quarta-feira, 6 de julho de 2022

Educação Indígena Xukuru de Ororubá: notas sobre a apresentação da dissertação de Anne Flávia de Souza Rodrigues, realizada no dia 30 de Junho de 2022

 Educação Indígena Xukuru de Ororubá: notas sobre a apresentação da dissertação de Anne Flávia de Souza Rodrigues, realizada no dia 30 de Junho de 2022


Alder Júlio Ferreira Calado


Educação Popular protagonizada pelo povo Xukuru de Ororubá - PE foi o tema da dissertação de mestrado, apresentada, no dia 30/06/2022, a banca examinadora do Programa de Pós Graduação em Educação da UFPB.

    Nas linhas que seguem, buscamos compartilhar algumas observações acerca da apresentação desta dissertação, intitulada “LIMOLAYGO TOYPE: NOSSA EDUCAÇÃO É NOSSA RESISTÊNCIA. EDUCAÇÃO INDÍGENA E A PEDAGOGIA DECOLONIAL, POVO XUKURU DO ORORUBÁ, PE”.

    A autora da dissertação é membro do povo Xukuru, fato ainda raro nos espaços da Academia, no Brasil. Anne é uma das poucas mestrandas provenientes de um povo indígena, a obterem o seu mestrado pela Universidade Federal da Paraíba. Sua dissertação versa sobre as práticas pedagógicas ao interno do povo Xukuru, no campo da Educação Popular, e, mais precisamente, no campo da Educação Escolar Indígena. Cuida de descrever e analisar, em cinco capítulos, distintas dimensões em que se dá as escolas indígenas do povo Xukuru de Ororubá, atendo-se a diversos aspectos de sua vida: a expressão de fé nos Encantado (não foi por acaso que iniciou sua fala, exercitando a mística da ancestralidade), o“Ethos” Comunitário, o cuidado de pôr em prática, nos moldes da Educação Popular de feição Freireana, os desafios de busca de autonomia e de emancipação, mesmo nos quadros de um sistema escolar super controlado, de certa maneira, pelo Estado. Empenha-se, a autora, em trazer notícias da presença territorial do povo indígena Xukuru, situado na serra do Ororubá, em Pesqueira-PE. Antes disto, trata de situar e caracterizar brevemente os povos indígenas de Pernambuco, em especial no tocante aos desafios da Educação indígena na região.

    Nos últimos capítulos, trata de analisar as práticas pedagógicas das escolas indígenas Xukuru, seja quanto à gestão, seja quanto aos protagonistas, seja quanto à metodologia, seja quanto à busca de autonomia em relação às escolas oficiais.

    Do ponto de vista metodológico, a autora escolhe enfrentar seu desafio investigativo, tomando por base a metodologia triangular, fundada na pesquisa bibliográfica, na pesquisa documental, e na observação participante. No que diz respeito à pesquisa qualitativa, a autora buscou localizar, em sites especializados, textos, arquivos, e eventuais livros acerca do povo Xukuru, em especial no que concerne à educação do povo Xukuru. Não exita em dizer que se surpreendeu com o pequeno número de textos encontrados, menos ainda, no tocante à educação do povo Xukuru. Também, do ponto de vista metodológico, tomou como base a pesquisa documental. Neste sentido encontrou um número razoável de documentos, em parte produzidos fora do território Xukuru, mas também, em parte, produzidos por educadores e educadoras das escolas indígenas Xukuru. Fez um bom uso destes documentos, que analisa no curso de seu trabalho. Também recorreu à observação participante, tendo a vantagem de ser ela própria um membro daquela comunidade. 

    Do ponto de vista teórico-conceitual, a autora  prioriza a categoria “Decolonialidade”, a qual também se refere por meio de conceitos correlatos, tais como “Anti-colonialidade” entre outros. Graças a este conceito, analisa a história do povo Xukuru, bem como, a dos povos indígenas, como alvo-mor do processo colonialista, apontando ilustrações de um processo escravizador e domesticador dos povos indígenas. Entende que, também hoje, os povos indígenas do Brasil, inclusive o povo Xukuru, continuam sofrendo pesadas consequências por conta da vigência deste processo de colonização. A certa altura de sua fala, na apresentação do seu trabalho, enfatiza, como exemplo ilustrativo, os recentes assassinatos ocorridos na Amazônia envolvendo as figuras de Maxciel Pereira, de Bruno Araújo Pereira e de Dom Phillips. Mencionou que, para o sepultamento de Bruno Araújo Pereira, em Paulista - PE, o povo Xukuru se deslocou, a fim de expressar sua comunhão com Bruno, e sua solidariedade aos seus familiares, bem como denunciar os crimes praticados pelo atual governo federal.

    Em se tratando de uma sessão de apresentação de sua dissertação, sua fala foi seguida pela dos membros da banca examinadora, composta pelo Orientador da dissertação, pelo prof. dr. Pedro José Santos Carneiro Cruz, da UFPB, que coordenou os trabalhos; pelo Antropólogo e Educador, prof. dr. Reinaldo Matias Fleuri, da profª. pesquisadora dos povos indígenas, Giselia, ela própria sendo membro do povo Pankararu (em Pernambuco), pelo prof. Roberto dos Santos Lacerda, da UFSE, e da profª. Nilvania dos Santos Silva, da UFPB. Cada um, cada uma, dos membros da banca teceu comentários críticos sobre o texto, ao tempo em que reconheciam todos os méritos da dissertação, enaltecendo a contribuição que Anne de Souza Rodrigues estava a oferecer à Academia e ao povo brasileiro, no que diz respeito à educação indígena.

    De nossa parte, entre tantos pontos a sublinhar, atemo-nos apenas a dois aspectos. Um primeiro diz respeito à contribuição da autora, no que concerne aos fundamentos epistemológicos da educação indígena. Ao analisar as dezenas de escolas espalhadas pelas vinte e quatro aldeias do povo Xukuru do Ororubá, a autora trata de descrever e analisar, as escolas indígenas como verdadeira expressão da educação popular, na perspectiva Freireana. Importa, ainda, destacar que a educação popular comporta várias dimensões de práticas pedagógicas, tais como:a educação indígena, a educação quilombola, a educação camponesa, as práticas educativas protagonizadas pelo movimento anarquista, nas primeiras décadas do século passado. Trata-se, em verdade, de fases distintas da mesma educação popular.

    Outro aspecto que - agora como sugestão à autora, para novos empreendimentos investigativos -, ouso enfatizar a importância de uma das categorias por ela desenvolvidas em seu trabalho: a “interculturalidade”. Pois bem, espero que, nos próximos empreendimentos de pesquisa que ela venha a desenvolver, cuide de exercitar a interculturalidade, não apenas ao interno dos povos originários, mas também em relação às comunidades quilombolas, aos grupos camponeses, aos segmentos operários, como forças que compõem todo o segmento dos “de baixo”, como forma mais potencializada de enfrentamento dos grandes e atuais desafios dos embates contra o processo de colonização, de colonialismo, sobretudo protagonizado pelo capitalismo, em sua face-fase atual. Neste sentido, ouso ainda sugerir um mergulho nas contribuições de autores clássicos e contemporâneos que lidem com o marxismo.


João Pessoa, 06 de julho de 2022.






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