sábado, 5 de agosto de 2017

PASTORAIS SOCIAIS NA PARAÍBA - EM BUSCA DO REINO DE DEUS E SUA JUSTIÇA, EM TEMPOS TORMENTOSOS E DE ESPERANÇA CONTRA TODA ESPERANÇA: memória, discernimento e compromissos...

PASTORAIS SOCIAIS NA PARAÍBA - EM BUSCA DO REINO DE DEUS E SUA JUSTIÇA, EM TEMPOS TORMENTOSOS E DE ESPERANÇA CONTRA TODA ESPERANÇA: memória, discernimento e compromissos...

Alder Júlio Ferreira Calado

As Pastorais Sociais do Regional Nordeste II (da CNBB), de cuja caminhada fazem parte também as Igrejas particulares da Província da Paraíba, em vista de uma (re)avaliação retroprospectiva de sua trajetória de quase meio século, vêm promovendo – inspiradas, inclusive, na bela contribuição  do livro “Pastoral Social – Dimensão socioestrutural da caridade cristã”, do Pe. Francisco Aquino Junior - reuniões, encontros, círculos bíblicos,  preparatórios para as assembléias provinciais, nessa direção. A Assembléia das Pastorais Sociais da Província da Paraíba está marcada para os dias 11 e 12 de agosto de 2017, a realizar-se em Campina Grande – PB.

Com base no tema proposto para esta Assembléia, cuidamos de fornecer, a título de “aperitivo” ou de problematização,
Alguns elementos que nos permitam pistas de reflexão sobre tantos desafios – velhos e novos – com que nos deparamos. Distribuimos esses subsídios em três momentos organicamente articulados: 1) uma breve rememoração das origens de nossa caminhada; 2) um leve ensaio de discernimento sobre aspectos de nossa gesta político-pastoral; e 3) uma reflexão sobre nossos compromissos ante os desafios sócio-eclesiais de hoje.

1) Em busca de nossas raízes...

Ao longo destas últimas décadas, muita água tem rolado debaixo da ponte. Atravessamos distintas conjunturas sócio-eclesiais, em que nossa gente experimentou momentos de profundas turbulências, dentro e fora dos espaços eclesiais, mas também de muitas lutas, alguns avanços significativos, certos reveses, sem perder a esperança. Com efeito, no curso deste período de cerca de meio século, experimentamos como e com as classes populares sucessivos desafios de monta: o tempo-auge da Ditadura empresarial-militar do Governo Médici (1969-1973), associado às ditaduras do Cone Sul (Chile, Argentina, Uruguais...), às quais Eder Sader se referia como a um “rumor de botas”; vivemos com garra e esperança a crescente resistência à(s) Ditadura(s), o (re)ascenso dos movimentos sociais (partidários, sindicais, populares, estudantis, eclesiais...); as mobilizações pela Anistia, pelas Diretas-Já, pelo impedimento de Collor, pela Constituinte, pelas políticas sociais, pelos direitos humanos, pelas conquistas significativas da primeira década deste século, do ascenso de governos pós-neoliberais na América Latna, contra sucessivas ofensivas neoliberais no país, na América Latina  e no mundo...

  No plano interno à(s) Igreja(s), após um promissor ascenso das CEBs, das PCIs, das Pastorais Sociais (CIMI, CPT, CPO, , CPP, PJMP, PMM, Pastoral Negra, Pastoral da Criança, Pastoral Universitária, etc.), de movimentos (ACR, MER – hoje, MCP, ACO/MTC, MEB, MCU, Movimentos Fé e Política, etc.), serviços (Comissão Justiça e Paz, CDDHs, Cáritas, CEBI, etc.), associações (PATAC, AMC, AMINE, GP-NE, Fraternidade do Discípulo Amado, Escolas de Formação Missionária, além de outras modalidades de atuação eclesial, no campo social, eis que irrompe, expande-se e se fortalece,  a pontir do longo pontificado do Papa João Paulo II (sucedido pelo Papa Bento XVI, da mesma linha pastoral), uma forte ofensiva reacionária e restauradora da Cristandade, com enorme incentivo ao crescimento de movimentos eclesiásticos conservadores. Fenômeno que coincide com o impetuoso ascenso de movimentos similares, no plano de Igrejas neo ou pós-pentecostais...

No decorrer da década de 1980, em especial a partir de  meados desta década, o Vaticano desencadeia uma ofensiva de grande intensidade contra a Igreja na Base e a Teologia da Libertação, no momento em que se apresentava de reconhecida fecundidade profético-pastoral o trabalho da Igreja dos Pobres. Apenas duas ilustrações a este respeito , mais precisamente duas iniciativas (dentre diversas outras protagonizadas pela Igreja na Base):
= a coletânea “Teologia e Libertação”, apoiada por mais de uma centena de bispos latino-americanos, e que contou com a efetiva participação dos principais figuras da Teologia da Libertação latino-americana, com dezenas de livros versando sobre os temas-chave deste novo jeito de teologizar (a partir da vida do povo dos pobres), abrangendo temas como Reino de Deus, Antropologia cristã, Memória do povo cristão, Cristologia, Pneumatologia, entre diversos outros temas-chave, sempre tratados com um novo olhar, isto é,  deste modo latinoamericano de produção  teológica, desde o chão experiencial da vida dos pobres;
= a organização da CEHILA - Comisión de Estudios de la Iglesia Latinoamericana y del Caribe, que se empenhou num projeto pioneiro de pesquisa, de registro e de publicação de um número considerável de livros, recuperando – tanto em linguagem acadêmica, quanto em linguagem popular (CEHILA popular) - sob a perspectiva do povo dos pobres, as trajetórias históricas de diversas Igrejas particulares do continente latinoamericano.

Estas e outras iniciativas, sobretudo após o pontificado do Papa João Paulo II (depois sucedido pelo do Papa Bento XVI), passaram a enfrentar uma sequência de questionamentos, desaprovações, censuras, punições. Montou-se uma poderosa estratégia de desmonte das iniciativas da Igreja na Base, inclusive da Teologia da Libertação, que lhe servia de suporte teórico, principalmente após o Concílio Vaticano II e, em especial, a partir da Conferência Episcopal Latino-americana, realizada em Medellín, na Colômbia  (1968), que havia proclamado a “opção preferencial pelos pobres”.

  fecunda em que se deu tal retrocesso nas organizações de base da Igreja Católica implicando perseguição à Teologia da Libertação e algumas de suas figuras exponenciais; a estratégia de desmonte ou esvaziamento da chamada “Igreja na Base” (desmembramento autoritário da Arquidiocese de São Paulo, contra a vontade do arcebispo e seus auxiliares; fechamento do ITER; intervenção nas universidades e institutos católicos; nomeação e transferência de bipos, com perfil de obediência incondicional à nova linha pastoral imposta por Roma; advertência e medidas punitivas a figuras representativas da Teologia da Libertação; oposição explícita a figuras eclesiais comprometidas com a causa dos pobres, entre outras medidas tomadas.

Em nosso Regional Nordeste II, inclusive na Província da Paraíba, nossas Pastorais Sociais viveram momentos profundamente traumáticos, sobretudo em consequência da sucessão de Dom Helder Câmara por Dom José Cardoso Sobrinho. Tempos de profundo e prolongado desmonte da Igreja dos Pobres, inclusive com a expulsão de vários padres da Arquidiocese de Olinda e Recife, que tiveram acolhida pastoral, na Arquidiocese da Paraíba, por Dom José Maria Pires.

Foi, por outro lado, durante esse periódo de gandes provações, que, gaças ao acolhimento de pastor por parte de Dom José Maria Pires, prosperaram fecundas iniciativas pastorais. Já em meados/finais dos anos 60, começavam a dar sinais alvissareiros, em especial no Agreste paraibano, iniciativas de evangelização animadas pelos pobres do campo, por meio de suas comunidades, a exemplo das que se organizavam em tono da região de Mogeiro, onde tiveram lugar importantes iniciativas litúrgico-pastorais, inclusive com círculos bíblicos, com profundo teor formativo, como foram relatadas no livro de autoria do Pe. Gabriele, “Um Saberzinho de nada”, bem como, um pouco mais tarde, as ações de resistência ao latifúndio, em tempos de Ditadura Empresarial-Militar. Ganhou ampla repercussão a resistência dos posseiros de Alagamar, com as imagens de Dom José Maria, Dom Hélder e Dom Francisco Mesquita, a tangeremo gado das plantações dos agricultores.    

Na década de 1980, uma outra experiência pastoral de reconhecido alcance formativo, em terras paraibanas, mais precisamente no município de Pilões: o Seminário Rural, pouco depois substituído pelo Centro de Formação Missionária (CFM), em Serra Redonda. Uma fecunda experiência, inspirada e animada por uma Equipe de Formadores coordenada pelo Pe. José Comblin. Experiência que, em seguida, teria desdobramentos frutuosos, com mais uma meia dúzia de novas experiências formativas, missionárias, contemplativas, de peregrinação...

Nas décadas seguintes, nossas Pastorais Sociais, em estreita e orgânica parceria com outras organizações de base eclesiais (ACR, MER, CDDHs, o CEDUP, o MTC, o MAC, Comissão de Justiça e Paz, Movimento Fé e Política e outras) e com movimetnos populares do campo e das periferias urbanas, inclusive com organizações como o CENTRU, Fundação Margarida Alvesas organizações de convivência com o Semiárido,  continuaram sua trajetória de resistência e de avaços, em várias frentes, tais como em sucessivas conquistas de assentamentos da Reforma Agrária, com um saldo superior ao do período dos governos do PT; os excelentes frutos das organizações de base, empenhadas em relevantes iniciativas de convivência com o Semiárido (ASA, Cáritas, PATAC, várias iniciativas fecundas atuando na Borborema, no alto Sertão, no Cariri; iniciativas desenvolvidas no âmbito da Pastoral da Criança; o empenho na defesa e na promoção dos grupos indígenas, das comunidades quilombolas, dos trabalhos junto a distintos grupos de Mulheres; iniciativas de grande valia, no terreno agroecológico e de tecnologias alternativas de convivência com a região; empenho nos trabalhos de memória histórica (Memorial das Ligas Camponesas da Paraíba), entre outras.

2) Ensaio de discernimento

No curso de nossa trajetória, temos muito a render graças a Deus, bem como a celebrar. De fato, ao nos pormos a rememorar feitos e gestas de cinco décadas, sentimo-nos profundamente tocados com tantas conquistas significativas alcançadas. Ao mesmo tempo, temos consciência de muitas limitações que também nos acompanha(ra)m. Como nosso desejo é seguir avançando, em nossa caminhada, somos chamados a uma constante (re)avaliação retroprospectiva. Para tanto, inspiramo-nos em balizas que provêm, não da posição de uma corrente teológica – eventualmente esposada por uns, em desfavor de outros -, mas se acham inspiradas nos textos fundantes de nossa crença comum: o Evangelho, a cujas diretrizes somos todos chamados a responder, com generosidade, lembrados do que Jesus nos adverte: “Não foram vocês que escolheram, mas fui Eu quem os chamei, para que vocês vão e dêem fruto, e este fruto permaneça.” (Jo 15, 16). De que fruto se trata, senão de respondermos ao que o Espírito do Ressuscitado nos inspira de justiça, de paz, de solidariedade, de partilha, de amor, de misericórdia? Em especial, em nossas relações com o povo dos pobres? A despeito de nossos limites, não era um tanto isso que buscávamos testemunhar naquelas primeiras décadas, e que, em grande medida, deixamos para trás, seduzidos pelos atalhos político-eleitoreiros movidos pelo aliancismo, em que acabomos por privilegiar? Os bons frutos que semeamos, junto com o povo dos pobres, permaneceram mesmo ou restaram como “coisas do passado”?



Busquemos fazê-la, também em mutirão, por meio de questionamentos que nos ajudem, nesta empreitada.

Tendo sob nossa mira auto-avaliativa, significiativas conquistas alcançadas  vale a pena que nos perguntemos, por exemplo:
= Que condições objetivas e subjetivas nos permitiram alcançar tais conquistas, em especial aquelas que se mostram bem resistir à nova ofensiva neoliberal?
= Elas têm ou não muito a ver com o nosso jeito de nos organizar? Quem tomava as decisões? Como elas eram tomadas? A quem recorríamos para obtermos ajuda e apoio?

= Até que ponto conseguimos, a contento, dar sequência ao processo de formação contínua, que nos forneceu preciosas ferramentas conceituais e da prática prática, no processo dessas conquistas, e para além delas?
= Há ou não diferença considerável entre “conquistas” concedidas (de cima para baixo) e conquistas resultantes de nosso processo de luta, com autonomia, seja em relação ao Mercado, seja em relação ao Estado?
= Sem ignorar vantagens (em geral, mais de ordem pessoal do que em relação às nossas organizações de base), qual é mesmo o verdadeiro saldo de nossa opção por ocupar os espaços governamentais?
= Quais os verdadeiros frutos de nossa opção, a partir das últimas décadas, por aproximar-nos, como nunca antes havíamos feito, do campo partidário e eleitoral, distanciando-nos (em alguns casos, até abandonando) a saudável postura de um necessário distanciamento crítico das instâncias governamentais e das forças do Mercado?
= Mesmo no plano especificamente eclesial, constatamos diferenças acentuadas entre a forma de nos organizarmos nas décadas de 70 e 80 e como vimos nos organizando nas últimas décadas. Trata-se de diferenças  substancialmente favoráveis ou, antes, em grande parte, equivocadas? Um exemplo concreto: nos círculos de cultura, nos núcleos, nos encontros, nas assembleias ou nas reuniões ordinárias, tínhamos sempre o cuidado de superar a tendência a uma aposta desmedida no protagonismo individual, em prejuízo do protagonismo comunitário. Será que tal postura não foi significativamente negligenciada ou mesmo abandonada, em favor de uma aposta cega em “salvadores” individuais ou de pequenos grupos?
= Diferentemente de um apoio crítico a forças partidárias aliadas, que mantínhamos,  nas primeiras décadas, será que não nos afastamos demasiado desta saudável postura ético-política, à medida que passamos a um alinhamento quase automático ou incondicional a forças partidárias, ainda quando tínhamos consciência  do seu perigoso distanciamento das bases e de posições ético-políticas, que sempre defendemos? (  Pensemos, por exemplo, na campanha “Ética na Política”, em meados dos anos 90.

= No modo de nos organizarmos junto com o povo dos pobres, inclusive no processo formativo, quando é que mais nos aproximamos do núcleo da mensagem do Evangelho e da Tradição de Jesus (cf., por ex., Mc 10, 42-45: “Entre vocês não seja assim”...), com a qual tão bem se afina o espírito das conclusões de Medellin, hoje atualizado na gesta de Francisco, Bispo de Roma:
* nas primeiras décadas de nossa caminhada pastoral, quando lutávamos por uma nova sociedade, ou
*nas últimas décadas, quando preterindo do sonho da construção de uma nova sociedade, sucumbimos à ilusão de lutar por um “novo Estado”? Em termos de denúncia-anúncio, o que nos inspira o Espírito do Ressuscitado? Aonde nos tem levado a teimosia de nos conformarmos com as estruturas do Estado? Serão mesmo estruturas renováveis ou, antes, isto tem significado tentar pôr “remendo novo em pano velho”? “Pelos seus frutos, vocês os conhecerão.”).

3. Renovando/atualizando nossos compromissos de cidadã(o)s e de cristã(o)s

Sabemos que só faz sentido para nós ensaiarmos passos de avaliação de nossa caminhada, se - e somente se – implicar sinceros propósitos de mudança e conversão, tanto no plano comunitário, quanto no âmbito pessoal. Eis o sentido do que estamos propondo como pistas de uma (auto)avaliação retroprospectiva, à luz da caridade assumida como dimensão pastoral socioestruturante: não nos basta rememorar o que foi (bem ou mal) feito. É fundamental voltarmos os olhos e o coração para frente, como é que vamos caminhar, daqui por diante. Que passos somos historicamente chamados a ensaiar, em vista de testemunhar, nos vários campos de atuação sócio-pastoral, nossa ação transformadora em nós, seja nos espaços de atuação cidadã, seja ao interno de nossa(s) Igreja(s)?
Nesse sentido, graças a Deus e à generosa dedicação de vários grupos espalhados pela nossa Paraíba, alegramo-nos com diversas experiências fecundas que já vêm acontecendo, e que somos chamados a consolidar e ampliar. Por outro lado, há também muita estrada a percorrer, nessa direção. Exemplifiquemos algumas urgências a serem enfrentadas, no campo e na cidade, a desafiarem nossa ação pastoral e – conforme a natureza de cada um desses sujeitos e sua adequada relação: no caso das Pastorais Sociais, sempre atuando como um serviço cristão no meio do povo dos pobres, sem reivindicar “paternidade” em sua ação de caridade gratuita, pela força do Ressuscitado.
·        Considerando que o amor cristão nos move a agir em atos concretos, convém lembrar, para além de nossas fronteiras paroquiais e diocesanas, a marca universal ( isto é, tomando em consideração as dores, as lutas e as esperanças de toda a humanidade) de nossa vocação de Batizados – “ sacerdote, profeta e rei” ( isto é: pastores, profetas e cidadãos ). Neste sentido, sem prejuízo de nossa ação pastora local, sentimo-nos comprometidos com os grandes dramas presentes da humanidade, seguindo os passos da Tradição de Jesus. Fazendo nossas estas situações dramáticas, lançamos sobre cada uma delas nosso olhar solidário, em relação às graves consequências das guerras em curso, a afligirem enormes parcelas das populações do Oriente Médio, da África e de outras regiões,  na Ásia, em nossa América Latina...

Solidarizamo-nos com as vítimas da profunda chaga social das migrações forçadas e dos refugiados, em várias partes do mundo. Trazemos como tarefa também nossa tomar conhecimento e combater as causas das diversas e crescentes formas de violência espalhadas pelo mundo, inclusive entre nós: as várias formas de agressão contra a Mãe-Terra; genocídio; etnocídio; racismo; feminicídio; misoginia; tráfico de pessoas, de armas e de drogas; formas modernas de escravidão, homofobia, xenofobia, ódio de classe, as situações sofridas pelos povos de rua, os sem-terra, os sem-teto, os povos das águas, das florestas, os povos tradicionais, ribeirinhos, os desempregados, os sub-empregados....

Eis um panorama de nosso campo de missão. Assustam-nos sua complexidade e vastidão, quando temos consciência de nossas limitações ( pessoais e coletivas ). Consola-nos, todavia, o lembrete paulino acerca da Graça: “ A minha graça te basta, porque o meu poder se aperfeiçoa na fraqueza.” ( 2cor 12,9 ). Sabemos, por um lado, que, dadas as nossas limitações, sentimo-nos impotentes para responder, a contento, a tais desafios, mas, por outro lado, somos chamados e encorajados a enfrentá-los, a curto, médio e longo prazos, a partir do chão do dia-a-dia. Uma primeira pista, neste sentido, é atentarmos para o alcance sistêmico, globalizado desses desafios, profundamente interconectados pelo modelo capitalista, apontando pra necessidade e urgência de um novo modo de produção, de um novo modo de consumo e de um novo modo de gestão societal, em harmonia com a dignidade do planeta e de toda a comunidade dos viventes.
Sucede que é, a partir do local, que somos chamados a agir  na atualidade  de modo a nos comprometer com efetivas mudanças, a partir do chão de nossa realidade.

Alguns questionamentos nos sirvam de aperitivo para uma busca de discernimento sobre os desafios nossos a merecerem prioridade de enfrentamento, de nossa parte.

= Examinando nossa ação pastoral, à luz da ação transformadora da Caridade cristã, como prosseguirmos, em novo estilo, nossa ação pastoral, frente aos graves desafios da atual conjuntura? Sucumbindo a velhos esquemas de fazer Política, com falsas polarizações, ou (re)orientando nossa ação pastoral, de modo a recuperar o espírito de enraizamento, convívio e comprometimento com o povo dos pobres, do campo e da cidade, desde suas necessidades e aspirações libertadoras?

= Conforme os critérios da Caridade socioestruturante (também) da vida pastoral e do Reino de Deus e Sua justiça, que experiências frutuosas, em curso, merecem continuar sendo animadas e consolidadas por nós?
* no âmbito dos trabalhos atinentes aos cuidados sócio-ambientais comprometidos com a nossa “Casa Comum”, seja no âmbito da produção, seja no tocante ao consumo, seja no plano da gestão comunitária?

* No tocante às experiências no terreno das relações sociais de gênero (trabalhos de apoio, de acompanhamento, de formação, de defesa e promoção da dignidade das mulheres vítimas de violência de todos os tipos, a começar pelo feminicício?

* Nos trabalhos e experiências, no âmbito das relações étnicas, de defesa e promoção dos direitos dos povos originários, das comunidades quilombolas, dos povos das águas, das florestas, dos ribeirinhos, dos pescadores...?

* Nos trabalhos e experiências mais diretamente voltadas para as relações geracionais, na defesa e promoção dos direitos das crianças, dos adolescentes, dos jovens, das pessoas idosas?

* Nos trabalhos e experiências com os Trabalhadores e Trabalhadoras do campo e da cidade, incluindo as experiências de acompanhamento e apoio às vítimas do desemprego, do sub-emprego, do trabalho terceirizado, das vítimas de tráfico humano, de armas e de drogas, das formas dissimuladas de trabalho escravo?

* Nas experiências de solidariedade e acompanhamento do cotidiano do povo da rua, das vítimas de migração forçada, dos refugiados, das vítimas de prostituição, das vítimas de expulsão em razão de barragens, de implantação de equipamentos montados a pretexto de renovação de fontes energéticas, à revelia ou sem a participação das comunidades locais?

·        Movidos pela convicção da necessidade e urgência de uma (auto)avaliação retroprospectiva, como vamos nos organizar para retomar, em novo estilo, nossos compromissos nos mais distintos trabalhos e experiências pastorais, priorizando e pondo em prática critérios organizativos (animação dos círculos de cultura, dos círculos bíblicos, do protagonismo de todos na tomada de decisões pela base, na alternância de cargos e funções, na observância do princípio da delegação, no cuidado da relação com as diferentes instâncias pastorais, na promoção da autonomia relativa frente ao Mercado e ao Estado...) e formativos ( formação permanente a ser assegurada não apenas aos coordenadores, mas igualmente à base, na perspectiva de uma  Educação integral, em diálogo com a Educação Popular).
       João Pessoa/Olinda, 5 de agosto de 2017

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