarro esquecimento de que sem justiça, em vão se busca a paz. Neste sentido, é lamentável o esquecimento da máxima que caracteriza, inclusive, os discursos dos últimos Papas, também do próprio Papa Francisco. Discursos dirigidos contra a guerra, contra a corrida armamentista, contra o armamento nuclear. Trata-se aí sim, de jamais dissociar a busca da paz pelo cumprimento da justiça. Lema importante, inspirado no profeta Is 32,17a: “O fruto da justiça será a paz”. 

Com efeito, para mencionarmos apenas os Papas mais recentes, vale a pena rememorar passagens célebres de seus discursos e de seus escritos. Comecemos pelo Papa João XXIII, em cuja Encíclica Social “Pacem in Terris” escrita em 1963, em pleno clima de Guerra Fria.

No ano anterior, em 1962, o mundo foi vítima de enorme tensão, por conta da instalação em Cuba, por parte da ex-URSS de mísseis apontando para os EUA, conflito que foi diplomaticamente solucionado. É neste contexto de tensão, que se pode ler na “Pacem in Terris”, sobretudo os números 110, 111 e 112, a posição profética do Papa João XXIII. Eis o que ele escrevia, em rápidas palavras:  “Costuma-se justificar essa corrida ao armamento aduzindo o motivo de que, nas circunstâncias atuais, não se assegura a paz senão com o equilíbrio de forças: se uma comunidade política se arma, faz com que também outras comunidades políticas porfiem em aumentar o próprio armamento. E, se uma comunidade política produz armas atômicas dá motivo a que outras nações se empenhem em preparar semelhantes armas, com igual poder destrutivo.” (n.110). Eis o que diz o número seguinte da Encíclica “Já que as armas existem e, se parece difícil que haja pessoas capazes de assumir a responsabilidade das mortes e incomensuráveis destruições que a guerra provocaria, não é impossível que um fato imprevisível e incontrolável possa inesperadamente atear esse incêndio. Além disso, ainda que o imenso poder dos armamentos militares afaste hoje os homens da guerra, entretanto, a não cessarem as experiências levadas a cabo com uns militares, podem elas pôr em grave perigo boa parte da vida sobre a terra.” (n.111). No número 112 da mesma Encíclica, o Papa João XXIII se mostra assertivo ao afirmar: “Eis por que a justiça, a reta razão e o sentido da dignidade humana terminantemente exigem que se pare com essa corrida ao poderio militar, que o material de guerra, instalado em várias nações, se vá reduzindo duma parte e doutra, simultaneamente, que sejam banidas as armas atômicas; e, finalmente, que se chegue a um acordo para a gradual diminuição dos armamentos, na base de garantias mútuas e eficazes.” (n.12).

É triste, porém, constatar que passados 60 anos, a corrida armamentista não só não se conteve, mas tem evoluído de modo catastrófico. Hoje, são vários os países que detêm armas nucleares: EUA, Rússia, Reino Unido, França, China, Índia, Paquistão, Israel, Coreia do Norte. Destes países, Estados Unidos e Rússia detém quase 90% destes armamentos. Não é à toa que o orçamento dos EUA consagra parte significativa dos gastos com armamento: só para 2022 o Senado dos EUA aprovou um orçamento de US$ 768 bilhões para “defesa”... e o quê dizer de suas bases militares instaladas em cerca de 80 países pelo mundo.


Retomando os posicionamentos mais recentes da Igreja Católica, importa ter presentes as palavras do Concílio Vaticano II, nos termos da Constituição Pastoral "Gaudium Et Spes”: “A corrida aos armamentos. É verdade que não se acumulam as armas científicas só com o fim de serem empregadas na guerra. Com efeito, dado que se pensa que a solidez defensiva de cada parte depende da sua capacidade de resposta fulminante, esta acumulação de armas, que aumenta de ano para ano, serve, paradoxalmente, para dissuadir possíveis inimigos. Muitos pensam que este é hoje o meio mais eficaz para assegurar uma certa paz entre as nações. Seja o que for deste meio de dissuasão, convençam-se os homens de que a corrida aos armamentos, a que se entregam muitas nações, não é caminho seguro para uma firme manutenção da paz; e de que o pretenso equilíbrio daí resultante não é uma paz segura nem verdadeira.” (N.81).


Apenas dois anos após o encerramento do Concílio Vaticano II, Paulo XI publica a memorável Encíclica Social intitulado "Populorum Progressio" (sobre o desenvolvimento dos povos), na qual se lê: “Por outro lado, quem não vê que um tal fundo facilitaria a reconversão de certos esbanjamentos que são fruto do medo ou do orgulho? Quando tantos povos têm fome, tantos lares vivem na miséria, tantos homens permanecem mergulhados na ignorância, tantas escolas, hospitais e habitações, dignas deste nome, ficam por construir, torna-se um escândalo intolerável qualquer esbanjamento público ou privado, qualquer gasto de ostentação nacional ou pessoal, qualquer recurso exagerado aos armamentos. Sentimo-nos na obrigação de o denunciar. Dignem-se ouvir-nos os responsáveis, antes que se torne demasiado tarde.” (N. 53).



Posição parecida se observa nos escritos e pronunciamentos dos Papas seguintes, inclusive de João Paulo II e Bento XVI. No entanto, cumpre destacar vários pronunciamentos incisivos de denúncia feita pelo Papa Francisco, em diferentes circunstâncias, a exemplo do que se lê no discurso pronunciado em sua visita apostólica ao Japão, em 2019: “O uso da energia atômica para fins bélicos é, hoje mais do que nunca, um crime, não só contra o homem e a sua dignidade, mas contra qualquer possibilidade de futuro na nossa Casa comum. O uso da energia atômica para fins de guerra é imoral, assim como a posse de armas atômicas é imoral, como eu disse dois anos atrás. Seremos julgados por isso.” (Papa Francisco no Memorial da Paz em Hiroshima, 24 de novembro de 2019) https://www.vaticannews.va/pt/papa/news/2020-08/hiroshima-nagasaki-holocausto-nuclear-papa-francisco.html 


No entanto, os pronunciamentos mais recentes do Papa Francisco não parecem ultrapassar o sentimento de indignação contra a guerra, mas sem tocar propriamente nas raízes da Guerra, de modo a deixar entender a opinião pública que o problema da guerra depende, quase somente, da posição intransigente do presidente da Rússia. Neste sentido, gostaríamos de suscitar a um questionamento:

  • Por que nos posicionamentos públicos das autoridades da Igreja Católica, não se tem a assumir uma posição profética, de modo a conectar a paz com a justiça, e, portanto, não apenas a expressão de votos pela paz, como também a indicação das raízes deste conflito? 


Clamar pela paz e pelo socorro às vítimas é tarefa incontestável, imediata. Mas, desconectada de um contexto mais amplo não pode incorrer no risco de uma responsabilização unilateral das forças em conflito?

  • Do ponto de vista do Evangelho, não parece inevitável clamar-se pela paz, perguntando-se pelas causas e pela responsabilidade de todos os lados ouvidos?

  • Especificamente neste conflito, o Papa Francisco tem-se cercado de conselheiros, também não ocidentais?

  • O justo clamor por socorro às vítimas não deveria ser acompanhado pelo alerta contra os riscos de socorro seletivo?

  • Perseguindo, sem cessar, a busca de um desarmamento geral, também perguntamos? Enquanto este objetivo não for alcançado, será que alguma potência pode tem o direito de proibir que outros países também se armem?


João Pessoa, 24 de Março de 2022.


sexta-feira, 18 de março de 2022

FORMAÇÃO MISSIONÁRIA ANTE OS ATUAIS DESAFIOS: O LUGAR DA MEMÓRIA HISTÓRICA

 FORMAÇÃO MISSIONÁRIA ANTE OS ATUAIS DESAFIOS:

O LUGAR DA MEMÓRIA HISTÓRICA*


ALDER JÚLIO FERREIRA CALADO



Diante da multiplicidade e da complexidade de desafios sócio-eclesiais - a crueldade de uma guerra, a letalidade de uma pandemia, a crise de emergência.

climática, o colapso da economia, os desmandos da necropolítica, as profundas contradições do cristianismo atual, inclusive da Igreja Católica, o desvario do fundamentalismo religioso, a profunda crise ética de nossos tempos, entre outros -, enquanto discípulos e discípulas, enquanto missionários e missionárias fiéis aos valores do Reino de Deus e Sua Justiça, somos instados a reavaliar criticamente e a aprimorar o trabalho de formação, como um instrumento (ao lado do processo organizativo e de mobilização) de enfrentamento exitoso de tais desafios.

No exercício contínuo do processo formativo, somos chamados a ter presentes diversos elementos (análise de conjuntura, planejamento, trabalho temático a altura dos nossos desafios, protagonismo de docentes e discentes, metodologia compatível com o horizonte da formação,  avaliação contínua, entre outros). Nas linhas que seguem, limitamo-nos a examinar o lugar específico da memória histórica, no processo de formação missionária, precedida de uma breve rememoração do sentido de Missão.


Chamados e enviados


A despeito de honrosas exceções entre pessoas e grupos envolvidos, no âmbito da Igreja Católica, vem sendo frequente a observação de um crescente hiato entre Discipulado e Missão. Com efeito, não obstante sólida fundamentação bíblica - veterotestamentária e neotestamentária -, constata-se uma tendência a uma dissociação entre Discipulado e Missão. Por vezes, até parece um bizarro “esquecimento” de nossas raízes cristãs: “sai de tua terra e vai aonde te mostrarei” (Gn 12,1); “Olha, ponho-te neste dia sobre as nações, e sobre os reinos, para arrancares, e para derrubares, e para destruíres, e para arruinares; e também para edificares e para plantares” (Jr 1:10”); “Não foram vocês que me escolheram; pelo contrário, fui eu que os escolhi para que vão e deem fruto e que esse fruto não se perca.” (Jo 15, 16). Parece um esquecimento de nossas raízes nômades, de discípulos e discípulas desinstalados e desinstaladores, missionários itinerantes ou, como costuma dizer o Papa Francisco, “uma Igreja em saída”. Vã tentativa de centrar no templo nosso Discipulado, desconectado da Missão, em especial de missionárias e missionários enviados aos empobrecidos, aos oprimidos, aos marginalizados. 

Eis um desafio de monta que somos chamados a enfrentar, buscando inspirarmos constantemente em tantos membros eclesiais, por exemplo, dos anos 70 e 80, comprometidos com a causa libertadora dos oprimidos.

Nesta perspectiva, é que nos sentimos provocados pelo Espírito do Ressuscitado, a nos converter continuamente em membros de uma “Igreja em saída” para tanto, somo instados a trabalhar, de modo crítico e autocrítico, nosso processo formativo, sempre conectado ao nosso processo organizativo e celebrativo.


O lugar da memória histórica em nosso processo formativo na e para a Missão

Insistimos em que, como acima dito, na perspectiva do Seguimento de Jesus, nosso compromisso missionário pressuponho um contínuo processo organizativo, formativo e celebrativo. No que toca, especificamente, a dimensão formativa, convém destacar, pelo menos três componentes intimamente conectados: o da memória histórica (passado), o da ortopraxia (presente), e o da esperança (em perspectiva). 

Especialmente no que diz respeito a memória histórica, importa por em relevo o sentido com que trabalhamos esta dimensão. Não se trata de uma revisitação saudosista ao passado, por mais interessante que isto também possa ser. Trata-se, sim, de um exercício de constante busca às nossas raízes, como um exercício empenhativo e reparador das experiências históricas características do povo dos pobres: movimentos populares, “minorias abraâmicas” (Dom Helder Câmara), grupos e pessoas em situação de exploração, opressão, marginalização.



A relevância pedagógica das biografias


A memória histórica, seja em sua versão coletiva, seja em sua dimensão individual, proporciona uma série de elementos, de critérios, por meio dos quais temos a oportunidade de, a medida que vamos rememorando, fatos, situações e acontecimentos do passado, vamos, ao mesmo tempo, tomando consciência de passos decisivos para o êxito dos enfrentamentos, bem como os passos equivocados que implicaram reveses, tanto no âmbito macro-social, como no campo eclesial.


O exercício da memória histórica pode ter uma semelhança com o exercício da mística, seja da mística revolucionária (numa linguagem laica), seja no que concerne ao processo de conversão (numa linguagem mais própria dos seguidores e seguidoras do movimento de Jesus). Revisitar acontecimentos, fatos e situações do passado, por exemplo, em sua dimensão coletiva, supõe, fazer uma análise crítica do que foi vivenciado, seja enquanto conquistas, ganhos, seja enquanto reveses. Trata-se de um exercício de crítica e autocrítica, no sentido de que nos permite analisar os processos realizados, seja quanto aos objetivos, seja quanto aos protagonistas, seja quanto à metodologia utilizada, seja quanto à avaliação, etc.


A memória histórica, do ponto de vista macro-social, nos permite examinar, de modo criterioso, as causas, as circunstâncias, as atitudes coletivas e individuais, os ganhos, os reveses. Permite, também, que passemos em revista, grandes acontecimentos históricos, transformações sociais de grandes alcances, processos revolucionários, modo de atuação, comportamento dos protagonistas, objetivos alcançados ou fracassados, enfim, diferentes aspectos desse mesmo processo.


No âmbito estritamente eclesial, o exercício da memória histórica nos permite reexaminar criticamente os vários períodos da história (da Igreja - Católica, Ortodoxa, Reformada), de que modo os seus protagonistas atuaram em sua busca de segmento do movimento de Jesus, ou, ao contrário, seu distanciamento, das origens do próprio cristianismo, convertendo em projeto de poder, do qual o clero foi o único beneficiado.


A memória histórica, pode ainda, ser exercitada do ponto de vista pessoal. Neste sentido, convém destacar a relevância de se estudar a história de vida de grandes figuras da história, bem como do âmbito eclesial. O estudo de biografias de figuras de referência constitui uma ferramenta relevante, num processo de formação missionária. Com efeito, os formandos e formandas, os formadores e formadoras sempre encontram elementos de exemplaridade em figuras, seja no plano macro-social, seja no plano eclesial. Trata-se de proporcionar aos educandos e educandas a ocasião de travar conhecimento da trajetória de vida de figuras consideradas emblemáticas. Neste sentido, no processo formativo missionário, convém reservar um tempo precioso para o exame na trajetória de vida de muitas pessoas que atuaram, seja no âmbito macro-social, seja no âmbito eclesial, como exemplos vivos dos quais podem ser extraídos muitos elementos intuitivos, válidos para o enfrentamento para os desafios atuais. 


A formação missionária, no âmbito da Memória Histórica 


No Movimento de Jesus, o horizonte perseguido é sempre o Reino de Deus e sua justiça, sempre tendo a humanidade como seu grande horizonte. a Tradição de Jesus transcende fronteiras eclesiais, espaços Cristãos e de outras religiões. Conforme o lema Episcopal de Dom Pedro Casaldáliga, trata-se de “Humanizar a Humanidade”. 


Neste sentido, é que o Horizonte Missionário, bebendo na fonte da Trajetória de Jesus de Nazaré, destina-se a todo o gênero humano. É assim que a formação missionária se alimenta da Memória Subversiva, empenhativa e de compromisso com a causa libertadora dos oprimidos. Bebe na fonte do gesto que Jesus testemunhou, por ocasião da Última Ceia, ao levantar-se em direção ao seus discípulos, para lavar-lhes os pés, ao mesmo tempo em que ordenou aos seus discípulos e discípulas que fizessem o mesmo entre si. 


A missão é sempre alimentada pela memória subversiva de Jesus que enfrentou abertamente os poderosos do seu tempo, as forças políticas e religiosas: Doutores da Lei, Escribas, Fariseus, além dos representantes políticos do Império Romano, pelos quais Jesus seria condenado, torturado e assassinado.


Ao longo de séculos, ainda que constituindo pequenas minorias - “minorias Abraâmicas" -, sempre houve testemunhas proféticas a enfrentarem os “donos do poder”, em todos os períodos históricos, também hoje. 


Eis porque, seja no plano coletivo, seja no plano pessoal, a formação missionária não deve prescindir do exercício da Memória Histórica. Resulta fundamental, por consequência,  a rememoração contínua de lutas sociais, protagonizadas por diferentes movimentos sociais, das quais importa acentuar conquistas, avanços reveses, protagonistas, estratégias e lições a serem recolhidas. A título de exemplo, vale destacar experiências de lutas, desde a Antiguidade (ver, por exemplo, a luta dos escravos liderados por Spartacus) contra o Império Romano; vale ainda destacar diversos movimentos palperísticos na Idade Média; a modernidade e a contemporaneidade, igualmente, despontam como cenários de lutas relevantes (Revolução Francesa, a Comuna de Paris, a Revolução Russa, Revolução Chinesa, Revolução Cubana e várias outras). Aos formandos e formandas no campo da Missão importa examinar estes acontecimentos como forma de identificar neles a presença do Espírito do Ressuscitado, atentando sempre para as lições a serem recolhidas.


Assim como no plano coletivo, cumpre também acentuar a importância do exercício da Memória, no que diz respeito às experiências de pessoas cuja trajetória e cujo testemunho de vida são reconhecidos como referência e inspiração para as gerações de hoje e de amanhã. Aqui lidamos mais diretamente com histórias de vida ou biografias. 


Para tanto, vale a pena destacar, a título de exemplo, a biografia de algumas figuras emblemáticas. 


A memória histórica no processo de formação missionária pode, por conseguinte, ser exercitada por meio de biografias e de relatos de experiência coletiva. Deste ponto de vista, convém, a título de ilustração de alguns casos, incentivar a leitura ou o acompanhamento de textos de reconhecida relevância, quanto à perspectiva de luta, de organização, de testemunhos de movimentos populares, de organizações de base de nossas sociedades, cujo teor pode contribuir enormemente no processo formativo de missionários e missionárias, também em nossos dias. Neste sentido, poderíamos iniciar esta série de indicações bibliográficas e de filmes que apontam para as fontes mais consistentes de inspiração missionária.


Em relação, por exemplo, à própria figura de Jesus de Nazaré, indicamos, entre outros, os seguintes textos:


  • PAGOLA, José Antônio. Jesus, aproximação histórica. Petrópolis: Editora Vozes, 2010.

  • COMBLIN, José. Jesus de Nazaré. Petrópolis: Editora Vozes, 1975.

  • BENEDITO, Ferraro. O processo de Jesus. Petrópolis: Editora Vozes.

  • ECHEGARAY, Juan. A prática de Jesus. Petrópolis: Editora Vozes, 1984.

  • CASTILLO, José Maria. Jesus: a humanização de Deus. Petrópolis: Ed. Vozes, 2015.

  • HOORNAERT, Eduardo. Origens do cristianismo. São Paulo: Paulus.

  • HOORNAERT, Eduardo. Memória do povo cristão. Petrópolis: Ed. Vozes, 1986.


No plano da evolução do cristianismo, principalmente a partir do século IV, convém destacar algumas contribuições relevantes. De autoria de José Comblin:


  •  COMBLIN, José. Vocação para a liberdade. São Paulo: Ed. Paulus, 1998;

  • COMBLIN, José. O caminho. São Paulo: Ed. Paulus, 2007;

  • COMBLIN, José. A profecia na Igreja. São Paulo: Ed. Paulus, 2008;

  • COMBLIN, José. O Espírito Santo e a Tradução de Jesus. Ed. Nhanduti, São Bernardo do Campo, 2012.


No tocante a relatos históricos voltados para uma interpretação de movimentos populares de libertação, ao longo da história, convém ressaltar algumas contribuições:

  • Arthur Tavares Brito (Peregrino) - tese de doutorado "À SOMBRA DO JUAZEIRO: as transformações da experiências religiosa popular no Juazeiro do Padre Cícero (1986-2016)” (UNICAP 2020) http://tede2.unicap.br:8080/bitstream/tede/1316/5/Ok_jose_artur_tavares_brito.pdf 

  • O filme “Spartacus”, interpretando a saga das lutas de libertação contra o Império Romano;

  • Bloch, Ernst. “Thomas Müntzer, o teólogo da revolução”, narrando a atuação revolucionária de Thomas Müntzer, uma liderança relevante dos camponeses em resistências aos príncipes da nobreza alemã; (Ed. Tempo brasileiro, 1973)

  • Livros e documentários sobre a Comuna de Paris;

  • Textos e documentários em torno da figura libertária de Louise Michel, uma das mulheres protagonistas da Comuna de Paris;

  • GALEANO, Eduardo. As veias abertas da América Latina; Ed. L&PM, 2010, edição original 1971.

  • FERNANDES, Florestan. A integração do negro na sociedade de classes. Ed. Biblioteca Azul, 2008.

  • GORENDER, Jacob. O escravismo colonial. Ed. Expressão Popular, 2016.

  • FREITAS, Décio. Palmares: a Guerra dos Escravos. Ed. Mercado Aberto, 1984.

  • ____________. O escravismo brasileiro. Ed. Mercado aberto, 1991.

  • LUGON, Clovis. A República Comunista Cristã dos Guaranis. Ed. Paz e Terra, 1976.

  • MOURA, Clovis. Sociologia do negro brasileiro. Ed. Perspectiva, 2019.

  • CHIAVENATO, Júlio. Lutas do povo brasileiro. Ed. Moderna, 2008

  • _______________. O golpe de 1964 e a ditadura militar. Ed. Moderna, 2014.

  • RIBEIRO, Darcy.O povo brasileiro. Ed. Companhia das letras, 1995.

  • SILVA JÚNIOR, Edson Teixeira. Carlos, a face oculta de Marighella. Ed. Expressão Popular, 2009.

  • CALLADO, Antônio. Tempo de Arraes. Ed. Paz terra, 1964.

  • ______________. Os Industriais da Seca e os Galileus de Pernambuco. Ed. Civilização Brasileira, 1960.

  • SOUZA, João francisco de. Uma Pedagogia da Revolução. Ed. Cortez, 1978.

  • FREIRE, Paulo. Pedagogia da esperança. 

  • SANTIAGO, M. Eliete & BATISTA NETO, José.

  • Memórias do povo. João Pedro Teixeira e as Ligas Camponesas na Paraíba. Deixemos o Povo Falar. Editora Ideia, 2006. PDF: http://www.ligascamponesas.org.br/wp-content/uploads/MEMORIAS%20DO%20POVO%20-%20Joao%20Pedro%20Teixeira%20e%20as%20Ligas%20Camponesas%20na%20PB.pdf

  • GORENDER, Jacob. Combate nas Trevas. São Paulo: Ática, 1987.

  • _________, Jacob. O Escravismo Colonial. São Paulo: Expressão Popular, 2016.

  • GABEIRA, Fernando. O que é isto, companheiro?. São Paulo: Companhia das Letras, 1979.

  • MIELE, Neide; GODOY, Rosa Maria; BANDEIRA, Lourdes. Eu marcharei na tua luta: a vida de Elizabeth Teixeira. João Pessoa, Editora Universitária, 1997.

  • Documentário sobre “Terras para Rose”. ver em: https://www.youtube.com/watch?v=1ZlqjK4K1-0 ;

  • Filmes diversos sobre a ditadura militar, no Brasil (“Capitão Lamarca”, “O dia que durou 21 anos”, “Marighella”, “Batismo de Sangue”, entre outros)

  • MUGGLER, Mônica. José Comblin, uma vida guiada pelo Espírito. São Bernardo do Campo: Nhanduti, 2012;

  • HOORNAERT, Eduardo. Helder Câmara, uma vida que se fez Dom. São Paulo: Ed. Paulus, 2022;

  • Vale a pena consultar o blog de Eduardo Hoornaert: http://eduardohoornaert.blogspot.com/ 

  • _____________, “Os anjos de Canudos” (ed. Vozes)

  • LARRAÑAGA, Inácio Larrañaga.O irmão de Assis. São Paulo: Ed. Paulinas, 1998;

  • MURPHY, Roseane. Mártir da Amazônia a Vida da Irmã Dorothy Stang. São Paulo: Paulus, 2008.

  • OLIVEIRA, Frei Roberto Eufrásio de. Experiências missionárias no Nordeste. João Pessoa, Ed. Ideia, 2003;

  • _____________, Caminhando com Jesus nos Sertões Nordestinos.;

  • SILVA, Romero Venâncio da. A crítica da religião em MARX: 1840-1846. Tese de doutorado 2010 https://repositorio.ufpb.br/jspui/handle/tede/5681?mode=full&locale=pt_BR ;

  • GUEDES NETO, Adauto. Por um novo jeito de ser Igreja : a trajetória do padre José Comblin na América Latina em tempos de ditaduras (1964-1985);

  • SANTOS, Elenilson Santos. AS SANDÁLIAS DO PROFETA: Narrativas acerca do padre José Comblin e sua contribuição para a Igreja dos Pobres na Paraíba, uma perspectiva das Ciências Empíricas das Religiões. 2021;

  • COMBLIN, José. O Espírito no mundo. Petrópolis: Vozes, 1978;

  • LYRA, José Hailton Bezerra. Espiritualidade a Liberdade Profética do Espirito. João Pessoa: Ed. Ideia, 2000;

  • SALES, Ivandro da Costa. Os desafios da Gestão Democrática da sociedade (Em diálogo com Gramsci). Pernambuco, UFPE, 2003.

  • MONTENEGRO, Antônio. Travessias, padres europeus no Nordeste do Brasil (1950-1990), Recife: CEPE, 2019;

  • GEBARA, Ivone. Teologia Ecofeminista. São Paulo: Editora Olho d'Água, 1997.

  • FORCADES, Teresa. A Teologia Feminista na História. Lisboa, Editora Presente.

  • FRAGOSO, Antônio Batista; GONÇALVES, Luiz Gonzaga; FRAGOSO, João; CALADO, Alder. Igreja de Crateús, uma Experiência Popular e Libertadora. 1964-1998. São Paulo, editora Loyola, 2005;

  • FRAGOSO, Antônio Batista. Evangelho e Revolução Social. Lisboa, 1974.

  • JOSAPHAT, Frei Carlos. Evangelho e Revolução Social. São Paulo: Duas Cidades, 1962.

  • SPONG, John Shelby. Um novo cristianismo para o mundo; a fé além dos dogmas. Campinas: Verus Editora, 2006.

  • HOBSBAWM, Eric. A era dos extremos. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.

  • Última entrevista concedida por Dom Fragoso a Luiz Gonzaga Gonçalves, João Fragoso e Alder Calado; https://kairosnostambemsomosigreja.wordpress.com/2011/01/15/profeta-dos-pobres-dom-fragoso-nos-fala-livro-em-pdf/ 

  • NETTO, José Paulo. Karl Marx — uma biografia. São Paulo: Boitempo, 2020.

  • COUTINHO, Carlos Nelson. Gramsci. Um Estudo Sobre Seu Pensamento Político. editora Civilização Brasileira, 1981);

  • ARAÚJO, Luiz Carlos. A Heresia Primordial. Recife, 2002;

  • SOARES, Sebastião Armando Gameleira. Espiritualidade em tempos de crise.

  • LOWY, Michael Löwy. O que é cristianismo da libertação? Religião política na América Latina. Editora Fundação Perseu Abramo e Expressão Popular, 2016;

  • Marcelo de Barros, “Teologia da Terra” (Ed. Vozes, 1988);

  • Alberto Acosta "O bem Viver: uma Oportunidade Para Imaginar Outros Mundos" (Ed. Autonomia Literária, 2016);

  • Frei Betto “Batismo de Sangue Guerrilha e Morte de Carlos Marighella” (Ed. Rocco, 1982);

  • Leonardo Boff “Igreja: Carisma e Poder” (Ed. Vozes, 1982);

  • Gregório Bezerra. “Memórias” (Ed. Boitempo, 1979);

  • Paulo Suess “Evangelizar - a Partir dos Projetos Históricos dos Outros” (Ed. Paulus, 1995);

  • Henrique Dussel, 1492. Petrópolis, Vozes. 

  • Carlos Augusto Júnior: Fundação Dom José Maria Pires: uma experiência de Educação Popular- Serra Redonda-PB, Ano de Obtenção: 2014.

  • Zé Brasil descobre a sociedade.

  • Resende, Maria Valéria. A vida rompendo muros: Carisma e Instituição; As pequenas comunidades religiosas femininas inseridas no meio popular do NE; ; 1999; 0 f; Dissertação (Mestrado em Programa de Pós Graduação Em Sociologia) - Universidade Federal da Paraíba.

  • BENJAMIN, Walter. o capitalismo como religião. São Paulo: Boitempo, 2013.

  • José Adilson Filho e Bruno Gaudêncio (orgs.). Sob o signo da fé; memória, poder e protagonismo de padres da Paraíba e em Pernambuco. Rio de Janeiro: Telha, 2021.

  • Pereira, Luiz Barros. ORAÇÃO DO OFÍCIO DIVINO DAS COMUNIDADES NA FRATERNIDADE DO  DISCÍPULO AMADO NO TEMPO DA PÁSCOA. TCC. UNICAP, 2014. 

  • MESTERS, Carlos. “Esperança de um povo que luta; o Apocalipse de São João: uma chave de leitura.” São Paulo: Paulus.

  • Mesters, Carlos. “Flor sem defesa”

  • ________. “Seis dias nos porões da humanidade”. Petrópolis: Vozes, 1980.

  • Magalhães Sales, João Batista. Uma mensagem de esperança.

  • Padre Aldo Giazzon, 27 anos de Brasil: Bahia e Alagoas.

  • Alves, José. Organização das lutas populares em Cajazeiras nos anos 80.

  • Ataualpa A. P. Filho. Tragam a túnica nova: depoimentos de irmãos acolhidos pela Pastoral de Rua e Oficina,  obras do Padre Quinha. Petrópolis: ed. do autor, 2021.

  • Movimento das Comunidades Populares. Livro sobre a vida do padre João Geisen, militante do MCP.

  • AGENDA LATINOAMERICANA/2022: organização popular e transformação social.

  • Huberman, Leo. História da riqueza do homem. Zahar: 1981.

  • Ofício Divino das Comunidades (livro elaborado pela competente equipe formada por Ir. Agostinha Vieira de Melo, Pe. Reginaldo Veloso, Ir. Marcelo de Barros, Ir. João Batista Magalhães, entre outras pessoas) 

  • VELOSO, Reginaldo. Ofício da Mãe do Senhor. São Paulo: PAULUS Editora, 2001.

  • Cartilha das Comunidades (livro de cantos elaborado pelas comunidades do Agreste Pernambucano, Santuário das comunidades, Caruaru-PE)

  • VAN DER POEL, Maria Salete.Vidas aprisionadas: relatos de uma prática educativa. Rio Grande do Sul: Oikos, 2020.

  • POEL, Maria Salete van der. Alfabetização de adultos: sistema Paulo Freire; estudo de caso num presídio. Petrópolis: Vozes, 1981.

  • CONE, James . O DEUS DOS OPRIMIDOS. São Paulo: Paulinas, 1985.

  • Lelyveld, Joseph Mahatma Gandhi : e sua luta com a Índia. tradução Donaldson M. Garschagen. — 1ª- ed. — são Paulo : companhia das Letras, 2012.

  • BROCHADO, Cláudia, Deplagne, Luciana. Vozes de mulheres da idade média. João Pessoa: Editora da UFPB, 2020. Disponível em:http://www.editora.ufpb.br/sistema/press5/index.php/UFPB/catalog/book/464

  • BARRETO, Adalberto de Paula. Terapia Comunitária passo a passo. Fortaleza: LCR, 5a. Edição. Capítulo 8: Nossas raízes culturais. 

  • Rolando Lazarte “Terapia comunitária integrativa: uma construção coletiva do conhecimento” (Editora UFPB, 2013)

  • A Terapia Comunitária Integrativa e a pesquisa ação/intervenção. Maria de Oliveira Ferreira Filha, Rolando Lazarte e Maria Djair Dias (orgs). Editora Universitária da UFPB, João Pessoa, Paraíba, 2019. Em: http://revistaconsciencia.com/editora-universitaria-da-ufpb-publica-livro-sobre-a-terapia-comunitaria-integrativa/

  • BERGMAN. Michel. Nasce um povo. Petrópolis: Vozes, 1977.

  • Constantine, André. Ashton, Dafne. O dia em que o morro não descer.

  • OLIVEIRA, Marcelo Bezerra. A teoria do conhecimento em Paulo Freire - pressupostos gnosiológicos da Pedagogia do Oprimido. São Paulo: Edição do Autor, 2020.

  • Ailza de Freitas Oliveira Bruno Oliveira de Botelho Fernando A. Abath L. C. Cananéa Islany Costa Alencar José Francisco de Melo Neto Marcilane da Silva Santos Pedro José Santos Carneiro Cruz Renan Soares de Araújo. COLEÇÃO SABERES EM EDUCAÇÃO POPULAR EDUCAÇÃO POPULAR: AUTORAS E AUTORES DA PARAÍBA Volume 1. João Pessoa: Editora CCTA/UFPB, 2020

  • CALADO, Alder J.F. Movimentos e lutas sociais no Nordeste. Caruaru: Vanguarda, 1982. 

  • ______ . Repensando os 500 anos. João Pessoa: Editora Ideia, 1994. 

  • _______ . Brasil, anos 80. Caruaru: Edições FAFICA, 2006. Ver blog: http://textosdealdercalado.blogspot.com/



Considerações Sinóticas


Nestas linhas, buscamos focar a relevância do exercício da memória histórica para o processo de formação missionária. Partimos de uma tentativa de entendimento sobre o sentido de missão como interface necessária de discipulado, tendo como referência-mor, o movimento de Jesus, ao longo de séculos.

Por meio de casos ilustrativos, no campo macrossocial e no campo eclesial, procuramos demonstrar o lugar privilegiado da memória histórica, associando-a a outros componentes do processo formativo, tais como o processo organizativo e o processo celebrativo. Estes mesmos estando dinamicamente interconectados, de tal modo a caracterizarem a força transformadora da memória histórica, aliada a momentos de revisitação reparadora do passado, ao horizonte que buscamos trilhar, na perspectiva do Reino de Deus em sua justiça, por meio do exercício da ortopraxia.


Neste sentido, considerando que, há décadas, vimos trabalhando com os jovens do Meio popular, entendemos oportuno propor-lhes um primeiro roteiro de textos, visando a estimulá-los ao exercício da Memória Histórica.


Não bastasse toda uma infinda sucessão de casos, ao longo da história, eis que justamente no presente momento, o que acontece na guerra entre a OTAN e a Rússia, nos campo da Ucrânia, nos põe em relevo, mais uma vez, a importância da memória história, para um entendimento crítico do que se passa, também neste conflito. Com efeito, sem um exercício crítico da memória histórica recente e menos recente dos contendores destes conflito, não podemos entender o que de fato anda acontecendo, até porque, diferentemente, do que se difunde pela mídia hegemônica, este conflito não tem início no dia 24 de fevereiro de 2022, mas finca suas raízes muito antes, pelo menos a partir de 2014.


Que aqueles e aquelas empenhados no processo de formação missionária possam aqui encontrar, principalmente por meio de biografias sugeridas - muitas mais deverão ser acrescentadas -, entender e consolidar, na perspectiva da tradição de Jesus, seus passos no processo formativo da missão, nos dias de hoje.



João Pessoa, 18 de março de 2022.









* Texto resultante da gravação ou exposição feita pelo autor, e digitada sequencialmente Eliana Calado, Heloíse Calado Bandeira, Gabriel Calado Bandeira e Luciana Calado Deplagne, a quem expresso minha gratidão.