ECOS DA VIII SEMANA TEOLÓGICA Pe.JOSÉ COMBLIN:
memória, compromisso, esperança
Alder Júlio Ferreira Calado
Após alguns meses de intensas atividades, tivemos, sábado, dia
15/09/2018, a Sessão de Encerramento, contando com a participação de delegados
e delegadas das Jornadas Comunitárias, realizadas no campo e nas periferias
urbanas; dos vários grupos co-organizadores das Semanas Teológicas Pe. José
Comblin, de vários membros de Rede Celebra, Kairós, CECAE, Escolas Missionária
de Mogeiro, CEBI, MTC e de outros segmentos da Igreja na Base, além dos
convidados palestrantes Alzirinha Rocha de Souza e Vanderlan Paulo de Oliveira,
que nos brindaram com fecundas exposições acerca do tema desta oitava edição da
STPJC: "Medelliín, 50 anos: vocação e missão das Leigas e
Leigos".
Nas linhas que seguem, compartilhamos algumas informações acerca do
processo e da dinâmica de organização desta VIII STPJC, rememorando os passos
vivenciados, sublinhando alguns compromissos aí firmados, e ressaltando as
sementes de esperança aí lançadas.
Fazendo
Memória
Vivenciamos, neste 2018, a oitava edição das Semanas Teológica Pe. José Comblin.
Estas experiências almejam manter vivo e fecundo o legado profético do Padre
José Comblin (1923-2011). Não por acaso homenageado como “profeta da
liberdade”, o Teólogo José Comblin, nascido na Bélgica, viveu mais de meio
século entre os pobres da América Latina, especialmente do Brasil, e mais
particularmente do Nordeste, tendo oferecido densa contribuição também ao povo
dos pobres no Chile, no Equador e outros países. Foi assim que se sentiu
chamado como missionário a dedicar o melhor de si ao desafio da causa
libertadora dos empobrecidos.
Tendo em vista, por
conseguinte, uma gama de experiências missionárias nele inspiradas ou por ele
animadas, sempre em diálogo frutuoso com teólogos e teólogas da Libertação e de
outras correntes teológicas. A experiência organizativa destas semanas
teológicas Padre José Comblin, vem sendo realizadas junto a comunidades do
campo e das periferias urbanas, por meio das Jornadas Comunitárias, culminando
com a Sessão de Encerramento, durante a qual tratamos de escutar e refletir
comunitariamente, os relatos apresentados por delegadas e delegados de
compartilhar o que foi vivenciado em cada Jornada Comunitária, após o que
recorremos às reflexões dos convidados e convidadas a partir do Tema
desenvolvido e das questões levantadas, em cada jornada comunitária.
Nesta VIII STPJC o tema trabalhado foi: “Medellín, 50 anos: vocação e
missão das Leigas e Leigos” Tratamos de fazer memória do Legado Profético da II
Conferência Episcopal Latino-Americana, realizada em Medellín, na Colômbia, em
1968. Por meio de textos, análises e avaliações, além de instigantes vídeos,
cuidamos de revisitar esse tempo de abençoada irrupção profética, em que
tivemos a sensação de experienciar um novo pentecostes na Igreja
Latino-Americana e no Caribe.
Além de um vídeo sobre o contexto e a experiência de Medellín, cuidamos
de revisitar páginas preciosas do seu documento final. De forma didática, foram
escolhidos apenas cinco dentre os dezesseis capítulos que integram o Documento
Final de Medellín – Pobreza, Justiça, Paz, Juventude e Movimentos Leigos. Cada
comunidade encarregada de organizar sua jornada comunitária, tratou de trabalhar
um desses capítulos, lendo, refletindo, discutindo e problematizando a partir
de sua própria realidade. Nesta mesma ocasião, elegia-se sua ou seu delegado,
para compartilhar os pontos principais vivenciados durante a jornada. E assim
se fez ao longo do mês de agosto e início de setembro, culminando com a sessão
de encerramento, realizada no Mosteiro de São Bento, no dia 15/09.
Em poucas linhas, que aspectos é possível sublinhar destas experiências?
Vejamos alguns pontos, começando pelos seus traços, que julgamos de efetiva
contribuição à caminhada da Igreja Católica, no Continente:
- Medellín, inspirada na ação profética de minorias episcopais que
firmaram o conhecido Pacto das Catacumbas, poucos dias antes do encerramento da
última sessão do Concílio Vaticano II, e impulsionada por um contexto
Sócio-Eclesial latino-americano de intensa fermentação de movimentos e forças
mudancistas que clamavam justiça contra os horrores das Ditaduras Militares,
instaladas no Cone Sul, bem como contra as profundas e crescentes desigualdades
sociais, sentiu-se comprometida e solidária ao povo dos pobres, passando a ser
uma forte ressonância desses clamores;
- Medellín passa a ser tratada, não apenas como uma recepção criativa do
Concílio Vaticano II, mas sobretudo como uma busca audaciosa de (re)fundação da
Igreja Latino Americana, com rosto próprio, não mais como mero anexo ou
difusora de decisões eclesiásticas, por vezes, de viés eurocêntrico;
- De modo progressivo, nos próximos anos, graças principalmente à
atuação de suas organizações de base (CEBs, CIMI, CPT, PJMP, ACR, PCIs,
Pastoral Operária, CEBI, Comissão Justiça e Paz, Centros de Defesa dos Direitos
Humanos, Teologia da Libertação...), vai se fazendo, ainda que com suas insuficiências
a “opção pelos pobres”, engajando-se nas causas libertárias do povo dos pobres,
ao tempo em que teve que enfrentar as mais diversas adversidades (perseguições,
repressões...).
Quanto às suas insuficiências, destacamos as seguintes:
- À luz da Lumen Gentium, em
que o “Povo de Deus” precede a própria hierarquia ainda assim, se trata de uma
conferência de Bispos, com direito a voz e voto, embora correspondendo a uma
pequeníssima minoria do povo de Deus, ao interno da Igreja Católica Romana;
- Por via de consequência, as leigas e leigos aí desempenham um papel
ainda aquém de sua missão de Batizados e Batizadas (“sacerdotes, profetas e
reis”);
- Em razão de sua estrutura organizativa, ainda resultam prevalente a
influência das estruturas paroquiais, pouco favoráveis a uma ação missionária,
junto aos mais injustiçados e desvalidos.
Renovando
Compromissos
Quando buscamos vivenciar, seja como seres humanos, seja como
cristãos, a boa nova anunciada e inaugurada por Jesus, estamos conscientes que
o fazemos mais do que como expressão de resultados eventuais, o fazemos numa
perspectiva de processo. Isto também se passa, em relação ao que nos sobreveio
desde Medellín. Assumindo criticamente nossas tarefas de Povo de Deus ao
interno da Igreja Católica e das lutas sociais, cuidamos de renovar nossos
compromissos olhos fitos no horizonte do Reino de Deus solícitos ao que nos
inspira o espírito do Ressuscitado. Neste sentido, buscamos renovar nossos
compromissos, em relação ao que nos instiga Medellín. Destaquemos alguns desses
compromissos:
- Melhor exercitar o discernimento, quanto aos ganhos e perdas
acumulados nas últimas décadas, na caminhada histórica de nossa Igreja;
- Manter cada vez acesa e vigilante nossa atenção, mais do que
sobre fatos isolados sobre os nexos e o caráter desses fatos;
- Estamos conscientes de que isto não se dá
espontaneisticamente, mas apenas se nos comprometemos pessoal e
comunitariamente, em tomar a sério um processo de formação contínua, seja no
campo da realidade social, seja no campo da evolução histórica de nossa
caminhada Eclesial, sempre tendo acesso o horizonte do Movimento de Jesus;
- Neste sentido, é tarefa de todos os segmentos eclesiais, mas
principalmente das leigas e dos leigos, no sentido de buscar corrigir rumos
caminhos e posturas, característicos do modelo eclesiástico ainda largamente
hegemônico
Reascendendo nossas esperanças
Nesta incessante
busca de contribuirmos para uma Igreja seguidora da Boa Nova, e a serviço da
humanidade em especial do povo dos pobres, sentimo-nos cercados de instigantes
desafios. Um deles consiste em priorizar o potencial das leigas e leigos sem
esperar passivamente que as mudanças brotem e se façam apenas desde cima, mas
como expressão e fruto e da ação dos principais protagonistas deste movimento
de renovação eclesial. A este respeito, sinto-me remetido a uma palavra
encorajadora do Bispo de Roma, por ocasião de um encontro seu com membros da
coordenação da Clar, em que ele dizia algo assim: não se limitem a esperar que
as instâncias superiores lhes ordenem tarefas, mas tomem a iniciativa de fazer
as coisas avançar. Podem, aqui e ali, receber eventuais advertências, e tratem
de leva-las em consideração, sem que isto os desencorajem de ousar...
Um dos grandes
obstáculos que inibem ou mesmo nos impedem de dar passos fecundos, em direção a
um processo de permanente renovação eclesial – “Ecclesia Semper Renovanda Est”
-, consiste na praxe de leigas e leigos se limitarem a receber ordens de cima “de
Roma, da Diocese, da Paróquia...”, sem ousarem empreender passos de renovação,
sob a inspiração da Tradição de Jesus. Isto nos faz manter vistas grossas aos
sinais e apelos do Espírito do Ressuscitado, que conduz a caminhada do Reino de
Deus e Sua justiça por meio de uma considerável diversidade de ações, sempre em
busca de uma unidade, não de uma uniformidade.
Sabemos que o
processo de renovação é obra de todos os segmentos eclesiais, não apenas da
hierarquia, que não pode e não deve ser tomada como única referência para o
exercício da cidadania eclesial. Isto, porém, requer assegurar-nos o
compromisso de um incessante processo formativo, principalmente protagonizado
por Leigas e Leigos, que constituem a enorme maioria do Povo de Deus, ao
interno da Igreja Católica (e de outras Igrejas Cristãs), inclusive em resposta
a nossa missão batismal, de sermos “sacerdotes, profetas e reis”, isto é, de
assumirmos, na alegria e na esperança, nossas tarefas de cidadãos e cidadãs,
também ao interno dos espaços eclesiais.
Tal dimensão
cidadã, para ser fiel ao Evangelho, há de ser exercitadas, não apenas ao
interno dos espaços eclesiais. Move-nos ao exercício inafastável de cidadania,
em qualquer contesto histórico, inclusive às vésperas de novo processo
eleitoral. A despeito da diversidade de entendimentos da função eleitoral, há,
no mínimo, um imperativo de consciência a ser levado a sério: o grave risco de
parcelas consideráveis do nosso eleitorado em se deixarem seduzir por valores
claramente contrários à Boa Nova anunciada e inaugurada por Jesus. Referimo-nos
a postulantes claramente orientados e fundados em valores tais como: a truculência,
o belicismo, o racismo, a misoginia e outras formas de preconceito. A
diversidade de opções de voto (ou mesmo de não voto) é compreensível, em alguns
contextos, mas tudo tem um limite...
João Pessoa, 6 de
outubro de 2018.
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