quinta-feira, 10 de julho de 2025

Esquerda, em tempos de retrocesso: breve nota sobre a incidência do fator interno.

Esquerda, em tempos de retrocesso: breve nota sobre a incidência do fator interno.

Alder Júlio Ferreira Calado

Já tivemos oportunidade, reiteradas vezes, de refletir sobre os principais desafios enfrentados por nossas organizações de base (cf.textosdealdercalado.blogspot.com). Cuidamos aqui apenas de sublinhar um desafio que, pelo visto, ainda não conseguimos enfrentar a contento. Sabemos, por exemplo, que, no plano da história, também as organizações de base se acham sujeitas a recuos, cujas lições são chamadas a tomarem conta. Parece-nos bem oportuna a constatação de um ascenso pronunciado das forças da Direita, seja em escala internacional seja ao interno de nossa sociedade, ao mesmo tempo em que, da parte das forças de Esquerda, constatamos recuos expressivos. 


Ao avaliarmos tal processo, o mais frequente tem sido atribuí-lo a fatores externos, quase nunca reconhecendo o peso significativo de nossa inércia e de nossa omissão. Isto não se dá apenas nos dias que correm, nem apenas no que concerne a sociedade brasileira. Entretanto, chama a atenção o longo período, durante o qual as forças reacionárias avançam – chegando até a reunir multidões, em praças públicas – enquanto tem sido regra assistirmos a tudo isso, de braços cruzados ou limitando-nos a reagir pelas redes digitais. 


Quando, porém, nos dispomos a examinar o problema, em perspectiva histórica, percebemos que, como diz a música de Chico Buarque, “A gente vai contra a corrente/Até não poder resistir/Na volta do barco é que sente/ o quanto deixou de cumprir”... Basta que rememoremos a conjuntura brasileira de enorme efervescência social, entre as décadas de 1950 e 1980 a despeito de toda crueldade enfrentada contra a ditadura empresarial militar, importa não esquecermos as grandes lutas sociais por exemplo, dos anos 80, no nascedouro, aliás, de diversos movimentos populares, sindicais e partidários, dando sequência a todo um legado de lutas populares sindicais e partidárias, desde séculos de lutas contra o escravismo. 

Dentre as várias estratégias a que recorremos para manter a resistência, estava presente o exercício da memória histórica dos oprimidos, tanto do ponto de vista coletivo (as grandes revoluções mundiais, as lutas sociais na América Latina e no Brasil, o Quilombo dos Palmares, a Cabanagem, Canudos, Caldeirão, as Ligas Camponesas, só para mencionar algumas delas), quanto do ponto de vista das inspirações pessoais (biografia das grandes figuras revolucionárias por exemplo). Outra fonte preciosa de resistência residia no acompanhamento sistemático de uma variedade de revistas e jornais, que alimentam nossos militantes, nos núcleos, das células, nas diversas comunidades de resistência e de enfrentamento. Sobre este propósito, lembremos, por exemplo, alguns casos: Cadernos do Brasil, Teoria e Debate, Revista do Terceiro Mundo, Teoria e Política, Jornal “Em Tempo”, Jornal “Companheiro”, “Tribuna da Luta Operária”, entre outros materiais que subsidiaram nossas análises de conjuntura, em um tempo em que não dispúnhamos dos atuais recursos da internet.


Ao não perdermos de vista a confluência entre fatores externos e fatores internos, ao examinarmos determinada conjuntura, somos instados também a perceber que, em certas circunstâncias, embora incidindo também fatores externos, acabam prevalecendo os fatores internos, à medida que nossas organizações de base (inclusive, algumas combativas) optaram pelo atalho, isto é afastando-se de suas raízes populares do campo e da cidade, ainda que mantendo o discurso, fizeram a escolha do eleitoralismo, agora confiando em que as mudanças desejadas seriam obra, não mais de nossas lutas, mas resultantes dos embates feitos nos espaços estatais. 


Avaliando, por exemplo, a participação de nossas organizações de base, nas últimas décadas (desde as manifestações de Junho de 2013), temos assistido quase de braços cruzados ao crescente ascenso das forças da extrema-Direita, no Brasil puxada pelo bolsonarismo, sem que a tenhamos enfrentado, com nossas lutas e manifestações públicas. Tendo escapado, por pouco, da reeleição de Bolsonaro, eis que continuamos sem darmos sinais convincentes de resistência e mobilização. Ainda hoje, 10/07/2025, para quando está marcada uma manifestação nacional de protesto contra as ameaças estúpidas de Donald Trump, doí-nos constatar nossa desorganização, salvo raras exceções. O que afinal, estamos esperando que aconteça, para retornarmos nossas mobilizações, especialmente em momentos tão prementes, como o atual?


João Pessoa, 10 de Julho de 2025    






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