NO DISCIPULADO E NA MISSÃO, CRISTÃ(O)S REENCANTAM O MOVIMENTO DE
JESUS: notas a propósito do empenho pela unidade dos Cristã(o)s
Alder Júlio
Ferreira Calado
Nesses tempos
atípicos e de profunda crise, multiplicam-se e se agravam os contrastes. A
eleição (seguida da recente posse) de Trump se acha nas antípodas do papel de
liderança de novo tipo, cumprido pelo Bispo de Roma, em gestos, palavras e
escritos (cf., por ex., recente entrevista deste, concedida a El Paí, onde
expõe suas fundadas inquietações acerca dos justificados temores em relação ao
novo governo dos Estados Unidos: http://brasil.elpais.com/brasil/2017/01/21/internacional/1485022162_846725.html) Tempos de guerra
e de paz. Tempos de misérias e de esperanças. A carnificina em curso no
sistema prisional brasileiro contrasta com os avanços moleculares observáveis
em não poucas iniciativas de convivência com o Semiárido e com distintos
biomas. Do alcance destas últimas dá mostras uma simples comparação entre os
terríveis efeitos socioambientais provocados pela seca de 1979 a 1983, e os
danos relativamente reduzidos da prolongada seca atual (cujos efeitos nocivos
foram relativamente menos ressentidos
pelas populações do Semiárido, em comparação com a longa estiagem precedente).
Ao reacionarismo que hoje prevalece, em tantas partes do mundo, opõem-se
ousados empreendimentos alternativos à barbárie, sob diversos aspectos. No
plano das Igrejas Cristãs, ante o ascenso de aterradoras práticas e concepções
fundamentalistas, despontam experiências moleculares, portadoras de promissores
sinais de relançamento do Movimento de Jesus (na perspectiva abordada por Gerd
Theissen e outros).
Nunca é demais
lembrar que, num mundo globalizado, em vão se cuida dos desafios crescentes,
em escala apenas setorizada: para problemas globais, soluções globais. Assim,
também aqui, nossa perspectiva é a humanidade, cercada de complexa
diversidade, a requerer um esforço de construção de uma unidade dentro desta diversidade.
Se tratamos, nessas linhas, da unidade dos Cristãos, é apenas como um ponto de
partida em busca de alcançarmos a humanidade inteira, composta, em
considerável medida, por cristãos, cuja importância é reconhecida, pela
influência – positiva ou negativa – que exerce no mundo atual. Se com eles,
com elas, podemos contar positivamente, por que não tentar?
Dos imensos e
complexos desafios diante de nós, seja-nos permitido destacar apenas três
exexmplos - o último dos quais tomaremos como alvo destas notas. São dignos de
registro, pelo seu alcance inovador, os avanços de grupos, associações e
movimentos de Leigas e Leigos, em diversas partes do mundo, a protagonizarem
iniciativas e ações clamando por mudanças na/da organização estrutural
eclesiástica. Em especial, cumpre destacar a ação inovadora de alguns grupos
de mulheres e teólogas feministas, cujo alcance inovador nos faz lembrar o ímpeto instituinte de vários movimentos leigos da baixa Idade
Média, em especial o Movimento das Beguinas, ao qual nos temos reportado, em
outras ocasiões. Ainda recentemente, em entrevista concedida ao jornal Lacroix,
de 5 de maio de 2016, o Papa Fransisco
perguntado sobre sua leitura da progressiva redução do clero da Europa, não
hesitou em asinalar que, em algumas partes do mundo, (a exemplo da Coreia do
Sul), foram os leigos e as leigas os principais protagonistas da evangelização,
graças à ação do Espírito Santo (Cf. http://www.la-croix.com/Religion/Pape/Entretien-exclusif-avec-pape-Francois-integralite-2016-05-17-1200760636). Em diferentes
espaços eclesiais (católicos, ortodoxos, reformados), não têm sido raros
relatos de expeiências inovadoras, empenhadas e inspiradas pelo propósito de
responder a velhos e novos desafios do nosso tempo, à luz do Movimento de
Jesus, do qual se distanciaram significativamente não poucas práticas e
concepções institucionais dessas Igrejas cristãs. O terceiro exemplo a ser aqui
destacado, reporta-se ao enorme esforço envidado por setores dessas mesmas
Igrejas cristãs, de construção de
sólidas bases em vista da unidade dos Cristã(o)s. Este último ponto, como já
assinalado, é que tomamos como objeto destas linhas. E propomos fazê-lo, da
seguinte maneira: 1) começamos por contextualizar este esforço, ilustrando com
alguns fatos recentes e menos recentes, nessa direção; e 2) sublinhando alguns desafios sócio-eclesiais,
cuidamos de salientar algumas condições de novo tipo, em termos de critérios
comuns a serem assumidos pelos Cristã(o), empenhados na busca de uma unidade,
em novo estilo (isto é, que não tenha mais a ver com uma pretensa quanto falsa
uniformidade).
1) Passos recentes e menos recentes a reacenderem as esperanças de
unidade dos Cristã(o)s
Tal como o Povo de Deus, em todos os tempos, também os seguidores de Jesus, tempos
depois conhecideos como Cristãos, sempre se apresentaram em sua diversidade,
desde seus começos. A unidade descrita em alguns textos neotestamentários,
como em Atos dos Apóstolos (cap. 2, cap 4), não se fez sem a incidência de
diferenças e mesmo de dissensos, inclusive em meio a figuras suas das mais
destacadas, como é o caso relatado do dissenso entre Paulo e Barnabé (cf. At
15, 36-49), ou entre Paulo e Pedro (cf. Gl 2, 11-16). O conviver humano
pressupõe a diversidade. É a condição em que se tecem laços de unidade. Nos
casos referidos, o diálogo que permitia a exposição e superação de eventuais
antagonismos e de meljhor lida com as diferenças, exercia-se por meio d os
concílios, o de Jerusalém tendo sido o primeiro. Aqui se inaugura, por assim
dizer,uma certa cultura consultiva ou conciliar ou sinodal, isto é, uma via
democrática de se enfrenar e de se superar confilitos, que também fazem parte
da caminhada humana, incidindo portanto ao interno dos espaços eclesiais.
Ocorre que, assim como sucede aos caminhos
de liberdade – sempre ameaçados pelos caprichos do poder -, a via consultiva
iria sofrer sucessivos ataques. Entre os que se diziam cristãos, também, era
grande a avidez de poder, por parte de grupos minoritários, a quem pouco ou
nada interessa uma organização em constante movimento, desde a base.
Acompanhando a evolução histórica do
Cristianismo, constatamos, om tristeza, a crescente inflluência de grupos
minoritários sobre o conjunto do povo cristão, a implicar crescente
concentração de poder nas mãos de seus protagonistas, isto é, do clero. Para
tanto, este passa a conceber e a pôr em prática várias estratégias de controle
do poder. Uma primeira prende-se a estabelecer uma progressiva apartação de
seus membros em relação ao conjunto dos cristãos, no que diz respeito
sobretudo à forma de organização das estruturas eclesiásticas (normativa,
disciplinar, litúrgica, teológica, formativa), cada vez mais enraizadas en sólida base do pensamento helenístico – donde
a força atribuída aos conceitos e definições (nominalismo), ainda que
descolados do chão da vida.
Outra estratégia eficaz – diretamente
derivada do processo de helenização - foi a
elaboração de um sistema normativo, aplicado
ao conjunto dos cristãos, com o claro objetivo de fazer valer os privilégios
da camada dominante. Tal sistema normativo passava pela elaboração de uma
teologia capaz de justificar a imposição e observância de seus privilégios.
Aqui, vale ressaltar o papel fundamental cumprido pelo processo de helenização
do Cristianismo, característica maior dos primeiros tempos da Cristandade.
Ainda que incorporando conceitos bíblicos, estes passariam a ser interpretados
de modo cada vez mais distanciado das práticas e valores do Movimento de
Jesus. Nesse mesmo sentido, muito tem contribuído seu sistema doutrinário, que
mais separa do que liga fé e vida. Em sua grade sacramental, por exemplo,
ainda que confira ao Batismo o um lugar de relevo - é o primeiro a ser citado, além de nos
conferir uma condição de radical igualdade fraterna perante Deus -, na
prática, porém, acaba sendo o Sacramento da Ordem o mais importante, não raro
utilizado para garantir seus privilégios, a partir de sua exclusiva
prerrogativa de produtores e controladores dos bens simbólicos, doutrina cuja
eficácia – mais de poder hierárquico do que d serviço gratuito – interage
dinamicamente com sua divisão
territorial em dioceses e paróquias, cujos titulares se comportam, não raro,
mais como senhores feudais do que como autênticos servidores do Povo de Deus.
E com uma agravante: tal estilo de organzação também contamina um número
expressivo de leigos e leigas, que, por vezes, agem mais como padres
autoritários do que como leigos servidores... Assim agindo, destoam consideravelmente
do estilo organziativo das primeiras comunidades cristãs e do Movimento de
Jesus, cujas palavras não deixam dúvida: os chefes das nações assim se
comportam, mas entre vocês, não seja assim (cf. Mc 10, 42-45).
Como é sabido, o Movimento de Jesus tem como
fundamento o serviço aos pobres e desvalidos de todas as sociededades. Seus
valores fundamentais são a fraernidade (portanto, o cultivo da horizontalidade
nas relações de con-vivência), a partilha, o estilo de vida de sobriedade e de
simplicidade, a coversão, o respeito à diversidade, a misericórida, a
solidariedade, especialmente com os mais sofredores, o serviço gratuito alegre
e discretamente prestado, sobretudo aos mais vulneráveis e injustiçados, isto
fazendo, não como se estes fossem meros alvos de “caridade”, mas como
protagonistas de sua própria libertação – “Tua fé te salvou!” - como .... Não foram bem tais práticas e valores que
constituíram ou que sigam constituindo a marca da Cristandade. O que aqui se tem feito, salvo exceções
honrosas e venerandas, vai em direção oposta. Com efeito,l o processo de
apartação significou e significa, na prática, a negação desses valores, ainda
que o discurso os mantenha, mas sem convencerem... Ao longo de séculos,
principalmente a partir da era constatiniana (séc. IV), o clero vai
aprofundando seus privilégios, para o que todo aquele sistema normativo – do
qual é expressão relevante o famigerado Código de Direito Canônico – se vem
mostrando enormemente eficaz..
Tal sistema normativo tem atravessado
séculos, a despeito de vozes proféticas terem se levantado, em todo esse
percurso. O Concílio Vaticano II (1962-1965), em que pese a ação reacionária
de sombrias forças eclesiásticas, representou uma lufada de primavera, que,
infelizmente, não prosperaria. Alguns de seus documetnos conclusivos, entre os
quais as constituições Lumen Gentium
e Gaudium et Spes. Esforço que se
aprofundaria na América Latina, a partir da Conferência Episcopal
Latinoamericana de Medellín (Colômbia, 1968) e de Puebla (México, 1979). Estas
experiências representaram, por parte da Igreja Católica, as iniciativas mais
fecundas de retomada do Movimento de Jesus. Todavia, durante os pontificados
do Papa João Paulo II e do Papa Bento XVI, sofreram grave retrocesso, até à
chegada do Papa Francisco, em 2013, sendo que ele segue ainda sendo uma voz no
deserto...
E, em relação às demais Igrejas Cristãs, o
que se tem passado, desde os respectivos processos de separação da Igreja Católica
Romana? Em linhas sucintas, lembramos que, com a separação da Igreja Ortodoxa
(ou das Igrejas Ortodoxas – a de Antioquia, a da Rússia, a de Alexandria...),
em 1054, e das Igrejas Reformadas, em suas diferentes denominações – as ditas
históricas, as pentecostais, as neo ou pós-pentecostais... (a partir de 1517),
sua trajetóira específica, em relação ao Movimento de Jesus, também comporta
altos e baixos, à semellhança da trajetória histórica da Igreja Católica
Romana.
Nesse sentido, orientamo-nos por perguntas
do tipo: que motivos fundamentais induziram tais Igrejas à separação? Teriam
sido principalmente motivos doutrinais ou práticas concretas inspiradas pelo
Movimento de Jesus? Como entendermos a mútua excomunhão, cometida pela Igreja
Católica Romana e, em reação, também pela Igreja Ortodoxa? Que inspiração
direta tem tal decisão, vinda do Movimento de Jesus?
Sem prejuízo da evolução clericalizante, a
cristandade foi estendendo-se, não apenas pela Ásia Menor, mas também pela
Europa Oriental e Europa Ocidental. Conflitos aqui e ali eram resolvidos,
parcial ou totalmente, pelos concilios, quase todos motivados por uma disputa
doutrinal, da qual resultaram diferentes dissensos doutrinais, acusados de
Heresias, isto é, posições discordantes da linha doutrinal então dominante. A
própria separação da Igreja Ortodoxa, da Igreja Católica Romana, se deu em
razão de disputa doutrinal (principalmente em relação às interpretações sobre
o mistério da Santíssima Trintade). Por outro lado tal cisão também se deveu a
uma disputa de poder: enquanto a Igreja Ortodoxa sustentava uma posição
favoravel a uma organização paritária dos principais centros de organização
eclesial, com perfil autonomo para cada centro, sem prejuízo de sua unidade
(diz-se tratar-se de Igreja autocéfalas), a Igreja Católica Romana, por seu
lado, propugnava por uma hegemonia sobre as demais, pretendendo aquela que o
Bispo de Roma (chamado “Papa”) tivesse ascendência sobre os demais centros
eclesiais (sobre o de Antioquia, sobre o de de Alexandria, sobre o da Grécia,
sobre o da Rússia), razão principal da separação, ainda que não sofresse alteração
maior sua forma interna de ogarnização, apenas a Igreja Ortodoxa passou a ter
como referencia de unidade, não o Papa, o Bispo de Roma, mas o Patriarca de
Antioquia.
Cerca de cinco séculos após a separação da
Igreja Ortodoxa, teria lugar a separação das Igrejas Reformadas. Justamente em
outubro próximo, as Igrejas Reformadas estarão a comemorar quintentos anos do
início da Reforma, cuja referência mais forte residiu na afixação na porta do
templo de Wittemberg, por Martinho Lutero, de suas famosas 95 teses, que, como
se sabe, se contrapuhhan a pontos doutrinais e disciplinares do sistema
normativo católico, o que agravaria o quadro das relações entre o papado e
seus apoiadores, de um lado, e parte considerável de cristãos, de outro, do
que resultaria uma sucessão de episódios e represálias, inclusive a excomunhão
do monge agostiniano Martinho Lutero, sucessão que também desembocou na
realização, décadas depois, do Concílio de Trento, marcando uma verdadeira
contra-reforma feita pela Igreja Católica, como tentativa de fortalecer seus
quadros cntra a difusão das Igrejas Reformadas.
Dois pontos a destacar, a essa altura. As
dissensões que culminaram com a separação dos irmãos reformados não tiveram
início, nessa época. Séculos antes, eram notáveis as dissensões, ao interno da
Igreja Católica. Nesse sentido, os séculos XII a XV constituem um período de
numerosas sublevações, em especial da parte dos moviemntos pauperísticos, a denunciarem os graves
desmandos da alta hierarquia da Igreja Católica. Neste caso, as dissensões se
davam sobretudo no campo pastoral, bem mais do que no plano doutrinal. Como se
pode perceber, através de uma leitura atenta das teses de Lutero, aqui as
divergências se dão especialmente no campo doutrinal, ainda que com
reprecussão no plano também organizacional (mas, também, com justificativas
amparadas na douotrina, bem mais do que nas característica mas fortes do
Moviemento de Jesus: preferência pelos pobres, fraternidade radical,
solidariedade, partilha, estilo de vida – algo bem mais comum nos movimentos
pauperísticos. Destes esteve mais próximo, inclusive, um colega de Lutero, com
quem dialogou um bom tempo, depois acabando distanciados. Referimo-nos ao
também teólogo Thomas Muntzer, que, a exempplo de Lutero, também sustetava
críticas contra a alta hierarquia, mas ia bem além de Lutero, à medida que foi
capaz de radicalizar suaposição de solidariedade e defesa dos camponeses
alemães, não apenas contra a alta hierarquia da Igreja Católica, mas também
contra os príncipes.
A Igreja Ortodoxa, à semelhança da Igreja
Católica Romana e das Igrejas Reformadas, sempre cuidou de preservar elementos
fundantes do Cristianismo de Origem , principalmente no campo dourinal. Sucede
que, no plano organizacional, todas seguiram ao seu modo, críterios
Hierarquizantes, do tipo piramidal, em que os ministros ordenados – quase todos
homens- controlam o conjunto de cada Igreja e em que seus fieis em grande
parte compostos por mulheres não são contemplados pelo direito de decidir
sobre as questões fundamentais do caminhar de cada Igreja. Neste particular,
não lhes é fácil atestar a sua fidelidade ao moviemtno de Jesus.
Nos ultimos tempos, principalmente em
algumas Igrejas Reformadas, constatam-se promissores passos de efetivo
reconhecimento à condição de radical fraternidade conferida a todos pelo
Batismo, inclusive reconhecendo legetimidade da vocação de mulheres à condição
de diaconisas de presbíteras e de episcopisas.
2) Desafios
e condições de aprofundamento do empenho, por parte dos Cristã(o)s, em
recontruir a unidade, na perspectiva do Movimento de Jesus
Há de se reconhecer, de partida, que não vem
de ontem ou de hoje o empenho pela unidade dos Cristã(o)s. Passos inúmeros têm
sido dados, nessa direção. A despeito de avanços pontuais, aqui e ali, também
é verdade que muita estrada ainda há pela frente. Trata-se de um desafio enorme.
Basta lembrarmos que já conta com um milênio... Por outro lado, mais
recentemente, novos passos nessa direção têm resultado promissores,
especialment pela inovação das tentativas mais recentes. Hão de se destacar,
por exemplo, no campo das relações Igreja Católica-Igreja Ortodoxa, algumas
iniciativas fecundas recém-produzidas por seus respectivos líderes.
Com efeito, reconhecendo uma sequência de
iniciativas pela unidade dos cristãos, pelo menos desde o Concílio Vaticano II
e no imediato pós-Vaticano, graças inclusive ao protagonismo de Papa Paulo VI,
do Patriarca Atenágoras, de Constantinopla e de figuras evangélicas a exemplo
de Roger Schütz, além de outras. Nesse sentido, cabe sublinhar a visita feita
pelo Papa Paulo VI ao Conselho Ecumênico de Igrejas, em Genebra, em 1969: cf.
https://w2.vatican.va/content/paul-vi/fr/speeches/1969/june/documents/hf_p-vi_spe_19690610_consiglio-ecumenico-chiese.html
Antes
mesmo, ainda durante uma aula conciliar do Concílio Vaticano II, mais
precisamente, em 7 de dezembro de 1965, repercutiu positivamente a declaração
conjunta emitida pelo Papa Paulo VI e pelo Patriarca Atenágoras, da Igreja
Ortodoxa de Constantinopla, na qual manifestavam sua disposição comum de mútuo
reconhecimento de descaminhos trilhados, no passado (desde 1054), bem como de
se empenharem na superação desta chaga, ainda que também reconheçam a complexidade
da causa, em favor da superação da qual estavam dando um passo (cf.
Sucede que é, a partir do pontificado do
Papa Francisco, que se têm dado passos mais promissores, seja em relação à
Igreja Ortodoxa – em significativos encontros com o Patriarca Bartolomeu, da
Igreja Ortodoxa Grega, com o Patriarca Kirill, da Igreja Ortodoxa Russa, seja
com o Arcebispo Hieronymos, de Atenas -, seja com líderes de Igrejas
Reformadas, a exemplo do encontro por ocasião dos preparativos da comemoração
dos 500 anos das Igrejas Reformadas, atendendo ele a convite dos dirigentes da
Federação Mundial Anglicana, em Lund,
na Suécia, além de sua presença em encontros ecumênicos na Itália.
A novidade desses encontros reside na
disposição de pôr em prática um ecumenismo de base evangélica, na perspectiva
do Movimento de Jesus, cujo propósito fundamental não é de examinar pontos
doutrinais, mas o de buscar pontos comuns, a partir dos valores evangélicos –
de serviço à causa dos pobres e desvalidos, da justiça, da, da solidariedade
com os sofredores. Trata-se de aspectos bem presentes nesses encontros, como
sucedeu em sua visita comum a Lesbos, em tocante iniciativa de solidariedade
aos refudiados, sempre abertos e prontos à força da oração e do diálogo
fraterno. O mesmo vale em relação à busca comum de unidade com os irmãos e
irmãs reforados.
O quê, então, ressaltar com mais força
dessas iniciativas de busca de unidade, em novo estilo? Vários pontos podem
ser destacados. De nossa parte, sublinhamos alguns deles. Um primeiro aspecto decisivo
a merecer destaque, é de se entender e se viver essa nova busca de unidade
entre os cristãos, como expressão do contínuo processo de conversão, a que são
chamados todos os que se colocam a serviço da (re)constrção da unidade. Em
séculos passados, ficou gravada a expressão: “Ecclesia semper reformanda est”
(A Igreja deve estar sempre em processo de reforma). Uma variante desta
expressão é a seguinte: “Reformata, Ecclesia semper reformanda est.” É claro
que isto guarda forte atualiade: a renovação é um horizonte sempre presente em
nossa vocação discipular-missionária. Sem embargo, a mesma expressão pode ser
interpretada como um apelo mais institucional – e o é! – do que um chamamento
mais direto a uma constante renovação dos Cristã(o), seja no âmbito
institucional, seja no plano pessoal. Para evitar certa tendência a uma
interpretação apenas institucional, talvez melhor nos sirva o apelo mais
direto à conversão, entendida como processo, cmo algo ininterrupto, algo susceptível
de ser assim expresso: “Conversi, Christiani semper convertendi sunt” (Uma vez
convertidos, os Cristã(0) devem sempre estar em processo de conversão). Não
apenas sua instituição, mas também pessoalmente. Daí o apelo mais forte ao
movimento como modo de superar o risco da institucionalização, vale dizer, da
burocratização. Daí a grande inspiração no Movimento de Jesus. São evidentes
os riscos burocratizantes e de engessamento dos carismas pela rotinização
institucional. Daí a inspiração no Movimento de Jesus, constituído de, e
animado por uma discipulado itinerante, sempre aberto ao novo, sempre pronto a
novos aprendizados e novas experiências missionárias. Processo de vonversão
que implica novos critérios de organização, de formação, de mobilização.
Um outro aspecto deste esforço mais recente
em busca da unidade dos Cristãos – como passo necessário à busca de unidade na
diversidade do conjunto dos Humanos, tem a ver com incorporação e
desenvolvimento de novos critérios. À
diferença de tentativas precedentes, as mais recentes se acham sobremaneira
impregnadas de uma unidade que se vá construindo a partir da experiência
conjunta de presença e solidariedade efetiva com os pobres e sofredores. Os
próprios momntos de oração comum se acham bem inspirados de motivações de
promoção da justiça, como fundamento de construção da paz desejada. Aí não se
trata de uma presença assistencialista – expressão de um sentimento de dó -,
mas, antes, de um empenho em ajudar os pobres, os desvalidos, os injustiçados
a despertarem e a porem em prática suas potencialidades libertadoras, seu
protagonismo libertáio. Mais uma vez, somos instados a, rente às urgências
presentes e aos apelos maiories do Evangelho, relativizar disputas doutrinárias em prol de
assumirmos a essencialidade do Seguimento de Jesus: a causa libertadora dos
pobres. Se na Idade Média (e para além dela), houve quem tornasse prioridade a
questão doutrinária – diferentemente do Evangelho e do testemunho de Jesus de
Nazaré -, a ponto de se bradar que “Extra Ecclesiam nulla salus” (Fora da
Igreja, não há salvação), hoje, contudo, somos chamados a bradar e a pôr em
prática outro clamor: “Extra pauperes, nulla sallus” (Fora dos pobres, não há saída)...
Aqui, nos cumpre exercitarmos uma interpretação adequada e atualizada de quem
são esses pobres, essas vítimas, esses injustiçados, para além de uma
interpretação que os restrinja apenas aos pobres convencionais, de modo a
incluir também: a Mãe-Terra, as mulheres, as vítmias de feminicídio, de
misoginia, de etnocídio, de genocício, de racismo, de homofogia, de xenofobia,
etc., etc., etc. Nesse sentido, somos convidados a associar-nos às lutas
travadas, por exemplo, nos Estados Unidos, juntando-nos a uma significativa
rede de mulheres, de religiosas, de cristãos de várias Igrejas e confissões e
sem confissão...) que se têm organizado e mobilizado cntra as distintas de
formas de barbárie representadas pela proposta de Trump e companhia...
Um outro aspecto a enfatizar como critério a
ser observado, em nossa aventura de busca de unidade entre os Cristãos –
sempre tendo em vista a perspectiva de unidade dos Humanos, em comunhão com a
dignidade da Mãe-Terra – tem a ver com o nosso compromisso de cuidar
decididamente de nossa “Casa Comum”, causa primordial para a qual aponta tão
bem a proposta feita na “Laudato sì”, feita aos Humanos pelo Bispo de Roma.
Nessa mesma busca de unidade, em novo
estilo, cumpre ressaltar a necessidade de uma crescente abertura comum à
diversidade humana. Os caminhos do Reino de Deus, anunciado e inaugurado por
Jesus, são de uma diversidade inesgotável. Quem pode limitar as vias
escolhidas pelo Espírito Santo? Quem é capzar de fechar-Lhe os caminhos? Quem
é capaz de enjaular o Espírito Santo, Espírito de Liberdade? Não será que a unidade que todos somos chamados a ir construindo,
não passa pelo reconhecimento da inesgotável diversidade dos caminhos do
Espírito Santo, sendo nosso papel o de tecelões e tecelãs dos infinitos fios
desta diversidade, seguindo os critérios do Movimento de Jesus?
João Pessoa, 03 de fevereiro de 2017
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