quinta-feira, 1 de março de 2018

TRAÇOS DA MÁE-ÁFRICA: em busca de nossas raízes (XXXV)


Alder Júlio Ferreira Calado

Provérbios africanos. À semelhança do que se dá em povos de outros continentes, também entre os povos da África os provérbios constituem uma das marcas relevantes de sua expressão cultural. Aludem ao seu sentir, ao seu pensar, ao seu agir, ao seu querer. Expressam uma importante dimensão de sua sabedoria, à medida que sinalizam a tessitura das relações de seu cotidiano, sua visão de mundo, de ser humano e de organização das relações comunitárias, societais, com a Mãe-Natureza e com o Sagrado.
    Aqui nos limitamos a esboçar um quadro bastante superficial e fragmentário do complexo e vasto universo de provérbios relativos a diferentes povos milenares de um continente gigantesco. Com a agravante de que os recolhemos em páginas virtuais em línguas ocidentais, o que implica provavelmente a incidência de critérios seletivos de não-africanos.
    Ainda assim, vale a pena esboçarmos aqui alguns desses provérbios, a título de um aperitivo para os leitores e as leitoras interessados em seguir adiante. Iniciamos com alguns que aludem à importância da ação, da tomada de iniciativa, do protagonismo: “Só se pode ajudar um boi a levantar-se, se ele fizer sua parte”, até porque “Quem quer mel, deve ter a coragem de enfrentar as abelhas.” Não esqueçamos de que “Deus fez apenas um esboço do ser humano. Cabe a cada um desenvolver-se na Terra.”
Protagonismo nem sempre acolhido pela nossa insana inclinação de atirar pedras em quem ousa tentar, ainda que não logrando êxito: “Que aquele que não fez a travessia não zombe de quem se afogou”, pois “O erro não anula o valor do esforço realizado.” Além do que “É tentando, sempre, que o macaco aprende a pular.”
    São vários os provérbios que aludem à sabedoria da convivência. Um deles sublinha a dimensão da autonomia, no processo formativo: “Anda na frente de ti mesmo, como o camelo que conduz a caravana.” Saber conviver requer a compreensão da força do coletivo presente na própria relação familiar: “Para educar uma criança é preciso toda uma aldeia”, o que nos ajuda a compreender que “Nós somos mais filhos do nosso tempo do que filhos do nosso pai.” Outro chama a atenção para a importância do velho na formação do novo: “É na ponta da corda velha que se tece a nova.” Importante também é pôr-nos à escuta de quem, ao longo do viver, acumulou experiência e sabedoria: “O que um velho vê, deitado, um jovem não alcança, mesmo de pé.”
    Saber viver requer também prudência. Isto implica, por exemplo, evitar precipitações, donde o alerta: “Não derrame a água do pote, só porque parece que vai chover.” Implica cabeça fria, atenção aos sinais e criatividade, diante dos equívocos: “Quando já não souberes para onde vais, lembra-te de onde vens.” Mais: “Ovo não dança com pedra.” Como também requer ousadia, pois: “Quem rema no sentido da correnteza faz rir o crocodilo.”
    É preciso que exercitemos muita autovigilância, ao pretendermos criticar os outros, pois “O macaco não vê o ´galo´ que tem sobre a própria cabeça.” Atitude de autocrítica tanto mais necessária quanto sentimos o nível dos desafios que enfrentamos, em nossos dias, em que a verossimilhança da indústria do “marketing” pretende anular qualquer busca de verdade, ensejando uma corrida alucinada de produção de falsas imagens, ao sabor dos caprichos da vaidade mais torpe, que pode nos fazer esquecer que “O macaco quanto mais alto sobe na árvore, mais expõe seu traseiro.”
    Outro enfoque explorado pelos provérbios africanos tem a ver com o deslumbramento dos seres humanos com a Mãe-Natureza: com os elementos fundamentais, com as estrelas, com as montanhas, as florestas, as flores, os animais... É o que podemos perceber, ao destacar esse provérbio: “A prosperidade das árvores reside no bem-estar dos pássaros.”
O espaço está terminando, e mal conseguimos esboçar um ou outro provérbio do universo africano. Mesmo pretendendo dar prosseguimento, nos próximos números, continuamos conscientes dos limites. Contentamo-nos com o propósito de que sirvam, pelo menos, como aperitivo, pois  “Quem sabe usar os provérbios, pode contornar dificuldades.” Fontes:

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