quinta-feira, 14 de julho de 2016

EM BUSCA DE DISCERNIMENTO EM FACE DE CRESCENTES EPISÓDIOS SEMELHANTES NA IGREJA CATÓLICA ROMANA, NA ATUALIDADE

Sempre que leio ou me deparo com situações de dissenso, sinto-me remetido ao sábio conselho da própria tradição eclesial, muitas vezes repetido inclusive por Dom Helder Câmra: “Nas coisas fundamentais, devemos manter a unidade; no que suscita dúvidas, exercitemos a liberdade; e em tudo, adotemos o amor.”
E tais situações de dissenso, embora não sejam recentes, não apenas têm sido frequentes ao interno da Igreja Católica Romana atual, como tendem claramente a se expandir. Por enquanto, têm tocado mais os católicos e católicas do mundo europeu e da América do Norte. Mas, essas questões tendem a espalhar-se por outros continentes, inclusive pelo Brasil e pela América Latina.
Só para reavivar a memória de ocorrências mais recentes, destaquemos, de passagem: o gravíssimo escândalo da pedofilia ao interno da Igreja Católica (que, como sabemos, não é só um problema de igreja: é de sociedade); o documento assinado por algumas centenas de padres e teólogos de língua alemã (“Pfarrer Initiative”); a investida pelo Vaticano de controle draconiano das atividades das Religiosas dos Estados Unidos, organizadas na conhecida LCWR, congregando cerca de 1500 Religiosas; o profético testamento do Cardeal Martini; o manifesto de padres da Diocese de Illinois, a excomunhão do Pe. Roy Bourgeois; a ameaça de exclusão do Pe. Tony Flannery, só para mencionar estes casos.
Trata-se de casos diversos, mas também apresentando pontos comuns. Que fatores comuns é possível destacar? Lembremos alguns:
– Há um evidente apelo de renovação da Igreja Católica Romana – “Ecclesia semper reformanda!”.
– Há, em todas essas ocorrências, um sentimento latente de indignação com relação ao abandono pela alta hierarquia eclesiástica do espírito do Concílio Vaticano II. Aqui, importa lembrar que o Vaticano II, por seu turno, já vinha como expressão e resultado de um crescente descontentamento com o distanciamento da Igreja Católica das questões-chave do seu tempo. Urgia – como acentuava o bom Papa João – atualizar a ação da Igreja, seu diálogo com o mundo, com outras religiões, com as demais igrejas cristãs. Urgia que a Igreja se refontizasse. O Vaticano II veio, antes, como novo ponto de partida do que como ponto de chegada. E, mesmo assim, não se deu cumprimento satisfatório desse ponto de partida… É, portanto, compreensível o acúmulo de expectativas e cobranças, sob aspectos os mais diversos, por consideráveis parcelas dos católicos e católicas de hoje…
– Dos anos 60 para cá, muita água rolou debaixo da ponte, do ponto de vista de nossas sociedades, e, a despeito de pequenos avanços aqui e ali, a Igreja institucional tem preferido manter-se distante e apática às novas realidades do mundo e dos católicos e católicas, em especial do povo dos pobres, cujos reclamos ela se tem recusado a escutar (inclusive no que diz respeito à valorização positiva da sexualidade).
Tal rigidez não favorece – para dizer o mínimo – um equacionamento razoável do dissenso crescente. Inútil recorrer a medidas de força, em vez de priorizar o evangélico exercício do diálogo. Este se mostra cada vez mais o “sensus fidelium”, como se pode observar, inclusive, nos cartazes exibidos na manifestação em frente à Nunciatura Apostólica, em Dublin (Irlanda): “Diálogo, sim; silêncio, não!”
Outra coisa intrigante: o silêncio de muitos e muitas que, tendo clareza e discernimento sobre as questões em debate, não ousam pronunciar-se. Atitude distinta – graças a Deus – de figuras proféticas de nossos dias, tais como um Dom Clemente Isnard, um Dom Antônio Batista Fragoso, um Dom Pedro Casaldáliga, um Dom José Maria Pires, um Pe. José José Comblin, um Cardeal Martini, para mencionar, de passagem, apenas algumas figuras do clero comprometidas com a causa dos pobres e com a justiça do Reino de Deus, na esteira, aliás, da mensagem passada pelas leituras deste III Domingo Comum, sobretudo a de Lc. 4, 16-19).

Nesses caminhos e descaminhos, consola-nos saber que o Espírito Santo segue seu trabalho RENOVADOR, por meio daquelas e daqueles que, generosos, se abrem ao que Ele tem a dizer a cada um, a cada uma dos discípulos e discípulas no Seguimento de Jesus.

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