GT-06 da ANPEd/2025 no Memorial das Ligas e das Lutas Camponesas da Paraíba
Alder Júlio Ferreira Calado
Na quinta-feira, 30/10, antes do encerramento da Reunião da ANPED/2025, coordenadores e vários integrantes do Grupo de Trabalho 06 (Educação Popular), inclusive o seu atual Coordenador, Sandro de Castro Pitano, (com quem atuei, em coautoria, em algumas publicações ) da Associação Nacional de Pós-graduação em Educação, por ocasião de sua Reunião Anual realizada em João Pessoa-PB, houveram por bem visitar o emblemático Memorial das Ligas e Lutas Camponesas da Paraíba, situado no Município de Sapé-PB a cerca de 40 Km de João pessoa. Além de integrantes do GT 06 (Educação Popular) também participaram componentes de outros GTs da ANPEd.
Ao felicitar os participantes da ANPEd e de outros Grupos locais - a exemplo de integrantes do Extelar (Grupo de Pesquisa em Extensão Popular da UFPB), inclusive seu Coordenador, Prof. pedro Cruz pela instigante iniciativa tomo a liberdade de rememorar alguns aspectos daquela visita que mais me impactaram. Em ônibus e em alguns automóveis, os visitantes encaminharam-se em direção ao Memorial, no começo da tarde daquele dia 30/10. Acompanhado, na viagem de automóvel por integrantes da Extelar, ao passarmos em frente da Capelinha construída em homenagem a João Pedro Teixeira, no exato lugar onde foi assassinado a mando do famigerado “Grupo da Várzea”, no dia 02/04/1962, tomei a liberdade de convidá-los a prestarmos breve reverência a João Pedro. No Memorial foram todos bem recebidos pelos representantes do Memorial, Alane e Weverton e seus filhos. Após a calorosa acolhida pelos da casa, fomos convidados a tomar uma deliciosa merenda oferecida pelos anfitriões, e compartilhada pelos participantes.
Em seguida, todos formos convidados a visitar a casa onde moraram João Pedro Teixeira, Elizabeth Teixeira e seus 11 filhos e filhas. Ocasião em que vai brilhar a estrela de Weverton, a expor, de forma competente e didática, apoiando-se nas inúmeras fotos, quadros e documentos expostos pelas paredes da casa, em seus diversos compartimentos.
Competente, oportuna e didática exposição que, de modo circunstanciado, passou em revista múltiplos detalhes históricos do heroico movimento das Ligas Camponesas da Paraíba e da região: seus objetivos, seus princípios, suas lideranças principais, os muitos conflitos e perseguições que tiveram que enfrentar, enfatizando especialmente as figuras de João Pedro Teixeira e Elizabeth Teixeira, além de outras tais como João Alfredo Dias (Nego Fuba), Pedro Inácio de Araújo (mais conhecido como Pedro Fazendeiro, vendedor de tecido) e outros.
Tratou-se de uma exposição bastante circunstanciada raramente interrompida por alguns pedidos de maior detalhamento, como foram, por exemplo, os que solicitaram circunstâncias mais precisas sobre a presença em Sapé de altas autoridades dos Estados Unidos - com a indisfarçável preocupação de evitar que o Brasil se transformasse em uma nova Cuba -, além de outro pedido acerca da forte solidariedade prestada pelo Governo Cubano à família de João Pedro e Elizabeth Teixeira.
Em Seguida, sob a coordenação do Prof. Severino Silva, da Linha de Pesquisa Educação Popular do PPGE da UFPB, Alder Júlio Ferreira Calado foi convidado a tecer algumas considerações acerca da Educação Popular vivenciada pelas Ligas Camponesas, prometendo fazê-lo em 20/25 minutos. Começou por solicitar às pessoas presentes - uma trintena - que se apresentassem, nome, procedência geográfica, atuação profissional, vínculo com a ANPEd e outras instituições. Constatou-se uma diversidade de procedências geográficas de várias regiões do Brasil, sendo grande parte das pessoas presentes integrantes da ANPEd.
Atendo-se, agora, às Ligas Camponesas do ponto de vista da Educação Popular, começou lembrando que este Movimento Popular teve uma curta duração - de 1954 a 1964, o que muito limitou seu processo organizativo, formativo e de lutas. Tendo surgido no Engenho Galileia, Município de Vitória de Santo Antão-PE, em 1954, logo se estenderia por vários Estados nordestinos - sobretudo na Paraíba - e por outras regiões do Brasil. Em que pese a grande influência da Revolução Cubana de 1959, e a despeito da participação nas Ligas Camponesas de lideranças socialistas (a exemplo de Francisco Julião) e comunistas (a exemplo de militantes do PCB), especialmente na América Latina, as Ligas Camponesas dificilmente podem ser interpretadas como um Movimento Popular propriamente revolucionário, mas antes como pré-Revolucionário, dado o contexto de enorme efervescência sócio-política, eis que, desde a fundação lutavam fundamentalmente por direitos trabalhistas, pelo direito de se organizarem em sindicatos rurais então legalmente proibidos, permitido apenas aos trabalhadores urbanos. Lutavam fundamentalmente contra a cruel exploração praticada pelos latifundiários - contra o “cambão” (obrigando os camponeses a trabalharem alguns dias de graça para seus patrões), o roubo na medida da quantidade de cana por eles cortada, o roubo nas contas dos barracões, obrigando os trabalhadores e suas famílias a se endividarem, comprando neles seus mantimentos, com preços extorsivos, além da humilhação com que tratavam as famílias dos trabalhadores.
No tocante aos aspectos relativos especialmente a Educação Popular, as Ligas Camponesas apresentaram relevantes marcas, em sua trajetória. Uma delas tem a ver com seu profundo compromisso com o “ethos” comunitário, marca especialmente testemunhada pela figura de João Pedro Teixeira. Chama a atenção sua profunda aposta transformadora na Comunidade Camponesa. São inúmeros os testemunhos acerca deste traço de João Pedro: em um contexto de penúria e de escassez de transporte, João Pedro saía frequentemente andando a pé quilômetros, a procura de companheiros e companheiras a convencê-los a se filiarem à Liga de Sapé, como forma de resistência aos ataques corriqueiros dos patrões: destruição de roças pelo gado do patrão, constantes desrespeitos ao mínimo de direitos dos trabalhadores, expulsões arbitrárias de suas casas, entre outros tipos de ataques. É assim que vai crescendo o número de filiados da Liga de Sapé, de modo a tornar-se a maior da Paraíba.
Exercitando este “ethos” comunitário, e ajudado por outras lideranças da Liga de Sapé, João Alfredo Dias (mais conhecido como “Nego Fuba”) e Pedro Inácio de Araújo (mais conhecido como “Pedro fazendeiro”) entre outros e outras, conseguem plantar uma nova consciência entre os camponeses, consolidando sua força organizativa e de resistência aos abusos cometidos pelos latifundiários da região. Tal organização também se fortalecia pelo apoio e solidariedade de lideranças políticas da região, a exemplo do então Deputado Francisco Julião e outros.
Um terceiro aspecto - concernente ao processo formativo - enfrentou mais dificuldades, inclusive pelo curto tempo de sua duração (menos de 10 anos). Mesmo assim tais compromissos (“ethos” comunitários, organizativo, formativo e de lutas) renderam memoráveis conquistas, contando inclusive com a assessoria de advogados sindicais e lideranças políticas do Estado.
Em seguida, o Prof. Severino Silva convidou Alane Silva, anfitriã do Encontro e ex-Presidente do Memorial das Ligas e das Lutas Camponesas da Paraíba, para expor diferentes aspectos da estrutura organizativa e do funcionamento bem como dos principais Projetos vivenciados pelos protagonistas do Memorial. Noticiando a recente eleição da Professora Juliana Teixeira, neta de João Pedro e Elizabeth Teixeira, como a atual Presidente do Memorial das Ligas e das Lutas Camponesas da Paraíba, com muita segurança e fluência, Alane cuida, então, de expor, durante cerca de uma hora, os inícios da fundação do Memorial, ainda na metade da década dos anos 2000, rememorando os principais protagonistas - mulheres e homens - do Memorial, de modo a destacar a participação de figuras tais como da Irmã Marlene Borges, da Irmã Tony, Luizinho (pai de Alane Silva), Pe. Hermínio Canova, Genaro e Gláucia Ieno, Alan, Socorro, João Fragoso, Alder, Iranice, Nazaré, Toninho, entre outras pessoas.
Alane prossegue, discorrendo sobre a formação das primeiras Diretorias e seus componentes, destacando suas iniciativas, seu empenho em conectar-se organicamente com a Comunidade de Antas, especialmente com os acampados (em processo de luta da Fazenda Antas), (só recentemente atendidos em seus pleitos), as reuniões ampliadas da Diretoria do Memorial, a cada mês, seu empenho de contactar os diversos Assentamentos vizinhos ao Memorial, o Centro de Formação Pe. José Comblin, bem como diversas iniciativas, especialmente no campo da Formação em conjunto com várias Escolas da região. Eis um breve resumo da rica exposição feita por Alane atualmente integrando a Turma de Geografia, no âmbito do PPG/UFPB, sendo orientanda da Professora Emília Moreira.
Não obstante a hora avançada, o Prof. Severino Silva abriu espaço para um breve momento de diálogo com as pessoas presentes, acerca das exposição de Alane e de Alder, em blocos de 03/04 pessoas. Relevantes comentários e questionamentos passaram a ser trocados entre as pessoas presentes. Sempre em ambiente de empolgação todos os participantes encerraram o Encontro, com fotos e fraternos abraços.
João Pessoa, 28 de Novembro de 2025