FRANCISCO, BISPO DE ROMA, E ENRIQUE DUSSEL:
afinidades desde sua diversidade como testemunhas de valores alternativos à
sociabilidade capitalista
Alder Júlio Ferreira Calado
Despontam, com espantosa recorrência,
cobranças e queixas sobre a crescente escassez de referências éticas, na
contemporaneidade. Atravessamos, com efeito, quanto a isto, um longo e
tenebroso túnel. Aqui, ali, contudo, um fio de luminosidade: experimentamos a
grata sensação de nos depararmos com sutis manifestações das “correntezas
subterrâneas” que brotam no deserto (“O deserto é fértil”, dizia Dom Helder
Câmara), impregnadas de alternatividade, desde seu estilo de vida. Elas nos
infundem consolo, em tempos áridos; elas nos ajudam a restituir a esperança/”esperançamento”
de que precisamos, para manter vivos nossos sonhos mais generosos, de um outro
mundo, possível e necessário.
Escassez, felizmente, não
quer dizer ausência absoluta. Ontem como hoje, as “minorias abrahâmicas” seguem
fazendo seu trabalho, conduzidas pelo Sopro fontal. As testamunhas podem ser
mais escasssas em certas épocas do que em outras. Mas, têm algo em comum: o
próprio testemuho diferencial (pessoal e comunitário). Tornou-se emblemática
uma afirmação feita pelo Papa Paulo VI, num de seus escritos de referência –
“Evangelii nuntiandi”, em 1975: “Os homens de hoje prestam mais atenção às
testemunhas do que aos mestres, e se prestam atenção também a estes, é porque
são testemunhas”.
Ontem como hoje, em todos
os continentes, encontramos testemunhas com tocantes testemunhos de
alternatividade. Antes de pensar em figuras de reconhecimento notório, cumpre
destacar tantas figuras ANÔNIMAS de mulheres e de homens, dedicados e com
perseverança, a servirem suas gentes, desinteressadamente, com verdadeiro
espírito PÚBLICO. A tais figuras se somam outras, que gozam de notoriedade. Aind
há pouco, dia 06/06/2017, recebemos, com saudade, gratidão e esperança, a notícia da “grande
viagem” feita por uma dessas figuras que entregaram sua vida a serviço ao “Bem
Comum da Humanidade” – François Houtart, presbítero blega, exemplar
revolucionário, a cuja contribuição teórico-prática muito devem os empobrecidos
de todo o mundo. (cf. um dos mais recentes livros seus, dentre os cerca de
setenta publicados:
Aos 92 anos, sociólogo e pesquisador incansável,
tendo peregrinado por mais de 70 países, François Houtart vivia a trabalhar no
Equador! Sim, porque também na América Latina, temos exemplos de testemunhas
paradigmáticas. Ocorre-me pensar em figuras como Dom Leonidas Proaño, Dom
Helder Câmara, Dom Oscar Romero, Dom Antônio Batista Fragoso, Paulo Freire, Pe.
José Comblin, João Pedro e Elizabeth Teixeira, Irmã Dorothy Stang, Adolfo Pérez Esquivel, Rigoberta Menchú, Eduardo
Galeano, Pepe Mujica, Xicão Xukuru e tantas outras, sempre começando pelas
figuras anônimas...
Nas linhas que seguem,
destacamos duas figuras latinoamericanas; por coincidência, ambas nascidas na
Argentina: Francisco, Bispo de Roma, e Enrique
Dussel, filósofo, historiador e teólogo, e com doutoramento nessas áreas. Sem pretensão
de caráter propriamente biobibliográfico, nosso propósito é bem pontual: ressaltar
traços comuns de sua trajetória existencial e ético-política, cada qual, a partir de seu lugar social/institucional,
no que concerne à sua reconhecida contribuição no campo dos valores
alternativos à sociabilidade capitalista.
Antes de ressaltar aspectos
comuns entre essas duas personalidades, convém fornecer uma brevíssima notícia
sobre cada uma delas.
1) Com relação a Fransisco, Bispo de Roma, trata-se de um jesuíta
argentino, nascido em 1936, que, antes de ingressar na referida Ordem religiosa,
frequentou curso superior de Química, experiência que lhe propiciou uma salutar convivência mais
próxima com os jovens do meio não-eclesiástico. Filho de imigrantes italianos,
de tradição católica, sentiu-se vocacionado ao sacerdócio ministerial. Após sua ordenação presbiteral, exerceu
distintas missões, ligadas ao ministério presbiteral. Mais adiante, também
recebeu a Ormem episcopal, tendo passado um bom tempo a trabalhar pastoralmente
com comunidades da região periférica de
Buenos Aires. Tempos depois, foi nomeado Cardeal.
Consta de sua biografia
pastoral uma proximidade especial com as
populações ods bairros periféricos de Buenos Aires, para onde se costumava
deslocar-se, em transporte coletivo, como um cidadão comum. Teve uma atuação destacada, na realização da
Conferência Episcopal Latinoamericana em Aparecida, em 2007.
Como autoridade
eclesiástica, teve que enfrentar desafios embaraçosos, por conta da Ditadura
Militar, que infelicitou também o povo argentino, entre 1976 e 1983. Durante
este período, contra ele foram assacadas algumas cobranças de postura
profética, diante da crueldade do regime.
Em se tratando, no plano
eclesial, de personagem pouco conhecida, em relação a vários outros cardeais
apontadas como favoritos à sucessão do Papa Bento XVI, constituiu grande
surpresa o fato de ter sido escolhido, entre os pares, justamente a figura do
Cardeal Mario Jorge Bergoglio. É a partir daí, que Mario Jorge Bergoglio passa
a assumir o papel surpreendente de uma liderançade novo tipo, não só ao interno
da Igreja Católica Romana, mas sobretudo aos olhos do mundo não-católico, evangélico,
de várias religiões e de segmentos ateus, ou de confissão não definida.
Assumindo o nome de
Fransisco (referência explícita a Fransisco de Assis), sendo ele um jesuíta, o
mundo é surpreendido progressivamente por seus gestos, por seus escritos e por
seus pronunciamentos.
Quanto aos gestos, impacta
sobremaneira sua linha de coerência com os valores evangélicos mais expressivos
– simplicidade, humildade, estilo de vida pobre, sobriedade, compromisso com a
causa libertadora dos pobres; testemunho concreto de solidariedade aos
migrantes forçados e regugiados, em vários momentos cruciais (Lampadusa,
Lesbos...); faz questão de ter proximdade, contato concreto com as multidões,
ainda que contrariando protocolos e regras de segurança; faz denúncia vigorosa
do sistema hegemônico, insistência na conversão como um processo contínuo, na
alegria, no serviço como principal marca do amor evangélico, no perdão e na
misericordia. Gestos continuamente confirmados em seu estilo sóbrio e alegre de
vida, nas muitas visitas pastorais, nas incessantes viagens apostólicas pelos
vários continentes.
No tocante aos seus
escritos, destacamos, de passagem, apenas dois
dos documentos de sua lavra: a Exortação Apostólica Evangelii Gaudium (2013) e a Encíclica Social Laudato sì (2015). O primeiro documento dirige ao público católico,
em especial os pastores, propondo um programa de governo pastoral para a Igreja,
em vista das próximos anos. Nele, trata de sublinhar a primazia do Povo de Deus
como principal protagonista na estrutura organizativa da Igreja; denuncia os
vícios do cleritalismo: a “psicologia principesca”, a praga do carreirismo; enfatiza
a urgência de uma Igreja missíonaria (“Igreja em saída missionária”);
defende o espírito evangélico da centralodade dos pobres como pririoridade da
missão da Igreja; denuncia vigorosamente a “economia de morte”, característica
principal do modelo vigente; apregoa abertura ao exercício ecumênico; chama a
atenção para a importância da homilia; anuncia a relevância de uma
espiritualidade radicada no Evangélica...
Com relação à Laudato sì, dirige-se a todo o mundo,
a todos os homens e mulheres de boa vontade, convocando-os a cuidarem
responsavelmente de nossa “Casa Comum”. Trata-se de um documento elaborado com
profunda base científica, apoi8ando-se em autores de reconhecida contribuição
na área, sem deixar de ser um documento
profundamnte pastoral, razão pela qual
obteve ampla recepção e impacto, pelas
denúncias proféticas das diversas manifestações de agressão sócio-ambiental, ao
mesmo tempo em que oferece pistas concretas (comunitárias e pessoais), em busca
de superação dos grandes impasses socio-ambiêntais da atualidade. Vale
registrar, igualmente, a inovação metodológica de sua abordagem da questão
sócio-ambiental: exercita um olhar de múltiplas conexões e integrativo.
Em seus numerosos
pronunciamentos, feitos nas mais distintas ocasiões – nas celebrações litúrgicos, nas diversas intervenções
públicas, por ocasião das viagens aos mais diversos países, além de entrevistas
e outras participações -, o Bispo de Roma expressa, de modo consequente com
seus gestos e escritos, posições-chave,
em boa medida sintetizáveis por idéias-força tais como:
- primazia do testemunho
sobre discursos e prédicas;
- consciência dos limites
humanos, a partir dos seus (“Eu também sou um pecador”);
- enfatiza a unidade na
diversidade, não a unidade como uniformidade;
- ainda que nem sempre o
explicite, nele é forte a perspectiva fundante de “Reino de Deus”, núcleo duro
da pregação de Jesus, e que ultrapassa o horizonte da Igreja, de modo a
abranger todo o Povo de Deus, portanto, toda a humanidade (quando se restringe
a Boa Nova à Igreja, alimenta-se objetivamente a tentação de uma
autoreferência, razão por que não poucos lidam com as coisas da Igreja como se
dela fossem funcionários, donde a tentação ao carreirismo, entre outras);
- aposta na conversão
enquanto processo (a conversão não se faz uma vez e para sempre acabada, mas se
vai fazendo processualmente, pela força da Graça e pela generosa abertura e
resposta à voz do Espírito Santo); - aposta
mais no processo do que nos resultados (em um de seus pronunciamentos aos
delegados e delegadas de movimentos populares, realizado em Santa Cruz de la Sierra – Bolívia, ele
afirma preferir sempre apostar nos processos, em vez de “ocupar espaços”);
- sistematica desconfiança na força dos
“grandes”, a que se contrapõe sua enorme confiança na força dos pobres;
- invencível aposta em
estar em contato direto com o povo, nas praças e nas ruas;
- relevância atribuída à
“cultura do encontro”;
- insistência reiterada no
serviço (em especial, aos pobres e necessitados) como principal marca do amor
cristão;
- persistente combate ao clericalismo, rejeitando, com veemência,
uma “psicologia principesca” ou a praga do carreirismo;
- combate a uma Igreja
“auto-referênciada”, a que contrapõe a necessidade de uma “Igreja em saída
missionária”;
- defesa e promoção das
pequenas comunidades, funcionando organicamente e de modo interconectado;
- preocupação, defesa e
promoção da dignidade do Planeta;
- convicção de que a
alegria deve ser marca essencial dos cristãos;
2) No que toca a Enrique Dussel, segue, igualmente uma
brevíssima notícia biobibligráfica. Trata–se de um argentino, nascido em
Mendoza em 1934, em cuja Universid de Cuyo concluiu seu Curso de Filosofia, em
1957, tendo apressentado como trabalho de conclusão de sua Gradução em Filosofia
uma monografia versando sobre o Bem Comum, na concepção dos filosofos gregros.
Segue, depois, para a
Espanha, onde conclui seu Doutorado em Filosofia, na Universidad Complutiense
de Madrid, em 1959, tendo apresentado, então, uma tese abordando a questão do
Bem Comum.
Entre 1959 e 1961, viveu em
Nazaré, na Palestina, na companhia de padres operários, entre os quais o famoso
jesuíta Paul Gauthier. Uma experiência que o marcaria profundamente, seja do
ponto de vista da atividade laboral, seja também com relação à pesquisa. Nesta
temporada, houve por bem fazer uma imersão reflexiva sobre o humanismo semita,
como meio de fazer a crítica à filosofia helenística, em especial de seu
dualismo – corpo e alma. Foi-lhe, então, de grande proveito o aprofundamento
sobre o humanismo semita, nome do livro escrito em 1961. Depois, segue para a
França, onde dá prosseguimento a seus estudos teológicos, na Universidade
Católica de Paris, e onde também cursará seu Doutorado em História,
especialiando-se em história da Igreja. Sua tese de doutorado investiga a
evolução do Episcopado latinoamericano dos séculos XV e XVI. De lá, ainda segue
para a Alemanha, sempre em busca de aprofundar suas pesquisas, no campo da
Teologia, bem como sobre a Ameríndia.
De retorno a Mendoza, após
cerca de dez anos de Europa e Oriente Médio, enfrenta, com sua esposa que
conhece na Alemanha, sérias ameaças, graças ao clima de perseguição lá
existente, e de onde tem que sair, estabelecendo-se, finalmente no México.
Teve relevante contribuição
ao povo do Equador, onde, em Quito, ministrou cursos no Centro ligado a Dom
Leonida Proaño. Aí desenvolveu sobremaneira suas pesquisas no campo da história
da América Latina, inclusive das Igrejas. É co-fundador e dirigente da Comisión
de Estudios de la Historia de la Iglesia Latinoamericana y Caribe. Desde tal lugar, empreende com a briosa
Equipe da CEHILA um fecundo plano de pesquisa e de publicações sobre a história
da Igreja Latinoamericana e do Caribe, “a partir do povo”.
Sem prejuízo de sua
competente incursão pela história da(s) Igreja(s), na América Latina e do
Caribe, bem como sobre a história dos povos aborígenes, talvez tenha sido o
campo da Ética Comunitária, o em que mais se tenha notabilizado. Com efeito,
Dussel segue o principal nome de referência da Filosofia da Libertação, onde
sua contribuição é considerada original. Ligado à Filosofia da Libertação, Dussel
também é apreciado pelas suas incursões heurísticas pelo campo da Teologia da
Libertação, tendo-se notabilizado pelo seu enfoque marxiano, de par com nomes
de reconhecida contribuição, a exemplo de Hugo Assmann e Franz Himkelammert, e entre
outros.
Cumpre ainda ter presentes
mais dois campos de pesquisa de suas incursões analíticas. Uma tem a ver com
sua cuidadosa e aguda leitura de parte expressiva da obra de Karl Marx. Tornou-se um clássico seu livro de análise
acurada dos Grudrisse. Ainda no campo
dos estudos marxianos, cabe sublinhar seu genial livro sobre as metáforas
teológica de Karl Marx.
Densa contribuição Dussel
igualmente tem assegurado com sua investida original pelas pesquisas em torno
da descolonização do pensamento ocidental.
Sempre entendendo a
pesquisa ciêntífica como processo, nunca hesitou em reconhecer seus próprios
limites, estando aberto a abraçar abordagens teórico-metodológicas de maior
pdoer explicativo. É assim que acaba por esposar o metodo analéctico (cf. https://www.youtube.com/watch?v=0Kzov0Hepc4 ), que combina componentes
da Dialética com recursos da analogia, isto é, vai investindo, cada vez mais no
esforço de compreender melhor a realidade, por meio do reconhecimento de
semelhanças e distinções dos mais diversos objetos da mesma realidade.
Este cidadão do mundo
nascido em Mendoza, Argentina, e tornado também mexicano, onde se encontra
radicado, desde os anos 60. Filósofo, historiador, teólogo - talvez os campos
mais referenciais de sua contribuição, dentre outros pelos quais também
circula, com reconhecida competência.
No campo da descolonização
do pensamento eurocêntrico, Dussel nos faz lembrar a conhecida afirmação de Roger
Garaudy, de que "O Ocidente é um acidente"... Seu denso legado
inclui, também, numerosas conferências pronunciadas em vários países do mundo,
a exemplo da que proferiu na região de Andaluzia, Espanha, da qual nos
permitimos destacar os seguintes pontos.
Já antes de se introduzir
ao tema central da conferência – Walter Benjamin -, Dussel faz questão de
enfatizar a relevância daquele lugar (Andaluzia), região em que durante seis ou
sete séculos, eram os árabes, e não os europeus, os grandes protagonistas do
mundo. Com efeito, partindo de Marrocos, com grandes centros (universidades,
ciências desenvolvidas, grandes incursões pelo mundo de então), espalhados pela
Líbia, pelo Egito e, sobretudo, no Iraque, sendo Baguidá a maior referência
civilizatória, durante 5 ou 6 séculos. À época, a Europa era simples periferia
do mundo, subdesenvolvida, com um papel secundário em comparação com a
civilização árabe. Lembra que eram centenas de árabes – e não apenas um
europeu, Marco Polo, a circularem constantemente pelo mundo de então, China,
Índia, etc, em viagens de empreendimentos comerciais.
Ainda antes de empreender
uma incursão pela trajetória intelectual de Walter Benjamin, Dussel ousa
antecipar alguns traços comuns entre Walter Benjamin e ele próprio. Alude ao
seu primeiro livro, escrito em 1961, intitulado Humanismo Semita, aos 27 anos, um caminho original que ele
escolheu, para fazer a crítica à filosofia grega, de perfil dualista, que
separava corpo e alma. Dussel entendia que era preciso ousar fazer a crítica a filosofia helenistica,
a partir de um olhar desde fora do helenismo. Dois pontos significativos por
ele sublinhados têm a ver com o critério de analises da filosofia semitica e da
importância, e com seu entendimento de
crítica, na perspectiva do filósofo judeu alemão, Hermann Cohen. No primeiro caso,
Dulsseu, ressaltava com enfâ-se, o metodo seguido pela filosofia semítica,
segundo o qual o analista tinha que se colocar, primeiro, no lugar epistemológico do pobre, para em
seguida, fazer o diágnostico da patologia do Estado.
Em
qualquer lugar do mundo importaria ao analistica imergi-se no mundo dos pobres,
dos oprimidos, como condição de examinar a patologia da Sociedade, da Política,
do Estado. Quanto ao segundo ponto de observação, Enfativaza comportar a
Crítica 3 níveis: um nível material, representado pelo texto; o nível de uma
primeira interpretação do texto ; e a críica propriamente dita, que implicava
uma recriação do texto, em que a obra criticada se realizava.
3) O quê, então, sublinhar de comum desses dois
argentinos octogenários, em plena atividade criativa?
·
Não nos ocupamos
aqui, a não ser implicitamente, das distinções observáveis entre as duas personagens
tomadas, sob um olhar analógico. Nosso propósito é, antes, o de sublinhar suas
semelhanças. Em busca de um roteiro que
permita destacar seus traços comuns, cuidamos de distribuir este tópico em três
dimensões organicamente interconectadas:
a) uma incidindo mais diretamente no plano existencial; b) uma segunda
concernente mais enfaticamente à esfera ética, e c) uma terceira dimensão mais
explicitamente vinculada ao plano político.
a) No plano existencial:
- Ambos defendem e promovem a vida do Planeta,
dos Humanos e do conjunto da comunidade dos viventes.
-
Como seres humanos, perseguem, apaixonadamente, uma sociabilidade que assegure
condições dignas a cada ser humano e ao conjunto das socieades, de satisfazerem
a contento suas necessidades e aspirações mais profundas.
- Cada qual partindo do seu lugar
institucional de referência, ambos coincidem quanto ao mesmo horizonte ético: o
do caráter “universal”/pluriversal do processo de humanização. Em Francisco,
para além do horizonte “Igreja”, a Boa Nova se estende a todo o gênero humano, a
toda a Terra, enquanto que, no caso de Dussel, seja quando lida com a questão
da interculturalidade, seja quando se empenha em desmascarar a ideologia do
Eurocentrismo, o que fundamentalmente o anima é a vocação “pluriversal” à Liberdade
do conjunto da humanidade, em harmonia com toda a comunidade dos viventes e com
o Planeta.
- Ora por vias semelhantes, ora por vias distintas,
ambos se têm marcado pela abertura à inovação, à criatividade, sempre que se
trate de assegurar condições de construção de relações sociais alternativas ao
sistema de morte, em vigor, em todas as esferas da realidade.
b) Na esfera ética
- Ambos costumam ser enfáticos na
advertência quanto à prioridade da prática sobre o discurso. Enquanto Francisco
se vale, para tanto, da inspiração evangélica (“A árvore se conhece pelos
frutos”, “Nem todo aquele que diz ‘Senhor’, ‘Senhor’... Mas aquele que faz a
vontade do meu Pai”), Dussel, por sua vez, recorrendo à inspiração marxiana e
ao metodo analético, tem insistido igualmente na práxis.
Ao pensarem na condição humana
buscam não cair na armadilha de apontar uma determinada cultura como modelo a
ser seguido por todas as demais culturas, nesse sentido, cada qual ao seu modo,
não cessam de questionar sobre os graves riscos do Eurocentrismo.
- ambos costumam observar o
critério de respeitabilidade a todo e qualquer povo, independentemente de
riqueza, de credo, de modos de pensar, de sentir e agir, desde que assegurem
tratamento de dignidade uns com os outros.
c) No âmbito da Política
- São críticos do Estado enquanto
organismo a serviço dos interesses das Elites econômicas e políticas,
preferindo apostar na organização e no processo formativo e de mobilização dos
povos subalternizados, ao mesmo tempo em que incentivam seu protagonismo como
meio de sua libertação.
- Incentivam e promovem a
capacidade transformadora e criativa dos povos subjugados, em busca de
experiências alternativas ao modelo vigente.
- Costumam ressaltar a
importância de pequenas comunidades em sua organização autônoma, fundadas na
busca da unidade a partir de sua enorme diversidade
- Alertam com frequência, quanto
aos riscos de se esperar demasiadamente em personagens famosas como principais
protagonistas de processos de mudanças.
- Promovem a consciência crítica
do conjunto de cidadãos e cidadãs, desde sua capacidade de mudança, a partir do
cotidiano de suas relações.
- Defendem o recurso da memória
histórica, das experiências mais diversas dos povos, ao longo da história da
humanidade, como inspiração em suas melhores intuições comunitárias e pessoais,
a serviço do processo de construção de um modelo alternativo à ordem vigente.
João Pessoa, 14 de junho de 2017.
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