quinta-feira, 21 de julho de 2016

Palavras de Ir. Tonny sobre conquista da Fazenda Antas, em Sapé, Paraíba

Mensagem da Irmã Tonny, Religiosa Franciscana, hoje vivendo na Holanda, grande lutadora da causa dos pobre, em especial dos camponeses e camponesas, junto a quem trabalhou várias décadas na Paraíba, na CPT e outros espaços eclesiais, e que hoje saúda os Trabalhadores e Trabalhadoras da Comunidade de Antas, município de Sapé – PB, pela sua brava conquista:
“Querido Povo da Fazenda Antas, Elizabeth Teixeira, CPT e…todos que ajudaram para esta vitória poder acontecer. (Eu no meio, também, penso agora, me lembrando do começo desta Luta, aí)…
Parabéns gente com esta vitória no Supremo Tribunal!
Antes de tudo meus pensamentos vão para àquelas/àqueles no meio do povo que iniciaram esta Luta braba e ainda estão PRESENTES ATIVAMENTE nela!
Parabéns de coração para todos e… continuem com amor mútuo, pois é agora que a Caminhada precisa de grande esforço e coragem para se criar, aí, ‘Terra Fertil’ por Vida melhor para a Comunidade toda!
Mas antes de tudo, dançam, brincam, festejam a alegria desta vitória. Eu, de coração, vibro juntos com todos vocês.
Quem sabe, pode se celebrar este momento de maneira mais especial e organizado, no dia 02 de abril, dia que faz 52 anos que João Pedro Teixeira tombou, nesta Luta que ele tinha começado nos anos cinquenta, conversando pacientimente com os companheiros dàquele tempo, exatamente neste lugar!
E… aliais, qual foi a data que Sandoval foi assassinado na Luta por esta Terra?
Acredito que todos os lutadores, que deram sua vida e seu sángue pela libertação das terras para o Povo, estão presentes em tudo que vocês juntos celebram e fazem em cada momento desta Caminhada tão importante.
O fato que a terra aonde começaram os primeiros passos da Luta, agora é livre para o Povo, tem um significado todo especial ao meu ver.
Como é importante que Elizabeth Teixeira, esposa de João Pedro, ainda, ao completar 89 anos, na próxima semana, pode presenciar esta vitória: mais uma gotinha na Reforma Agrária, que ela não para de defender.
Pois, é Caminhando que continua se fazendo A História do Povo de Deus.
É como Maria Romão de Mucatu, num dia de um passo positivo na luta, falou: “A gente luta, luta e sofre; passa por uns vinte sofrimentos, para de repente ter uma pequena vitória, que faz esquecer todo o sofrimento. E é isso que faz a gente continuar nesta Caminhada.”
É com estas palavras e com muito mais pensamentos e sentimentos ainda, que me sinto fazer parte desta História do Povo de Deus à Caminho.
E repito: “PARABÉNS PARA TODOS VOCÊS” !!!
Recebam abraços com tudo de bem de
Tonny.

Mais informações sobre o Memorial das Ligas Camponesas: http://www.ligascamponesas.org.br/?p=75

Educação humanizadora, contínua, transformadora: traços fortes da formação combliniana

À semelhança do que costuma acontecer nas demais Escolas de Formação Missionária – uma meia dúzia espalhada pelo Nordeste -, também a de Mogeiro – PB celebrou a “conclusão” formativa de uma de suas turmas, domingo passado, dia 2 de fevereiro de 2014.
Sessão muito marcante! Lá se encontravam, além das concluintes, também colegas de outras turmas, familiares, amigos convidados para aquele momento, além de membros da Coordenação da Escola, professores, um dos quais Raimundo Nonato, escolhido como o paraninfo daquela turma concluinte.
Não apenas as palavras pronunciadas pelo paraninfo (ver abaixo) e pelas concluintes, mas igualmente o jeito de dizê-las traduzem bem o âmago dessa experiência formativa.
O que ouvimos, então, do paraninfo (a pedido meu, Nonato enviou o texto de seu discurso):
“Palavra proferida por Raimundo Nonato por ocasião da Conclusão de uma etapa da Formação Missionária de Ana, Kely e Anunciada, no dia 02/02/2014 na cidade de Mogeiro PB.
Queridas Irmãs e Caríssimos irmãos, Bom Dia!
Feliz de quem recebeu o convite de Deus para Evangelizar. O Evangelho de Jesus, a sua novidade, é a fonte da verdadeira alegria. Como nos ensina e lembra o nosso admirado e querido Papa Francisco: ¨A ALEGRIA DO EVANGELHO enche o coração e a vida inteira daqueles que se encontram com Jesus. Quantos se deixam salvar por Ele são libertados do pecado, da tristeza, do vazio interior, do isolamento. Com Jesus Cristo, renasce sem cessar a alegria.¨
Ana, Anunciada e Kelly hoje concluem uma etapa importante de sua formação como missionárias. Através do testemunho delas, Deus nos tem algo a dizer. Foram 4 anos de formação. Perguntamos a elas que transformação, que reboliço essa escola fez em suas vidas?
Testemunhos…
Sabemos muito bem que o mundo atual quer fazer de nós simples consumidores, fechando os nossos corações nos nossos próprios interesses:
Eis mais uma vez o nosso papa Francisco nos exorta e adverte: “Quando a vida interior se fecha nos próprios interesses, deixa de haver espaço para os outros, já não entram os pobres, já não se ouve a voz de Deus, já não se goza da doce alegria do seu amor, nem fervilha o entusiasmo de fazer o bem. Este é um risco, certo e permanente, que correm também os crentes. Muitos caem nele, transformando-se em pessoas ressentidas, queixosas, sem vida. Esta não é a escolha duma vida digna e plena, este não é o desígnio que Deus tem para nós, esta não é a vida no Espírito que jorra do coração de Cristo ressuscitado.
Portanto não nos deixemos seduzir pelo consumismo. Que a nossa missão alargue os espaços de solidariedade em torno de nós. Somente assim manteremos viva a chama da alegria que tem como fonte o Evangelho.
Mantemos, entre nós, a presença bem viva do nosso querido padre José Comblin, que está na raiz das escolas missionárias. A Ele devemos a inspiração e coragem, o seu testemunho e alegria. Peço, para ele uma salva de palmas.
Raimundo Nonato de Queiroz.
Mogeiro, 02 de fevereiro de 2014.”
Palavras concisas, densas, de modo a destacarem, em poucos minutos, traços relevantes da pedagogia combliniana, tanto no conteúdo, quanto no modo de proceder.
Começo por destacar este último aspecto. Prestando bem atenção ao que lemos neste texto de Nonato, percebemos que, a certa altura, está escrito: “Testemunhos”… Tratava-se de inserir no seu discurso o discurso das concluintes. Trata-se de um todo, do qual as concluintes, tratadas, também aí, como protagonistas do seu processo de formação, tinham a dizer sua palavra. Não sem antes serem advertidas pelo paraninfo, de que ali estavam concluindo “uma etapa de sua formação”. Sim, porque, diferentemente do espírito largamente predominante na formação escolar oficial, quando se termina uma faculdade, tem-se tal momento como uma conclusão, como encerramento cabal… A proposta combliniana, à semelhança da pedagogia freireana, indica que quem tenha passado por uma dessas Escolas (ou de qualquer outra experiência formativa da família combliniana) assume o compromisso de seguir, pessoal e coletivamente, seu processo formativo. Prova convincente disto são os grandes momentos de encontros gerais, como aquele ocorrido em março do ano passado, no Santuário do Pe. Ibiapina, em Solânea – PB), do qual das cerca de 600 pessoas participantes daquela Romaria, a enorme maioria era formada de egressos dessas escolas, já em três gerações (desde final dos anos 80). Trata-se decididamente de uma proposta de formação contínua, processual, ao longo de toda a vida.
No discurso do paraninfo, também ficam destacados vários outros aspectos desse processo processo formativo, tais como:
– o empenho em formar Gente comprometida com as distintas facetas do processo formativo: trabalho, cidadania, relações de gênero, etnia, gerações, valores (solidariedade, justiça, liberdade, partilha, alegria…);
– compromisso com a transformação social, começando pela transformação da própria formanda, do próprio formando e dos sujeitos envolvidos nessas experiências formativas. A partir desse compromisso, assume sentido eficaz o compromisso com a transformação das estruturas e das relações sociais, econômicas, políticas e culturais, em parceria orgânica com as forças sociais comprometidas com o mesmo horizonte de sociabilidade.
Eis, pois, alguns traços que destacamos, de passagem, dessa experiência formativa vivenciada nas Escolas de Formação Missionária, de cuja organização, como lembra Nonato, José Comblin esteve na raiz.

CEBs: desafios e perspectivas de enfrentamento

O XIII Intereclesial das CEBs, a realizar-se em Juazeiro do Norte, a partir de amanhã, 7/1/2014, e estendendo-se até 11/1/2014, se passa, pela primeira vez, após sombrias décadas de estratégias desmonte da “Igreja dos Pobres” (expressão tão cara do Papa João XXIII), promovidas sobretudo desde o pontificado do Papa João Paulo II, sob a implacável mão de ferro da Congregação da Doutrina da Fé, sob o controle do então Cardeal Ratzinger, eis que acontece num contexto eclesial, senão privilegiado, mas bem favorável aos seus protagonistas e aos seus principais eixos identitários. Uma rara oportunidade histórica de retomada mais a fundo das bases mais fecundas de seu projeto de profundas mudanças das estruturas da Igreja e da sociedade, na perspectiva do Reinado de Deus e de sua justiça.
Nas linhas que seguem, propomo-nos apenas assinalar, de passagem, dois pontos: um quanto ao que entendemos como alguns dos desafios dentre os mais embblemáticos enfrentados pelas CEBs; em seguida, levantar alguns questionamentos e possibilidades de enfrentamento exitoso (a curto, médio e longo prazos) dos desafios destacados.
I) Quanto a alguns graves desafios
1) Como enfrentar suas frágeis bases organizativas?
Salvo exceções inspiradas e frutuosas, expressivas parcelas dos grupos e pessoas que se reconhecem como CEBs não conseguem alcançar fortes laços orgânicos e organizativos, como fazendo parte de sua rotina, do seu dia-a-dia, especialmente quando se trata de relacionar-se com seus parceiros de outras regiões. Muito menos em relação a outros segmentos da Igreja na Base. Isto até se passa bem, no âmbito das instâncias de coordenação, mas será que basta? E o quê dizer em relação aos laços orgânicos com parceiros de outras igrejas e dos movimentos populares?
Muitas de nossas CEBs até cumprem bem atividades importantes, mas em geral circunscritas à sua área esoecpufuca de atuação, com poucas ou nulas conexões com outras CEBs e outros parceiros da Igreja na Base, seja no âmbito regional, seja nos planos nacional e internacional. Algo semelhante também se dá no seu agir social: laços muito frouxos com os movimentos e lutas sociais, sempre ressalvadas as exceções de reconhecida qualidade.
Aí parece refletirem-se, pelo menos, dois fatores: os efeitos deletérios do período de estratégias de desmonte da Igreja na Base (CEBs, TdL, CEBI, PJMP e outras “pastorais sociais”); e, por outro lado, a ampla e crescente vigência do modelo de organização paroquial, sobre o qual, já à altura dos anos 70, teólogos como José Comblin já alertavam, chamando a atenção ao fato de que dificilmente o modelo paroquial de organização favorece a ação missionária junto ao povo dos pobres e marginalizados, na perspectiva de sua organização e protagonismo. Como é sabido, salvo felizes exceções, a tendência mais forte é que as paróquias girem, primeiro, em torno do pároco, e também em torno do seu público interno. É claro que há casos – minoritários! – de paróquias ou de párocos fazendo seu o espírito de Aparecida, mas será que o modelo como tal favorece mesmo a recorrente proposta manifestada pelo Papa Francisco, de uma reforma “em saída missionária”? Nessa direção, o que mais nos ajuda: o espirito organizativo das primeiras comunidades cristãs ou o modelo Paróquia?
Há tantos outros aspectos organizativos a serem reavaliados, passando por pontos tais como: periodicidade dos encontros, apreciação crítica dos encaminhamentos deliberados em encontros precedentes, número proporcional de grupos e pessoas efetivamente comprometidos e empenhados nas tarefas cotidianas próprias de CEBs; discernimento quanto ao exercício de uma autonomia relativa, respeitosa da diversidade bem como do esforço de sinodalidade, nossas práticas de ecumenismo de base, prioridades temáticas trabalhadas nos encontros; tendência a enfrentar temas estritamente eclesiásticos; pouca ligação com os movimentos e as lutas populares. Sempre há as boas exceções, não nos esqueçamos!
2) Como encarar seu/nosso relativamente fraco poder de mobilização?
Uma pergunta dessas remete, não às boas exceções existentes, mas ao conjunto das CEBs em todo o país. Sobretudo nas últimas décadas, (também) graças às estratégias de desmonte da “Igreja na Base”, não tem sido algo frequente encontrarmos tanta gente das CEBs nas mobilizações populares. As próprias pastorais sociais, antes bastante animadas (também) por gente das CEBs, se ressentem dessa participação, haja vista, por exemplo, o que se tem passado com o Grito dos Excluídos, em várias partes do País. No plano estritamente intra-eclesial, são mais expressivas as tentativas, em romarias da terra e das águas, em celebrações do Natal. Mas, também isto não parece ser bem a regra, de modo a envolver uma expressiva maioria.
3) Como superar as debilidades na formação contínua de seus membros?
Sem deixar de reconhecer a importância e a gravidade dos dois primeiros desafios acima assinalados, consideramos este último como o mais relevante e urgente a ser priorizado! E também o que enfrenta mais dificuldades.
II) Que perspectivas se desenham para os próximos anos?
Aqui, vamos preferir acenar para alguns cenários possíveis, de forma interrogativa.
– Examinando de forma retrospectiva (final dos anos 70/ primeira metade dos anos 80), será que a dimensão organizativa das CEBs daquele período nada nos tem a inspirar, hoje?
– A que se deveu aquela abençoada onda de ascenso das CEBs e de outros segmentos da Igreja da Base? Será que não havia um grau maior de autonomia em relação às paróquias? E, em consequência, em relação também ao clero, ainda que isto também estivesse presente?
– A forte vinculação organizativa das CEBs à vida paroquial ajuda a superar ou favorece a tendência a uma clericalização, a que, em várias ocasiões, tem aludido o Papa Francisco?
– A dependência dos membros das CEBs à estrutura paroquial ajuda ou bloqueia o ímpeto missionário junto ao povo dos pobres, às “periferias existenciais”?
– Até que ponto a pouca ou tão frágil formação dos membros das CEBs tem contribuído para uma certa despolitização de parte expressiva dos mesmos?
– Até que ponto a ausência ou insuficiência de uma formação contínua dos membros das CEBs os tem induzido a uma certa posição pragmática e acrítica na/da vida política, restringindo-a apenas aos momentos eleitorais?
– Até que ponto a ausência ou insuficiência de formação integral dos membros das CEBs os tem limitado a exercitar a Cidadania apenas no âmbito das relações com o Estado, perdendo de vista as grandes potencialidades da Política, no exercicio da Cidadania do cotidiano, onde incidem importantes dimensões ético-políticas e de conversão? Apenas um exemplo ilustrativo: quando não se faz formação contínua, corre-se o risco de ignorar o enorme potencial de Cidadania, de potencialização da dimensão do Público, presente no serviço invisibilizado das parteiras, em exagerada atenção às disputas político-partidárias, terreno no qual cada vez a dimensão ético-política do Publico se torna cada vez mais minada…
– Em relação ao exercício da Cidadania face ao Estado, diante de sinais tão evidentes e frequentes, vamos seguir apostando no que não dá certo, isto é: investindo em velhas práticas partidárias de alianças com todo o mundo, confiando em eleger um/uma candidato/a que “salve a Pátria”, mesmo sabendo de suas tenras possibilidades de alterar a engrenagem da máquina estatal, ou, ainda pior, de, em vez de corrigir os descompassos da referida máquina, contribuir objetivamente para fortalecê-la?

– De que formação precisam os membros das CEBs? Uma formação que ajude a desenvolver o processo de humanização ou uma formação limitada a apenas uma ou outra dimensão? No empenho de examinar experiências que vêm dando certo (“Pelos frutos se conhecer a árvore”), por ocasião da III Semana Teológica Pe. José Comblin, dentre as atividades vivenciadas, constou uma Mesa Redonda, na qual foram partilhadas experiências de formação consideradas exitosas, dentre as quais a que se vivencia nas Escolas de Formação Missionária (Juazeiro – BA; Mogeiro – PB; Esperantina – PI; Floresta – PE; Barra – BA e Nazaré da Mata – PE). Não dá para tratar aqui e agora de sua proposta teórico-metodológica. Apenas assinalamos, de passagem, que uma das inquietações aí sublinhadas tem sido o compromisso de que quem por elas passe, delas não se afaste: mantenham-se seus “egressos” permanentemente a elas vinculados. Um atestado disto tivemos recentemente, em Santa Fé, no Santuário do Pe. Ibiapina (Solânea – PB): das cerca de seiscentas pessoas participantes de vários Estados do Nordeste, cruzaram-se três gerações de missionários e missionárias que passaram por essa experiência formativa. Seus depoimentos eram tocantes, a esse respeito!

Tributo a Confúcio

No processo incessante de ser mais
Percorremos veredas diferentes
Lapidando, inclusive, nossas mentes
Enfrentando caminhos tão plurais
Nenhum deles, sozinho, satisfaz
Na costura de fios tão diversos
Uma fonte instigante vem dos versos
De Poetas e clássicos criativos
De Confúcio importa ver arquivos
Que nos fazem na fonte estar imersos.
Nesses versos, proponho, caro amigo
Um passeio espontâneo a boas fontes
Eu espero teu sim, não desapontes
No passeio, estarei também contigo
Recolhendo dum mestre tão antigo
Qual Confúcio, filósofo eminente
– Um baú de saber já se pressente –
Eis a meta a que eu te desafio
Desse nó de liames sendo um fio
No tecer dessa trama de ser Gente!
Atraído por dentro, na raiz
Indo em busca de mim, do ser humano
Por Confúcio inicio o novo ano
Consciente que as vias são sutis
“São plurais nossas fontes” – bem se diz
E alguém nos é útil ter por lente
Um exemplo edifica, realmente
E, no caso, a Confúcio é que me alio
Sou um nó de liames, sou um fio
No tecer dessa trama, sou mais Gente.
“Pensar antes de agir”, ele dizia
Circunstâncias diversas tendo em conta
“Quem ensina, se instrui” – bem nos aponta
Mesmo quando a lição pinta sombria
E Confúcio outros pontos aprecia
Não cercar-se da sanha de demente
Às ações de homem sábio ter em mente
Evitando lançar-me no vazio
Sou um nó de liames, sou um fio
No tecer dessa trama, sou mais Gente.
“Só ouvindo, eu esqueço facilmente.
Mas, se vejo, recobro o esquecido.
Atenção eu lhe peço: dê ouvido:
Só se aprende, é fazendo, ó minha gente!”
Quanto mais sábio aprende, humilde sente
Elogio de si não se disputa
Exercita humildade, na labuta
São os outros que falam do que faço
Nem de bem nem de mal, não ergo o braço.
Do saber que eu pretenda ser recruta.
Sê prudente na fúria, controlado
Não despejes revolta, sendo à-toa
Faze apelo à razão, que não destoa
Normalmente, ela põe-se ao teu lado
E não sigas exemplo tresloucado
Não te esqueças de bem recompensar
Toda ação que se mostre exemplar
Companhia procura junto aos bons
Se te acercas dos maus, terás seus tons
E dos erros aprende, sem cessar.
Coerência é virtude relevante
Pela ação tu comprovas o que falas
De impostores se enchem tantas salas
Cabais provas esforça-te em dá-las
Se aprimoras teus dons a cada dia
Não terás mais revés ou dor tardia
Carregando punhados de areia
Chega um dia, a colina estará cheia
E mais perto estarás da Utopia.
O cuidado dos pais é um direito
Nos legaram com amor o dom da vida
Um dever de justiça nos convida
A manter um cuidado a ser refeito
Dia a dia, expressando nosso preito
Esperar contra toda esperança
Suportar com ação serena e mansa
Bem nutrido com o bem de cada dia
É assim que Confúcio avalia
E a mais desafio ele nos lança.
Não se opõe a prudência à valentia
Discernir em momentos cruciais
Pode até exigir um tanto mais
De atitude ousada, quem diria…
De coragem, de fé, de rebeldia
Mas p´ra tanto, convém que te prepares:
De quem luta convém que tomes ares
Exigindo de ti bem no limite
Já de outrem assim não acredites
Superando revés dos próprios pares…
Conhecer o passado é requisito
De quem almeja forjar um bom futuro
Do contrário, dás prova de imaturo
De artesão que despreza o que é bonito
O passado é docente, eu te repito
No percurso da vida, se desenha
Há lições que nos valem como senha
O perfil de aprendente que se é
Quem não capta os sinais, dá marcha à ré
Pois a si não avalia, só desdenha…

De Confúcio o legado nos convença:
O respeito que exijo para mim
Ante o próximo eu também me porte assim
Sendo hábil a tornar a própria ofensa
Numa flor machucada, meiga, densa
Perfumando o machado que a corta
Parecendo ao carrasco que está morta
De repente, irrompendo qual do nada
Dela brotam sementes variadas
Mais vigor e beleza ela comporta…

Do universo vocabular do papa Francisco

No tesouro da sabedoria bíblica, e mais precisamente do Evangelho, aprendemos que “A boca fala do que está cheio o coração” (“Ex abundantia enim cordis os loquitur” (Mt 12, 34). Não é em vão que um dos procedimentos dentre os mais usados no esforço de compreensão de um perfil consiste em rastrear-lhe os ditos mais frequentes. Que tal adotarmos tal critério ao esforço de compreensão do perfil do Papa Francisco, nesses quase dez meses de seu ministério? Neste caso, ainda temos a nosso favor o fato de tratar-se de alguém cujas palavras não costumam discrepar de suas práticas, e a quem podemos aplicar uma feliz afirmação do Papa Paulo VI, em sua também Exortação Apostólica “Evangelii Nuntiandi”, de 1975: “Os homens de hoje ouvem mais as testemunhas do que os mestres, e, se também escutam os mestres, é porque eles são testemunhas.” (EN, n. 41).
A esse propósito, em uma de suas homilias, em 14 de abril de 2013, inspirando-se em Francisco de Assis, que exortava seus irmãos a que “preguem o Evangelho, e, se necessário, também com palavras”, alerta, com propriedade, o próprio Papa Francisco: “A incoerência, por parte de pastores e fiéis, entre o que dizem e o que fazem, entre discurso e modo de viver mina a credibilidade da Igreja.” (cf.http://www.vatican.va/holy_father/francesco/homilies/2013/documents/papa-francesco_20130414_omelia-basilica-san-paolo_en.html)
Cônscios também das limitações – o conhecimento de algo ou de alguém, bem o sabemos, é sempre uma aproximação -, tentemos aplicar o critério do “universo vocabular”, das “palavras-geradoras” (Paulo Freire) ao caso do Papa Francisco. Convém. desde já, prevenir que se trata, aqui, antes que de uma pesquisa acadêmica convencional, de um exercício de rememoração baseada em frequentes acompanhamentos de suas homilias, discursos, entrevistas e recente exortação apostólica “Evangelii Gaudium”.
Bispo de Roma – Desde sua primeira autoapresentação, preferiu apresentar-se como “bispo de Roma”, a apresentar-se como papa: “Irmãos e Irmãs, boa noite. Vocês sabem que o dever do conclave era dar um bispo a Roma, e parece que os meus irmãos cardeais foram buscá-lo quase no fim do mundo. Mas, eis-me aqui.” Não lhe bastasse a escolha do nome Francisco, recupera uma saudável tradição, ao tempo em que rompe com uma outra tradição eclesiástica mais inspirada no poder e na pompa.
Alegria – Eis uma palavra-chave do/no universo vocabular do Papa Francisco: “Não sejam nunca homens e mulheres tristes. Um cristão não pode ser assim!” (cf.http://www.aforismario.it/papa-francesco.htm) Recorrentemente por ele pronunciada, ora como verbo, ora como substantivo, ora como adjetivo, ora como advérbio… Tanto nas homilias quanto em sua recente Exortação Apostólica “Evangelii Gaudium”, ele se mostra incisivo no emprego desta expressão, que dá título, aliás, ao seu primeiro grande escrito – “A alegria do Evangelho”, na qual são várias as passagens em que situa e sublinha a importância da alegria na vida dos cristãos: “A alegria do Evangelho que enche a vida dos discípulos é uma alegria missionária.” (EG, n. 21). Dirigindo-se às famílias reunidas na Praça São Pedro, em Roma, o Papa Franciso retoma o tema da alegria. Após lembrar os diversos tipos de fardos que a vida nos apresenta, e a partir da Palavra de Jesus – “Vinde a mim todos vós que estais oprimidos e sobrecarregados, e Eu vos aliviarei para que a vossa alegria seja completa”, o Papa exorta as famílias a confiarem na promessa de Jesus – “para que vossa alegria seja completa” (cf. http://www.youtube.com/watch?v=rymr4Oerkj4)
Aproximar-se dos outros – O princípio da relacionalidade é vital na pregação. Mais do que mera diretriz, ela caracteriza fortemente suas práticas pastorais. Há que se aproximar do povo. Apelo reiterado, com insistência, inclusive pela sua pedagogia do exemplo, como tem ficado bem evidenciada sua postura no meio das multidões, seja por ocasião da Jornada Mundial da Juventude, no Rio, seja nas grandes manifestações massivas na Praça São Pedro, em Roma. Urge sair em busca das ovelhas perdidas. Acercar-se delas, deixar-se impregnar pelo seu cheiro. “Aquele que isola sua consciência da caminhada do povo de Deus não conhece a alegria do Espírito Santo que sustenta a esperança.” (cf.http://aforismi.meglio.it/aforismi-di.htm?n=Papa+Francesco). Em outra ocasião, o Papa Francisco segue incisivo: “Não podemos construir pontes entre os homens, esquecendo-nos de Deus. Mas também vale o contrário: não podemos viver verdadeiros laços com Deus, ignorando os outros.” (cf. http://www.aforismario.it/papa-francesco.htm)
Uma Igreja pobre para os pobres – Eis um desejo que o ouvimos expressar com certa frequência: “Como queria uma Igreja pobre e para os pobres. Para isto me chamo Francisco: como Francisco, homem da pobreza, homem de paz. Homem que ama e cuida da Criação, enquanto nós hoje não temos uma relação tão boa com a Criação.” (http://www.studenti.it/foto/news/le-frasi-piu-belle-di-papa-francesco/siamo-con-te-papa-francesco.php)
Não tenham medo – Deixar-nos surpreender por Deus, que também nos chama à novidade, à abertura ao novo. “Sair de nós mesmos e sair também do recinto do jardim de nossas convicções consideradas imutáveis, se estas correm o risco de tornar-se um obstáculo, de se fecharem ao horizonte que é Deus.” Ainda sobre este ponto: “As nossas certezas pode tornar-se um muro, um cárcere que aprisiona o Espírito Santo.” (cf,http://aforismi.meglio.it/aforismi-di.htm?n=Papa+Francesco).
“Em saída missionária” – “Só permanecemos fiéis ao Senhor, se sairmos de nós mesmos. Paradoxalmente, só permanecemos fiéis, se mudarmos. Não permanecemos fiéis como tradicionalistas, como fundamentalistas, ao pé da letra. A fidelidade é sempre uma mudança, um florescimento, um crescimento.”
Ternura – “Não tenham medo da ternura.”
A força da misericórdia – É bastante recorrente sua ênfase na misericórdia de Deus. Inclusive em sua recente Exortação Apostólica “Evangelii Gaudium”. Como ele insiste nisto: “Deus nunca se cansa de nos perdoar. Nós é que nos cansamos de buscar o seu perdão.” (EG, n. 3).
Sair em busca das periferias existenciais – A evangelização, conquanto conte com nossa generosidade, é obra de Deus, e nosso dever é priorizar o anúncio do Evangelho junto às pessoas que não conhecem a Jesus. Daí a necessidade de sair ao encontro das pessoas mais distantes, mais afastadas, evitando a tentação de enjaular o Espírito Santo no templo ou no conforto de seu próprio recinto, razão por que diz o Papa Francisco: “prefiro mil vezes uma Igreja acidentada a uma Igreja enferma” (por conta da atmosfera viciada do seu fechamento). (cf. http://www.ihu.unisinos.br/noticias/519413-prefiro-mil-vezes-uma-igreja-acidentada-a-uma-igreja-enferma-diz-francisco-aos-bispos-argentinos).
A humildade é necessária para a fecundidade – Esta constitui uma de suas marcas de notável referência, fazendo jus ao nome que escolheu para o seu ministério: Francisco. Despindo-se de toda pompa, e empenhando-se em medidas de despojamento também para o papado, ele ousa apresentar-se, não como um rei ou como uma pessoa acima das outras, ou mesmo alguém “infalível”. Prefere apresentar-se como “um pecdor”, como afirmou, aludindo a que se confessava a cada quinze dias, atitude que recomenda a padres e bispos, e a sim próprio, pois “o papa também é um pecador.” (cf.http://www.corriere.it/cronache/13_novembre_20/papa-sono-peccatore-ogni-15-giorni-mi-confesso-c938a962-51d4-11e3-a289-85e6614cf366.shtml).
Vez por outra, dele escutamos, quando se dirige à multidão: “Não olhem para mim, olhem para Jesus.” Do mesmo modo, estamos a ler ou a ouvi-lo dirigir-se aos demais ministros, alertando-os de que os sacramentos são gestos do Senhor, não devem ser confundidos com “territórios de conquista de padres ou bispos.”
Na Igreja, antes que o papa, o Povo de Deus é referência primeira – Por ter a Igreja uma marca espiritual antes que política, “É o santo Povo de Deus, com suas virtudes e seus pecados que está no centro, não o papa. Cristo é o centro.” (cf,http://www.aforismario.it/papa-francesco.htm)
Conversão – Toda a Igreja, a começar do papado, é chamada a converter-se, incessantemente: “Visto que eu sou chamado a pôr em prática o que eu prego aos outros, eu devo também pensar na conversão do papado.” (EG, n. 32).
“Abramos a porta ao Espírito, deixemo-nos guiar por Ele. Deixemos que a ação contínua de Deus nos torne homens e mulheres novos, animados pelo amor de Deus que o Espírito Santo nos dá.” (cf. http://www.aforismario.it/papa-francesco.htm).
Uma só família humana. Comida para todos! – É tocante perceber a importância que Papa Francisco atribui às coisas simles do dia-a-dia, como as refeições. Como não impactar-se com o sua habitual saudação, a cada “Angelus”, na Praça São Pedro, dirigida ao despedir-se dos peregrinos e peregrinas: “Bom dia e bom almoço!” Em sua recente Exortação Apostólica “Evangelii Gaudium”, não poupa palavras duras ao sistema responsável por profundas desigualdades que violam os direitos humanos: “Os direitos humanos não são apenas violados pelo terrorismo, pela repressão ou pelo assassinato, mas também por estruturas econômicas injustas que criam grandes desigualdades.” (http://www.gruppolaico.it/2013/01/01/francesco/ ).
Por uma cultura do trabalho humanizador – Há no universo vocabular do Papa Francisco – na verdade, desde os temos de Cardeal Bergoglio – um empenho na luta por uma saudável cultura do trabalho, que rompe com a lógica do Capitalismo, da sociedade de consumo, o que o levou, certa vez, numa entrevista, a sustenta que “Junto com uma cultura de trabalho deve haver uma cultura do lazer como algo gratificante. (…) as pessoas que trabalham deve ter um tempo de espairecimento, para estarem com suas famílias, para se divertirem, ler, ouvir música, praticar um esporte.” Em tal contexto, conclui, “o trabalho acaba desumanizando as pessoas.” (http://www.nytimes.com/2013/04/27/us/pope-francis-has-a-few-words-in-support-of-leisure.html?_r=0)
É o Espírito quem suscita a diversidade e a unidade – Impactante constatar, da parte do Papa Francisco, sua consciência da importância da diversidade, da pluralidade como dom do Espírito Santo, ao mesmo tempo que reconhece que, só por meio d´Ele, podemos tecer unidade. “É o Espírito Santo quem faz a harmonia na Igreja.” “Entreguemo-nos nas mãos de Deus como uma criança põe sua mão na mão do seu pai.” (cf.http://www.pinterest.com/goodnewsmin/pope-francis-quotes/)
Rezar é abrir a porta ao Senhor – Nos enfrentamentos do mal, que está fora mas também dentro de nós, nos servimos da Oração, pela força da qual abrimos a porta ao Senhor, para que Ele entre e nos ajude a lutar contra o mal. Não ficamos sozinhos, nessa luta. Diferentemente, quando não rezamos, estamos fechando a porta ao Senhor.
O cuidado com a Criação – Eis outra inquietação frequente em suas intervenções: “.” Cuidar do criado, todo homem, toda mulher, com um olhar de ternura e de amor, é abrir o horizonte da esperança, é fazer uma abertura de luz em meio a tantas nuvens, é carregar o calor da esperança.” (cf. http://www.aforismario.it/papa-francesco.htm)
“Ser santo não é um privilégio de poucos, mas uma vocação para cada um.” – Foi assim, por meio de twitter, que o Papa Francisco postou esta frase, no dia 21 de novembro de 2013 (cf. http://www.pinterest.com/goodnewsmin/pope-francis-quotes/)
Eis alguns elementos para se ter um espectro possível do perfil do Papa Francisco, a partir de ditos e escritos seus, desde um olhar entre outros possíveis. Outros, outras por certo fariam outras escolhas, elegeriam outros elementos. Contentemo-nos com um aperitivo no esforço de conhecer facetas do Bispo de Roma, em seu propósito de impulsionar mudanças na Igreja Católica Romana.
João Pessoa, 28 de dezembro de 2013