TRAÇOS DA MÃE ÁFRICA: Em busca de nossas raízes (VI)
Alder Júlio Ferreira Calado
TRAÇOS DA MÃE ÁFRICA: Em busca de nossas raízes (VI)
Alder Júlio Ferreira Calado
Do multifacetado terreno cultural africano, focalizamos, desta feita, alguns aspectos do seu universo literário, buscando compreender as condições da produção literária e dos seus artesãos e artesãs da pena. Estamos interessados em conhecer como, em terras africanas, se exercita a arte de escrever. Que áreas de conhecimento são mais trabalhadas na produção literária? Que gêneros literários predominam? Que temas são abordados? Quais as inquietações e os valores dominantes? Do vasto leque de seus representantes - mulheres e homens - quais os que hoje e aqui destacamos?
Nunca é demais insistir, junto aos leitores e leitoras, sobre os riscos de se pretender uma panorâmica satisfatória da produção literária nesse gigantesco e multissecular continente. Contentemo-nos com aflorar alguns elementos.
O que se segue corresponde, por conseguinte, apenas a um primeiro esforço de perfilar algumas das figuras africanas que se têm destacado como produtoras literárias (de romances, de contos, de novelas, etc), com o intuito de estimular a leitura desses autores e autoras, conforme as preferências do leitor, da leitora.
Comecemos por apontar uma inquietação. Em nossa breve incursão, um primeiro cuidado a tomar, diz respeito a superar a tendência a uma folclorização da Literatura produzida por escritores e escritoras da África. Ávidos de conhecimentos e detalhes sobre o assunto, poderíamos sucumbir a uma leitura reducionista da produção artístico-literária dos autores e autoras africanos, de tal sorte a pretender que tal produção se restrinja tão-somente ao universo africano. Há, sim, como em qualquer parte do mundo, contos, romances, novelas, a focalizar gentes e coisas específicas dÁfrica. Assim como há, também, temas literários abordando desafios da condição humana, dentro ou fora do continente africano.
Cometeremos uma leitura reducionista e preconceituosa caso esquecessemos desse “detalhe”... Dificilmente isto sucederia em relação à leitura que fazemos de ocidentais, cujos escritos, não raro, incorporamos como “universais”. Às vezes, com razão, mas nem sempre…
Que não poucos dentre europeus e norte-americanos atribuam caráter de universalidade à sua produção, até podemos entender. O problema é que, com espantosa frequência, são leitores e leitoras dos países periféricos que também introjetam, de modo acrítico, essa chave de leitura. Isso ocorre, aliás, não apenas no campo literário. No plano filosófico e científico, não se passa diferentemente, haja vista a hipertrofia de citações bibliográficas de autores europeus e norte-americanos, em relação não apenas a autores e autoras africanos, asiáticos, da Oceania, mas também em relação aos nossos próprios escritores latino-americanos e brasileiras. Do Nordeste, então, nem se fala…
Como em outras partes do mundo, os temas trabalhados na produção literária africana são de uma enorme variedade. Os autores africano da velha geração se firmaram em cima de temas tais como valorização da imagem dos Negros, recuperação da memória africana, o colonialismo e o processo de descolonização, o exílio, a migração….
Quanto aos da nova geração, referem-se a fatos, acontecimentos e situações do cotidiano, envolvendo relações ecológicas, afetivas, etárias, políticas, de gênero, de etnia, etc, etc.
Diversos igualmente são os gêneros artístico-literários praticados: contos, romances, peças teatrais, autobiografias, poesias…
Que nomes poderíamos destacar, sem a mínima promessa de cobrirmos um leque satisfatório de autores e autoras, mesmo como “amostragem”? Vejamos alguns, começando pelos escritores da velha geração, entre os quais cumpre lembrar Léon Gontran Damas, Aimé Césaire, Lépold Sedar Senhor, Birago Diop, Chinua Achebe, Camara Laye, Tchicaya U Tam’Si, ou Mongo Beti.
Dentre os escritores atuais, destacamos aqui:
Boniface Mongo-Mboussa (Congo), Jamal Mahjoub (Sudão), Kossi Efoui e Sami Tchak (Togo), Aminata Sow Fall, Boubacar Boris Diop e Ken Bugul (Senegal), Joseph Ki-Zarbo (Burkina-Faso), Odile Biyidi (Camarões), Tanella Boni (Costa do Marfim), Michêele Rakotoson (Madagascar), Nimrod (Tchad), Abdourahman Waberl (Djibouti), Virginie Mouanda Kibinde (Cabinda), Chenjerai Hove (Zimbabwe).
Como sugestões de leitura de obras de autoras africanas, a julgar pela síntese feita das mesmas no site www.arts.uwa.edu.au/AFLIT/FEMEChome.html (“Femmes écriveines”), vão os seguintes títulos: Henritee Dakota. Une esclave modern. Paris: Michel Lafon, 2000 (Autobiografia de uma jovem do Togo que, anganada por promessas sedutoras, vai viver em Paris, e cai vítima de cuel exploração; sem dinheiro, sem documento, jogada no olho da rua…); Regina Yaou. La revolte d’Affiba. Abidjan: Les Nouvelles Éditions Adricaines, 1985 (Romance);Angèle Ntyugwetondo Rawiri. Fureurs et cri de femmes. Paris: L’Harmattan, 1989; e Aoua Keita. Femme d’Afrique, Lavie de d’Aoua Keita racontée par elle-même. Paris: Présence Africaine, 1975.
Março de 2005
Nenhum comentário:
Postar um comentário