quarta-feira, 16 de julho de 2025

Por uma Espiritualidade libertadora: ensaiando frutuosas experiências

Por uma Espiritualidade libertadora: ensaiando frutuosas experiências Alder Júlio Ferreira Calado O mundo ocidental, desde a antiguidade clássica (greco-latina), segue sendo o palco privilegiado da Cristandade, responsável por transmitir, ainda hoje, uma concepção distorcida da Tradição de Jesus, inclusive por força de uma ideologização do significado de “Espiritualidade”. Notadamente, desde a era constantiniana (século IV), também em função da Tradução e do sentido emprestados à palavra “Ruah”, a Cristandade, distanciando-se do Movimento de Jesus, tem difundido uma concepção hegemônica de “Espírito” e de “Espiritualidade” como se fosse algo puramente abstrato, etéreo, oposto à matéria, a realidade, assim desfigurando e até invertendo o sentido bíblico (e de outras tradições religiosas), uma vez que o termo “Ruah” expressa sopro vital, energia vivificante, vento impetuoso, ação, movimento, de tal modo que é esta Espiritualidade que nos move, nos impulsiona, conferindo sentido a própria vida. Assim entendida e assumida, é esta Espiritualidade que nos move ao seguimento de Jesus, especialmente no meio dos pobres, a quem se destina a Boa Nova do Reino de Deus, anunciada, inaugurada e testemunhada por Jesus: “O Espírito do Senhor está sobre mim, pois que me ungiu para evangelizar os pobres. Enviou-me a curar os contritos de coração, a proclamar liberdade aos cativos, e restauração da vista aos cegos, pôr em liberdade os oprimidos, a anunciar o ano aceitável do Senhor” (Lc 4, 18-19). Eis o núcleo da Missão à qual Jesus se entregou, como Enviado do Pai, e da qual fez o sentido de sua vinda. Este trecho de Lucas traduz, com fidelidade, o Programa anunciado por Jesus. Na perspectiva do Movimento de Jesus, com efeito, é a Espiritualidade Reino Cêntrica que dá sentido ao agir dos seus seguidores e seguidoras, assumindo um dinamismo especial, tornando-nos protagonistas da construção de um novo mundo, a serviço de toda a humanidade, em comunhão com o Planeta e os demais viventes, a partir das necessidades e aspirações dos mais vulneráveis. Para tanto, contudo, resta imperativo recuperar o sentido original de “Espiritualidade”. Nessa toada, vale a pena revisitarmos autores, estudiosos do tema, entre os quais José Comblin, Pedro Casaldáliga, José Vigile, entre outros e outras teólogas. José Comblin, por exemplo, ainda em 1978, em seu livro “O Espírito no Mundo”, no qual anuncia 5 palavras-chave (“Ação”, “Palavra”, “Liberdade”, “Povo de Deus”, e “Vida”), que constituirão, na forma de livros (“O Tempo da Ação”, 1982; Força da Palavra”, 1986; “Vocação para a Liberdade”, 1998; “Povo de Deus”, 2002; “Vida em Busca da Liberdade”, 2007 nas décadas seguintes o eixo de sua obra pneumatológica, rememora com propriedade o sentido original de “Ruah” ainda no início do livro. Por sua vez, recorrendo a uma longa citação desses autores, eis o que nos dizem Pedro Casaldáliga e José Vigile, em seu livro “Espiritualidade Libertadora” (Petrópolis: Vozes, 1993): ”A palavra espiritualidade deriva de "Espírito". E, na mentalidade mais comum, o espírito se opõe à matéria. Os "espíritos" são seres imateriais, sem corpo, muito diferentes de nós. Nesse sentido, será espiritual o que não é material, o que não tem corpo. E se dirá que uma pessoa é "espiritual" ou "muito espiritual" se vive sem se preocupar com o material, nem sequer com seu próprio corpo, procurando viver unicamente de realidades espirituais. Estes conceitos de espírito e espiritualidade como realidades opostas ao material e ao corporal provêm da cultura grega. Dela passaram para o castelhano, para o português, para o francês, para o italiano e até para o inglês e o alemão... Quer dizer, quase tudo o que pode ser chamado de "cultura ocidental" está como que infectado por este conceito grego do espiritual. O mesmo não acontece, por exemplo, na língua quíchua, ou guarani ou aimara. Também o idioma ancestral da Bíblia, a língua hebraica, o mundo cultural semítico, não entendem assim o espiritual. Para a Bíblia, espírito não se opõe à matéria, nem ao corpo, nem à maldade (destruição); opõe-se à carne, à morte (a fragilidade do que está destinado à morte); e opõe-se à lei (a imposição, o medo, o castigo). Neste contexto semântico, espírito significa vida, construção, força, ação, liberdade. O espírito não é algo que está fora da matéria, fora do corpo ou fora da realidade real, mas algo que está dentro, que habita a matéria, o corpo, a realidade, e lhes dá vida, os faz ser o que são; enche-os de força, move-os, os impele; lança-os ao crescimento e à criatividade num ímpeto de liberdade. Em hebraico a palavra espírito, ruah, significa vento, respiração, hálito. O espírito é, como o vento, ligeiro, potente, envolvente, impredizível. É, como o alento, o vento corporal que faz com que a pessoa respire e se oxigene, para poder continuar viva. É como o hálito da respiração: quem respira está vivo; quem não respira, está morto. O espírito não é outra coisa senão o melhor da vida, o que faz com que ela seja o que é, dando-lhe caridade e vigor, sustentando-a e impulsionando-a. Diremos que algo é espiritual por causa da presença que em si tem de espírito. Nós, já desde agora, abandonamos o sentido grego do termo espírito e procuraremos nos aproximar do sentido bíblico, indígena, afro, menos dicotomicamente "ocidental" (pp. 21-22). Grande e renovado desafio temos pela frente: o de testemunhar, precisamente nestes tempos distópicos - fora e ao interno das Igrejas cristãs - o discipulado e a missão de Jesus, pela força da Divina Ruah, Programa tão bem evidenciado neste trecho do Evangelho segundo Lucas, acima mencionado. Nesta direção, múltiplas experiências e iniciativas suscitadas pelo Espírito do Ressuscitado, se fazem presentes entre nós, pelo mundo afora, especialmente vivenciadas no cotidiano das “minorias abraâmicas”, que somos chamados a seguir e reforçar. Apenas a título de ilustração tomamos a liberdade de mencionar de passagem, algumas dessas experiências que estão em curso perto de nós. Uma delas nos remete ao fecundo trabalho desenvolvido, no Brasil - estendendo-se a outros países, na América Latina e alhures - pelo CEBI (Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos), desde 1979, cuja contribuição mais densa se caracteriza pelo estudos comunitários/popular da leitura bíblica por meio de uma metodologia profundamente heurística, historicamente contextualizada e tomando em consideração relevantes aportes de atualização das ciências bíblicas, para o que têm sido de grande valia as contribuições dadas por figuras tais como Carlos Mesters, Agostinha Vieira de Melo, Francisco Orofino, para mencionar apenas 3 exemplos de Teólogos Católicos. Importa destacar que o CEBI tem contado, desde suas origens, com densa contribuição do trabalho Ecumênico de diversas Igrejas Protestantes, das quais, desde pelo menos os anos 1950, faziam parte várias figuras proféticas, a exemplo de Richard Shaull, Rubem Alves, Waldo César, Joaquim Beato, João Araújo Dias, Jether Pereira Ramalho, Zwinglio Mota Dias, Julio de Santa Ana entre outros, que através do Setor Social de suas respectivas Igrejas, muito contribuíram para despertar uma consciência e um compromisso social com a causa de libertação dos pobres, no Brasil e na América Latina, seja por meio de seus escritos circulantes na Revista “Iglesia y Sociedad”, seja por meio da organização de conferências sobre a realidade social do Brasil e com compromisso dos cristãos das quais se tornou exemplar a “Conferência do Nordeste” (cf. https://archive.org/details/conferenciadonor02conf/page/120/mode/2up) realizada em Recife-PE, de 22 a 29/07/1962, cujo o tema trabalhado durante aquela semana foi “Cristo e o Processo Revolucionário Brasileiro”. Convém acrescentar que várias figuras Protestantes de homens e de mulheres - principalmente por meio do CONIC (Conselho Nacional de Igrejas Cristãs) estiveram e continuam atuantes nos trabalhos do CEBI. Recomendamos vivamente o conhecimento e aproximação desses estudos, seja pelo acesso ao “site” do CEBI: https://cebi.org.br/ , seja sobretudo associando-se ao CEBI, em seu Estado, em sua região. Uma das marcas mais frutuosas do CEBI tem sido a qualidade de suas publicações, combinadas com estudos comunitários (presenciais e virtuais de temas candentes, inclusive acerca da teologia eco-feminista. Nesta mesma linha temática vale a pena ainda destacar os valiosos frutos colhidos por outra experiência formativa, que já dura décadas: o Departamento Ecuménico de Investigación (DEI) - um centro de investigação e formação com visão ecumênica e latino-americana, em diálogo com movimentos sociais e eclesiais da região, territórios e academia, que visa fornecer, no intercâmbio de saberes (do pensamento social crítico, das teologias da libertação, das espiritualidades libertadoras e da educação popular), elementos de análise crítica da realidade possibilitando as ações transformadoras necessárias para a construção de uma sociedade justa em reciprocidade com a teia da vida. (para mais informações, consultar o “site” https://deicr.org ). Uma terceira experiência - dentre tantas - se faz presente por meio de diversas iniciativas recentes e menos recentes, espalhadas pelo Brasil, pela América Latina e pelo mundo, graças também a figuras proféticas dos nossos tempos, a exemplo do trabalho desenvolvido, desde os anos 1960/1970, pelas teólogas feministas, a exemplo de Elizabeth Schussler Fiorenza e Ivone Gebara. Para mencionar apenas dois trabalhos de autoria destas teólogas, destacamos: de autoria de Elizabeth Schussler Fiorenza “Discipulado de Iguais: Ekklesia-Feminista Crítica da Liberdade”; Petrópoles: Vozes, 1995; Ivone Gebara. “Teologia Ecofeminista: ensaio para repensar o conhecimento e a religião”. São Paulo, Olho d'água, 1997. As iniciativas inspiradas pela Encíclica “Laudato si”, de autoria do Papa Francisco, que tem alimentado pelo mundo afora fecundas experiências comunitárias de cuidado de nossa “Casa Comum”. A medida que formos capazes de reabilitar este entendimento de “Espiritualidade”, vamos compreendendo as graves consequências do progressivo distanciamento que a Cristandade produziu, na era pós-constantiniana até os nossos dias, de tal sorte que o próprio núcleo do Evangelho resta fortemente distorcido, nas práticas cotidianas das próprias Igrejas cristãs, com raras exceções. Com efeito, lideranças políticas e religiosas na atualidade têm usado e abusado da crença popular como meio de doutrinação política de extrema-Direita, em nome do Evangelho. Lideranças que fazem questão de se proclamar cristãs, chegando a reduzir o coração do Evangelho a atitudes violentas, belicosas, sentindo-se “os eleitos” do Senhor dos Exércitos, chegando inclusive a justificar o genocidio contra o Povo Palestino, praticado pelo Estado de Israel, do qual é cúmplice o Governo dos Estados Unidos arrastando consigo milhões de pessoas enganadas em sua boa fé. João Pessoa, 16 de julho de 2025.

quinta-feira, 10 de julho de 2025

Esquerda, em tempos de retrocesso: breve nota sobre a incidência do fator interno.

Esquerda, em tempos de retrocesso: breve nota sobre a incidência do fator interno.

Alder Júlio Ferreira Calado

Já tivemos oportunidade, reiteradas vezes, de refletir sobre os principais desafios enfrentados por nossas organizações de base (cf.textosdealdercalado.blogspot.com). Cuidamos aqui apenas de sublinhar um desafio que, pelo visto, ainda não conseguimos enfrentar a contento. Sabemos, por exemplo, que, no plano da história, também as organizações de base se acham sujeitas a recuos, cujas lições são chamadas a tomarem conta. Parece-nos bem oportuna a constatação de um ascenso pronunciado das forças da Direita, seja em escala internacional seja ao interno de nossa sociedade, ao mesmo tempo em que, da parte das forças de Esquerda, constatamos recuos expressivos. 


Ao avaliarmos tal processo, o mais frequente tem sido atribuí-lo a fatores externos, quase nunca reconhecendo o peso significativo de nossa inércia e de nossa omissão. Isto não se dá apenas nos dias que correm, nem apenas no que concerne a sociedade brasileira. Entretanto, chama a atenção o longo período, durante o qual as forças reacionárias avançam – chegando até a reunir multidões, em praças públicas – enquanto tem sido regra assistirmos a tudo isso, de braços cruzados ou limitando-nos a reagir pelas redes digitais. 


Quando, porém, nos dispomos a examinar o problema, em perspectiva histórica, percebemos que, como diz a música de Chico Buarque, “A gente vai contra a corrente/Até não poder resistir/Na volta do barco é que sente/ o quanto deixou de cumprir”... Basta que rememoremos a conjuntura brasileira de enorme efervescência social, entre as décadas de 1950 e 1980 a despeito de toda crueldade enfrentada contra a ditadura empresarial militar, importa não esquecermos as grandes lutas sociais por exemplo, dos anos 80, no nascedouro, aliás, de diversos movimentos populares, sindicais e partidários, dando sequência a todo um legado de lutas populares sindicais e partidárias, desde séculos de lutas contra o escravismo. 

Dentre as várias estratégias a que recorremos para manter a resistência, estava presente o exercício da memória histórica dos oprimidos, tanto do ponto de vista coletivo (as grandes revoluções mundiais, as lutas sociais na América Latina e no Brasil, o Quilombo dos Palmares, a Cabanagem, Canudos, Caldeirão, as Ligas Camponesas, só para mencionar algumas delas), quanto do ponto de vista das inspirações pessoais (biografia das grandes figuras revolucionárias por exemplo). Outra fonte preciosa de resistência residia no acompanhamento sistemático de uma variedade de revistas e jornais, que alimentam nossos militantes, nos núcleos, das células, nas diversas comunidades de resistência e de enfrentamento. Sobre este propósito, lembremos, por exemplo, alguns casos: Cadernos do Brasil, Teoria e Debate, Revista do Terceiro Mundo, Teoria e Política, Jornal “Em Tempo”, Jornal “Companheiro”, “Tribuna da Luta Operária”, entre outros materiais que subsidiaram nossas análises de conjuntura, em um tempo em que não dispúnhamos dos atuais recursos da internet.


Ao não perdermos de vista a confluência entre fatores externos e fatores internos, ao examinarmos determinada conjuntura, somos instados também a perceber que, em certas circunstâncias, embora incidindo também fatores externos, acabam prevalecendo os fatores internos, à medida que nossas organizações de base (inclusive, algumas combativas) optaram pelo atalho, isto é afastando-se de suas raízes populares do campo e da cidade, ainda que mantendo o discurso, fizeram a escolha do eleitoralismo, agora confiando em que as mudanças desejadas seriam obra, não mais de nossas lutas, mas resultantes dos embates feitos nos espaços estatais. 


Avaliando, por exemplo, a participação de nossas organizações de base, nas últimas décadas (desde as manifestações de Junho de 2013), temos assistido quase de braços cruzados ao crescente ascenso das forças da extrema-Direita, no Brasil puxada pelo bolsonarismo, sem que a tenhamos enfrentado, com nossas lutas e manifestações públicas. Tendo escapado, por pouco, da reeleição de Bolsonaro, eis que continuamos sem darmos sinais convincentes de resistência e mobilização. Ainda hoje, 10/07/2025, para quando está marcada uma manifestação nacional de protesto contra as ameaças estúpidas de Donald Trump, doí-nos constatar nossa desorganização, salvo raras exceções. O que afinal, estamos esperando que aconteça, para retornarmos nossas mobilizações, especialmente em momentos tão prementes, como o atual?


João Pessoa, 10 de Julho de 2025    






sexta-feira, 4 de julho de 2025

Violência, mentira e hipocrisia: armas-chave do domínio ocidental

 Violência, mentira e hipocrisia: 

armas-chave do domínio ocidental


Alder Júlio Ferreira Calado


A idade Moderna se põe a nu:

A barbárie imposta pelo Ocidente

Caducaram seus regimes, seus valores

Só se prestam ao poder de meia dúzia


Haja vista o Trumpismo, em nossos dias…

Aspirando, ainda, ao Nobel…


Faz a guerra contra o Irã, com o Sionismo

Com retórica de paz - divulga a mídia  


A esperteza dos grandes tem limite:

Sua mentira não dura para sempre


O Congresso atropela Executivo 

Usurpando funções que não são suas


Desmedida é a gula do Congresso:

Executa sem escrúpulo o Orçamento


Parlamento faz pilhagem no Orçamento

Ditadura pretendendo instalar 


Dos tiranos, a mídia é porta voz

Encobrindo lamaçal da burguesia 


Jornalismo venal treme de medo 

Quando os pobres descobrem as falcatruas

https://www.instagram.com/reel/DLnEMBLOtdU/?igsh=MWhpZmUwcXViZTlpbg%3D%3D


O Jornal Nacional retira a máscara: 

Se alia de vez à ultra-Direita 


Agiganta o espaço contra a Esquerda  

Dando voz a extremistas da Direita 

 

Parlamento está  cheio de empresários: 

Pobre aí não tem vez, voto ou voz 


Porta-vozes leais ao Sionismo 

São a Globo, CNN e outras mais


Parlamento só protege os que são ricos 

Defendendo e aumentando os privilégios 


Hugo Mota não cumpre o que promete 

Já faltou com a palavra várias vezes 


Institutos de Pesquisas viram empresas:

Favorecem somente os “de cima” 


Ai do povo que confia sua sorte 

A Herois e aliados de outra classe


Dia 10, os "de baixo" vão a rua
Defender seus direitos, em praça pública 

João Pessoa, 04 de Julho de 2025