VENEZUELA: VIA BELIGERANTE ABORTA SAÍDA DEMOCRÁTICA
Alder Júlio Ferreira Calado
No momento em que estas linhas estão
sendo digitadas, deve estar iniciando, em Bogotá, um encontro com lideranças e
chefes de Estado do continente, acerca dos próximos passos a serem dados, com
vistas a uma suposta saída do impasse venezuelano.
A Venezuela segue a desafiar o
processo democrático, seja por vias endógenas seja por via exóginas. Nos
últimos meses e nos últimos dias, agiganta-se o risco de uma conflagração
sangrenta, de grandes proporções, de modo a abortar o caminho democrático como
única condição de uma saída democrática, de alcance razoável. Não nutro simpatia
pelas escolhas em curso do regime venezuelano. Tenho, de minha parte uma
posição próxima da manifestada pelo sociólogo François Houtart (cf., por
exemplo: https://dialnet.unirioja.es/descarga/articulo/4834924.pdf
).
Independentemente de qual seja a
avalição sobre as escolhas do Governo de fato e legalmente instalado da
Venezuela, sucessivas tentativas endógenas e exógenas de superação da atual
crise têm resultado frustradas. E, ao que parece, as mais recentes tentativas
emitem sinais de nova frustração. E o que nos leva a sinalizar nesta direção?
Cuidemos, a seguir (brevissimamente), de pontuar alguns elementos, tomando em
consideração uma sucessão de análises de um amplo espectro político-ideológico,
indo de analistas venezuelanos a comentaristas europeus; indo de uma
interpretação de Causa Operária, passando por boas análises disponibilizadas
pela Boitempo, a interpretações de Breno Altmann, de Boaventura de Sousa
Santos... (Sobre este último, ver:
Nas linhas que seguem, limitamo-nos a
destacar, rapidamente, elementos em forma de questionamentos que considero
importante compartilhar.
É sabido que crises humanitárias
acontecem, neste instante, em diferentes países, mundo a fora, a merecerem
iniciativas internacionais de verdadeira ajuda humanitária. Por que será que o
caso Venezuela - que está longe de ser o mais grave - desperta tanto sentimento
de solidariedade?
O que os pobres da Venezuela têm de
tão importante - a mais do que outros povos - para merecerem tanta atenção e
interesse, desde Trump e seus aliados?
No passado - recente e menos recente
-, em que resultaram tais ajudas humanitárias (inclusive no Brasil dos inícios
dos anos 60, com a participação de organismos tais como a USAAID)?
Em que resultaram, na pratica, ações
de intervenção similares, no Iraque, na Líbia, etc.?
Pode-se mesmo dizer que daí rebrotou
a Democracia? Qual Democracia?
À parte eventual (e duvidoso!) Interesse
humanitário de grandes corporações estadunidenses e respectivos governos
aliados, será que o petróleo deve ser considerado seu alvo especial?
Que saída democrática é possível, sem
a participação decisiva das diversas forças que constituem o povo venezuelano?
É o povo venezuelano ou são as forças exógenas a quem deve caber a decisão, em
busca de uma saída democrática?
As potências e os grupos externos,
tão interessados em determinar o destino do povo venezuelano, achando-se em
semelhante situação, aceitariam a saída que se está a propor, inclusive a da
criação de um presidente autoproclamado?
Com relação à propagada "ajuda
humanitária", esta alcança que ordem de valor (20 milhões de dólares),
quando comparada ao sequestro de dezenas de bilhões de dólares, feitos pelo Governo
Trump, contra o povo venezuelano?
No caso do Governo brasileiro diante de profundos desafios enfrentados,
não será, no mínimo, temerária uma adesão incondicional à tese de invasão (ou
algo semelhante) do território venezuelano?
Diante da conhecida e reconhecida tradição diplomática do
Brasil, no conjunto das nações, não parece evidente seu perfil já provado e
aprovado, em vez de um perigoso adesismo às soluções de força?
João Pessoa, 25 de fevereiro de 2019.
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