Alder Júlio Ferreira Calado
No próximo mês, mais precisamente em 26 de março,
estaremos a comemorar meio século da publicação da Encíclica Social Populorum Progressio (O Desenvolvimento
dos Povos) assinda pelo Papa Paulo VI, em 1967, menos de dois anos após o encerramento do Concílio
Vaticano II, do qual também tornou-se emblemática a Constituição Pastoral Gaudium et Spes (sobre a Igreja no
mundo de hoje). Não estamos a comemorar apenas “mais uma encíclica”. De fato,
pelo seu alcance social, pela relevância dos temas então enfrentados, bem como
pela sua metodologia, trata-se de uma que avaliamos, ao lado das duas escritas
por João XXIII e das mais recentes, da lavra do Papa Francisco,
especialissimamente a “Lodato si”, - das mais relevantes, dentre as cerca quinze
publicadas, desde a “Rerum Novarum”, do Papa Leão XIII (1891).
Nas linhas que seguem, buscamos 1) contextualizar o
processo de elaboração desta encíclica social; 2) destacar suas grandes linhas;
3) rememorar aspectos de sua recepção, em especial na América Latina e no
Brasil; e 4) enfatizar a dramaticidade e a atualidade do seu clamor.
1) Recobrando
aspectos do contexto em que apareceu a Populorum Progressio
Tempos de densa efervescência, os que coincidiram com
a publicação da Encíclica Social Populorum
Progressio (O Desenvolvmento dos Povos). Nos vários continentes, cresciam,
assustadores, os índices de miséria, de fome, de mortalidade infantil, ao mesmo
tempo em que, entre as populações dos países centrais do Capitalismo,
ostentavam-se situações de abundância e de consumo desenfreado: “Os povos
pobres ficam sempre pobres e os ricos se tornam cada vez mais ricos.” (PP, n.
57). Vive-se o ápice dos conflitos
decorrentes das perversas raízes do colonialismo, em especial nos países
africanos, cujos povos vão conquistando, a duras penas, sua independência das
velhas metrópoles européias. Emerbem “as jovens nações”, como a elas se
referia, então. Diante das graves tensões entre Estados Unidos e União
Soviética, um crescente número de países, nos diversos continentes, decidiam
constuir um caminho de não-alinhamento a uma dessas potências, e se puseram a
trilhar caminhos próprios, reforçando sua solidariedade na busca de autonomia.
Tinham outras prioridades: em vez de tomarem partido de surviência a uma
daquelas potências, optavam por reunir esforços no enfrentamento de tantos
desafios de suas gentes, seja quanto ao combate à fome, à miséria, seja com
relação a assegurar condições propícias para o enfrentamento exitoso de grandes
dramas sociais, como o analfabetismo e o seu direito a uma inserção no cenário
internacional justa e respeitosa de sua dignidade.
Respirava-se, com efeito, um cenário de intensas
reivindicações de mudanças estruturais. Entre esses protagonistas mais
destacados – operários, camponeses... – estavam os jovens estudantes, de várias
partes do mundo, em especial na França, tendo sido um marco histórico
expressivo o Maio de 1968, que já ao tempo da publicação da PP, se gestava nas
escolas, nas praças e nas ruas de vários países.
A América Latina – sobretudo o chamado Cone Sul (Brasil,
Chile, Argentina, Uruguai...) –, sufocada por um “rumor de botas” (Eder Sader),
seguia mergulhada nam longo e tenebroso período de ditaduras civil-militares. Os
povos andinos da Bolívia, do Peru, do Equador, da Colômbia... confrontavam-se
com semelhantes desafios, enfrentados de modo aguerrido, a exemplo da atuação
de jovens, camponeses e trabalhadores animados por figuras como Camilo Torres
(padre, assessor dos universitários, assassinado na Colômbia, em 1966) e Che
Guevara (assassinado na Bolívia, em 1967). Neste mesmo contexto de crescente
efevescência, importa ter presente o alcance sócio-pastoral de alguns
movimentos, a exemplo do Movimento Sacerdotes para Terceiro Mundo, atuando
sobretudo na Argentina.
Convém lembrar o importante impacto da Populorum
Progressio, também, nos preparativos e na realização da Conferência Episcopal
Latino-Americana, em Medellín (1968), da qual se diz, a justo título, ter sido
– ao lado do emblemático “Pacto das Catacumbas” (Roma, novembro de 1965), a
forma latino-americana de recepcionar o Concílio Vaticano II. Este é celebrado
pelas condições que promoveu à introdução da Igreja Católlica Romana na
modernidade, o mesmo, todavia, não acontecendo em relação ao mundo dos pobres,
em que pesem algumas referências significativas, em alguns dos seus dezesseis
documentos.
No processo de elaboração deste documento, impõe-se
uma menção. Graças a uma densa e longa atuação, em vários países do mundo, como
pesquisador e como assessor, em sua área, é sabida a contriubuição do Pe.
Louis-Joseph Lebret, colaborador próximo também do Papa Paulo VI. Tornou-se
célebre, inclusive no Brasil, desde final dos anos 40, a contribuição do
dominicano Pe. Lebret, fundador do Movimento Economia e Humanismo, tendo
inspirado fecundas iniciativas de solidariedade com povos do Terceiro Mundo. Na
França, ainda hoje, goza de
reconhecimento público o CCFD – Commité contre la faim et pour le développment.
Já duante o Concílio Vaticano II, a figura de Lebret
constituía uma referência entre os assessores para temas sociais. Mas, foi
decisiva sua participação efetiva no processo de redação da Populorum Progressio, tal a confiança e
tal o reconhecimento que lhe foarm devotados pelo próprio Paulo VI. Lebret não
viveria o suficiente para presenciar a publicação da Populorum Progressio: fez sua passagem um ano antes (1966) da
publicação da mesma encíclica.
2. Quais os enfoques mais enfáticos desta
Encíclica do Papa Paulo VI
Do ponto de
vista de sua estruturação, a Populorum
Progressio, além da introdução (nn.1-
5) e da conclusão (nn. 76-87), comporta duas partes: a primeira, que vai do n.
6 até o n. 42, intitula-se “Para o desenvolvimento integral do homem”, enquanto
a segunda parte estende-se desde o n. 43 ao n. 75, trazendo por título “Para um
desenvolvimento solidário da humanidade”. Segue um roteiro similar ao de outras
precedentes, em especial as mais recentes (Em especial, o Papa João XXIII, em
suas famosas encíclicas Mater et
Magistra e Passem in de Terris). Sente-se uma inspiração no já conhecido
método “Ver-Julgar-Agir”. Sendo assim, trata de expor “dados do problema”, isto
é, destacar impasses e desafios axiais, enfrentados pela humanidade. Em
seguida, rememora os esforços da Igreja, à luz do Evangelho, e de seus predecessores,
ao enfrentarem outros desafios, em sua época. Em seguida, cuida de aprofundar a
reflexão sobre os desafios em tela, buscando situar suas raízes, sublinhando
ambivalências e contradições a serem enfrentadas e superadas. Por último, trata
de apontar pistas de superação, sempre à luz da Doutrina Social da Igreja.
Tratamos, a seguir, de destacar suas principais idéias-força. Sua referência
maior, já a partir do título, do início ao fim,
é a de desenvolvimento. Desenvolvimento não redutível à exclusividade da
economia. Um desenvolvimento empenhado e comprometido com a causa dos humanos,
portanto, um desenvolvimetno integral – do ser humano como todo e de todos os
seres humanos. Desenvolvimento dos povos
e nações, em especial daqueles descritos como as grandes vítimas das
gigantescas desigualdades socias. Estas aparecem fortemente, já no início,
quando da apresentação dos “dados do problema”. Os alarmantes índices de
empobrecimento de vários povos e nações, no que tange à fome, à miséria, às
doenças endêmicas, ao analfabetismo, etc., e, por outro lado, o quadro
privilegiado da situação dos países centrais, em especial das velhas
metrópolis, fundamentam seu apelo veemente a um desenvolvimento solidário, sob
pena dos riscos de convulsões sociais: “Quem não vê os perigos, que daí
resultam, de reações populares violentas, de agitações revolucionárias, e de um
resvalar para ideologias totalitárias?.” (n. 11). Mais adiante, também é
salientado, no que diz respeito à contribuição da Igreja, trabalho de figuras emblemáticas, a exemplo
de Charles de Foucauld, pela sua inculturação junto a povos de cultura tão
diversa, para o que foi muito importante atentar-se para os sinais dos tempos,
adequadamente interpretados. É, com efeito, da adequada interpretação desses
sinais (cf. nn. 12 e 13), que se vai percebendo a necessidade de se ter
presente o caráter universal da destinação dos bens (aspecto, aliás, bem
marcante, não apenas na Gaudium et Spes,
como na sempre impactante tradição patrística (Basílio, Ambrósio...): “a
propriedade privada não constitui para ninguém um direito incondicional e
absoluto. Ninguém tem o direito de reservar para o seu uso exclusivo aquilo que
é supérfluo, quando falta a outros o necessário.” (PP, n. 23).
Nota-se um “crescendum” ca, quanto ao sentimento de
indignação na Encícleca diante das crescentes desigualdades sociais, ao ponto
de advertir aos principais responsáveis por esta situação dos graves riscos de
convulção social e de manifestações de caráter totalitário: “Certamente há situações, cuja
injustiça brada aos céus. Quando populações inteiras, desprovidas do
necessário, vivem numa dependência que lhes corta toda a iniciativa e
responsabilidade, e também toda a possibilidade de formação cultural e de
acesso à carreira social e política, é grande a tentação de repelir pela
violência tais injúrias à dignidade humana. (PP n.30). Vale a pena obsevar a
este respeito todo o cenário sócio político de crescente fermentação e agitação
social reinantes em meados da década de 60, haja vista a intença mobilização
dos estudantes na Europa. Bem como a situação explosiva reinante na América
Latina. Percebesse, em consequência a dramaticidade do apelo para a necessidade
e a urgência de profundas reformas, inclusive como meio de se evitar os perigos de
manifestaçõe populares: “Só a iniciativa individual e o simples jogo da
concorrência não bastam para assegurar o êxito do desenvolvimento. Não é lícito
aumentar a riqueza dos ricos e o poder dos fortes, confirmando a miséria dos
pobres e tornando maior a escravidão dos oprimidos. São necessários programas
para "encorajar, estimular, coordenar, suprir e integrar"[35] a ação dos indivíduos e dos organismos intermediários. Pertence
aos poderes públicos escolher e, mesmo impor, os objetivos a atingir, os fins a
alcançar e os meios para os conseguir e é a eles que compete estimular todas as
forças conjugadas nesta ação comum. Tenham porém cuidado de associar a esta
obra as iniciativas privadas e os organismos intermediários. Assim, evitarão o
perigo de uma coletivização integral ou de uma planificação arbitrária que,
privando os homens da liberdade, poriam de parte o exercício dos direitos
fundamentais da pessoa humana (PP, n 33.)
Por outro lado, as profundas reformas pre-cononizadas. Pelo Papa Paulo VI
vão além da espera econômica. Devem alcançar igualmente as distintas esferas da
realidade humana, inclusive a da Cultura. Aqui, pode-se observar a preocupação
da Polulorum Progressio com o que aí
é chamado de risco materialista característico principalmente dos países ricos,
a ser evitado em sua relação com os países pobres, risco que hoje traduzimos
como o do consumismo. Em conclusão da primeira parte, Paulo VI volta a insistir
no caráter integral do desenvolvimento proposto: É necessário promover um humanismo
total. Que vem ele a ser senão o desenvolvimento integral do homem todo e
de todos os homens?
A segunda parte da incíclica é consagrada a sugerir pistas que permitam
a superação das desigualdades sociais, atribuindo aos povos ricos a
responsabilidade maior pelo empreendimento do “Desenvolvimento solidário da humanidade”. Para tanto, cuida de
fundamentar suas propostas por meios de argumentos ético-políticos. Defende que
tal solidariedade deve iniciar-se pelo empenho dos povos ricos, aos quais cabe
maior responsabilidade pela situação de gritantes desigualdades sociais. Aponta
3 dimensões desse dever atribuído aos povos ricos: Uma que tem a ver com o
dever de solidariedade; outra relativa à justiça social e a 3 referindo-se a
caridade. (cf. n.44) Destas dimensões, destacamos com mais força a que expõe a
grave responsabilidade dos povos ricos em reexaminarem e retificarem suas
relações comerciais com os países pobres: “o do dever de justiça social, isto
é, a retificação das relações comerciais defeituosas, entre povos fortes e
povos fracos” (PP, n44).
Vêm, a seguir as pistas propostas como um programa de ação solidaria, o
que é feito conforme as três dimensões enunciadas no número 44. De cada
dimensão, oferecemos algumas ilustrações. Com relação ao dever solidariedade,
cuja iniciativa maior Paulo VI atribui
aos ricos, é proposto um dever de assistência aos mais deserdados, a começar
por uma campanha de combate à fome, a envolver organismos oficiais, como a FAO,
e outras iniciativas de organizações, a exemplo do trabalho realizado pela
Cáritas Internacional, em várias partes do mundo. Trata-se de uma ação
necessária, mas por certo insuficiente, para responder, à altura, aos desafios
dos nossos tempos, recolhece o Papa. Com efeito, urgem medidas mais
consistentes, e organizadas em escala planetária. Uma dessas medidas sugeridas
é a criação de um fundo mundial destinado a socorrer os países pobres, a ser
criado com a redução dos escandalosos investimentos militares, mantidos pelos
países ricos, em especial as grandes potências. Trata-se de um tipo de gasto
supérfluo, que, não apenas não contriubui para a paz mundial, mas ainda agrava
as tensões entre os povos. Com relação a despesas supérfluas, aliás, dirigem-se
as palavras de denúnica mais
contundentes: “Quando tantos
povos têm fome, tantos lares vivem na miséria, tantos homens permanecem
mergulhados na ignorância, tantas escolas, hospitais e habitações, dignas deste
nome, ficam por construir, torna-se um escândalo intolerável qualquer
esbanjamento público ou privado, qualquer gasto de ostentação nacional ou
pessoal, qualquer recurso exagerado aos armamentos. Sentimo-nos na obrigação de
o denunciar.” (PP, n. 53).
Ao propor a criação de um fundo mundial, de combate à miséria e em vista
do desenvolvimento das nações pobres, a Encíclica cuida de sugerir esforços na
gestão de um tal fundo, de modo a assegurar, em bases justas, o acesso e a
participação nele das nações pobres, de modo a que, de um lado, não signifique
uma esmola, e, de outro, se garantam condições efeticas de participação,
conforme as reais possibilidades dos que recorrerem ao mesmo fundo.
O Papa Paulo VI não perde a oportunidade de advertir contra a tendência
de cometimento de graves injustiças
cometidas, nas relações comerciais entre países ricos e países pobres,
denunciando a truculência do império do Liberalismo, chegando a tratá-lo como
uma “ditadura”: “uma economia de intercâmbio já não pode apoiar-se sobre a lei
única da livre concorrência, que frequentes vezes leva à ditadura econômica. A
liberdade das transações só é equitativa quando sujeita às exigências da j.”
(PP, n. 59).
Nos nn. 60 e
seguintes da mesma Encíclica, são postos em relevo princípios de justiça
social, que devem orientar as relações econômicas entre povos e nações, com
destaque para as relações comerciais. Apelo é feito aos países ricos, no
sentido de respeitarem critérios de justiça e do dever de solidariedade, nas
tratativas de preços justos e de garantia de produção, no que diz respeito aos
países pobres.
Também, a Encíclica
se volta às relações culturais, expressando suas preocupações com o racismo que
pode estragar a boa convivência entre povos e nações. Eis por que enfatiza, com
tanta força, a necessidade de se combater o individualismo, a falta de
compromisso, inclusive, de jovens vindos de jovens nações, que, adquirindo
maior capacitação profissional, em países mais avançados, são tentados, por
vezes, a não perseverarem em seu compromisso com os povos e nações de onde
vieram. Aí também se faz menção às aspirações nem sempre satisfeitas dos
trabalhadores migrantes.
Em conclusão, a
Encíclica salienta a importância do desenvolvimento integral, ao ponto de
afirmar que tal desenvolvimento é “o novo nome da paz” (cf. n. 76). Para tanto,
faz questão de dirigir uma palavra final a um conjunto de protagonistas-alvo do
seu dramático apelo, de modo a incluir católicos, homens de boa vontade, chefes
de Estado, sábios, entre outros, a quem interpela e convida a “unirem-se a vós fraternalmente. Porque, se o desenvolvimento é o novo
nome da paz, quem não deseja trabalhar para ele com todas as forças? Sim, a
todos convidamos nós a responder ao nosso grito de angústia, em nome do Senhor.” (PP., n. 87).
3. Na América
Latina, no Brasil e em outas regiões, como se deu a recepção da Populorum
Progressio?
Num mundo de impasses e dilemas tantos, resulta compreensível a enorme repercussão da
publicação da Populorum Progressio,
de 26 de março de 1967. Principalmente, vinda de uma instância eclesial,
tratando-se mais precisamente de um documento pontifício. A longa tradição
conservadora – e por vezes, reacionária – em que vivia mergulhada a Igreja
Católica Romana, antes do Concílio Vaticano II, suscitara a convicção de amplos
setores sociais, de que ela só deveria tratar de assuntos “espirituais”, em que
pese a profunda aliança política – revestida de um manto supostamente
“apolítico”. Sucede então o conhecimento de uma postura profética que rompia
com o tradicional conservadorismo das forças dominantes.
A Populorum Progressio pela contundência
de seu clamor, repercutiria amplamente no mundo de então, não só ao interno da
Igreja Católica, mas também em diversos segmentos da sociedade civil, em várias
partes do mundo. Nesse sentido, ela dá sequência ao profético clamor do Papa
João XXIII, através de suas já mencionadas encíclicas. Ecoa, igualmente, os
clamores de vários setores da sociedade civil, comprometidos com mudanças sociais
estruturais. Aqui se destacam diversos movimentos sociais e organizações de
base, em escala internacional, na América Latina, na Europa e em outros países.
Na África, por exemplo, despontam diferentes
iniciativas de descolonização, tanto entre nações colonizadas pela França, por
Portugal, etc. Na Europa, no Leste europeu crescia a resistência, não apenas
contra o Capitalismo, mas também contra o regime Soviético, sob graves
acusações das crueldades praticadas pelo regime Stalinista.
Na América Latina, ainda sob a influência da vitoriosa
Revolução Cubana, expandem-se pelo continente, ações coletivas de resistência,
às ditaduras militares récem-implantadas, principalmente no chamado Cone-Sul.
Não se tratava de movimentos apenas anti-regime militar, mas também de luta
contra o regime capitalista. É assim que, em vários países ganharam força
experiências de grupos revolucionários, na Colômbia, na Bolívia, e
posteriormente também no Cone-Sul. Um desses movimentos teve lugar na
Argentina: o Movimento de Sarcedotes para o Terceiro Mundo, expressa inspiração
na Populorum Progressio. (cf. “confira o
link abaixo”)
A Populorum
Progressio potencializou notavelmente, na América Latina e no mundo, a
mensagem do Concílio Vaticano II dirigida ao mundo dos pobres – ao menos de
alguns de seus documentos, a exemplo da Gaudium
et Spes e alguns outros, como o célebre n. 8 da Constituição Lumen Gentiium (focado no compromisso
da Igreja com os pobres). Mais: trouxe novo impulso à mensagem legada, em
novembro de 1965, pelos 40 bispos signatários do “Pacto das Catacumbas”. Tal a
afinidade com o clamor dramático da
Populorum Progressio, que uma centena de Bispos do Terceiro Mundo, após a
publicação desta Encíclica, e um pouco antes do início da Conferência Episcopal
Latno-America de Medellín, fez circular um denso e profético “Manfieso de
Obispod del Tercer Mundo, entre cujos signatários figuravam nomes de Dom Helder
Câmara (Olinda e Reicfe), Dom Antônio Batista Fragoso (Crateús – CE), Dom
Francisco Austregésilo de Mesquita (Afogados da Ingazeira – PE), Dom Severino
Mariano de Aguira (Pesqueira – PE), Dom Manuel Pereira (Campina Grande – PB),
Dom Davi Picão (Santos – SP), além de outros bispos de várias partes do mundo
(Índia, Lao, China, etc.). Note-se que vários desses bisos foram signatários
originais do “Paco das Catacumbas”.
Importa, também sublinhar a notável influência que a
mesma Populorum Progressio exerceu sobre
os preparativos e a realização da conferência Episcopal Latino-Americana,
realizada em Medellín, na Colômbia, em 1968. Um (re)exame do Documento de
Medellín pode facilmente comprovar a força profética daquela Encíclica, tanto
no desenrolar daquele evento quanto em sua aplicação, nos anos seguintes.
No caso do Brasil sua repercussão se deu, de vários
modos. Desde a CNBB a alguns Regionais e Dioceses, vários acontecimentos foram
organizados, com o próposito de divulgar o documento pontifício.
Inlcusive, endioceses do Regional nordeste II. Até
mesmo a Diocese de Pesqueira-PE tratou de estuda-la, junto a algumas
comunidades rurais e das periferias urbanas, utilizando-se inclusive, de recursos
audiovisuais.
4. Dramaticidade e
atualidade do seu clamor
Meio século após a publicação da Populorum Progressio, eis que resta dramático nosso quadro
histórico, sob tantos aspectos ali focados. Se nos encontramos, hoje, ante
novos desafios, de um lado, por outro lado, não ainda não fomos capazes de responder
a antigos desafios, como é o caso da fome, no mundo. Ainda hoje, os noticiários
seguem pródigos na circulação de notícias, em vários países, principalmente na
África, dando conta de populações inteiras subnutridas, vítimas de fome
endêmica.
“Se a fome em
África em 2011 matou 260 mil pessoas, a atual crise está a caminho de se tornar
"muito pior", com 20 milhões de vidas em risco.
Um relatório do Fundo das Nações Unidas para
a Infância (UNICEF), divulgado segunda-feira, alertava que perto de 1,4 milhões
de crianças podem morrer este ano devido à fome e malnutrição em apenas quatro
países: Iémen, Nigéria e Sudão do Sul, por causa da guerra, e Somália, devido à
seca.”.
O analfabetismo
constitui outro item revelador da dramaticidade do mundo atual:
“Mais de 700 milhões de adultos no mundo não sabem ler
nem escrever. O levantamento é da Unesco, que fez uma pesquisa em mais de
cem países. O Brasil está no grupo daqueles que investem menos do que deveriam.
São 13 milhões de
brasileiros analfabetos.”
“63%
dos adultos analfabetos no mundo são mulheres, diz Unesco”
Citamos apenas dados
escandalosos relativos à fome e ao analfabetismo. No entanto, grande é a lista
de dados semelhantes, em diversas outras esferas da realidade, tais como: os
índices de desemprego, o deficit de moradia, de saneamento, os altos índices de
trabalho precário, os dados relativos às chamadas “doenças da pobreza”, de
migração forçada, de escolarização e tantos outros completam uma lista quase
infinda, reflexo da combinação de múltiplos fatores, a denunciarem a
necessidade e a urgência de um novo modo de produção, de um novo modo de
consumo e de um novo modo de gestão societal. A despeito de avanços pontuais
obtidos em vários campos científico-tecnológicos, um balanço há de revelar qual
pouco conseguimos, relativamente há 50 anos atrás.
Eis por que constatamos
triste atualidade na encíclica analisada, cujo clamor segue a ressoar, com
força sobre nossa contemporaneidade. Nossas esperanças, ontem como hoje,
voltam-se para o protagonismo daquelas forças sociais grávidas de
alternatividade.
João Pessoa, 22 de
fevereiro de 2017
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