sexta-feira, 2 de setembro de 2016

A propósito da excomunhão na Igreja Católica

Seguimos – de um modo ou de outro – solidários a Martha e a Gert, as mais recentes vítimas de extrema e inaceitável medida punitiva, destavez por parte de Dom Manfred Scheuer, Bispo da Diocese de Innsbruck (Àustria).
Temos, com efeito, recebido mensagens de solidariedade a Marha e a Gert, desde os diferentes continentes – América Latina, América do Norte, Europa, África, Ásia e Oceania. Em diversas partes do mundo, muitas pessoas sentiram-se escandalizadas com medida tão extrema e obsoleta – “Excommunicatio sententiae latae”…
Recorrer a uma exacerbada punição de excomunhão – pior ainda, sob a forma de”sententiae latae”, com efeito automático, sem direito a defesa, com base num dispositivo do Código de Direito Canônico, soa como um ato de violência simbólica.
Recorrer a tal medida, com base num dispositivo deste código, cuja natureza não responde ao “sensus fidelium” atual, traz, ao mesmo tempo, implicações graves:
– Faz ouvidos moucos à recomendação evangélica de amplo diálogo fraterno como a forma de se lidar com o dissenso;
– Despreza o espírito do Concílio Vaticano II, quanto à necessidade de “retorno às fontes evangélicas”, ao “aggionamento” (“Ecclesia semper reformanda est”), ao diálogo entre os Católicos, buscando auscultar o “sensus fidelium”, no qual o Espírito Santo atua;
– Opõe-se ao espírito de diálogo que o Papa Francisco vem, não apenas pregando, mas sobretudo testemunhando, inclusive em sua recente e abençoada Exortação Apostólica “Evangelii Gaudium”;
– Escandaliza ou contraria as legítimas expectativas que, de todas as partes do mundo, vêm expressando cristtãos, católicos, evangélicos, não-cristãos, judeus, muçulmanos, budistas, crentes das mais diversas expressões religiosas, não-crentes, ateus, todos positivamente tocados com o testemunho do Papa Francisco.
Diante dessas breves considerações, perguntamos:
– A quem interessa mesmo recorrer a uma medida tão extrema quanto de triste memória?
– Marha e Gert Heizer constituem apenas as vítimas mais recentes desta posição extremada, mas será que são apenas essas as vítimas, ou todos nós, católicos e católicas, solícitos ao “sensus fidelium” também nos sentimos alcançados, de algum modo, por tão extremada medida?
– Se o autor de tal medida – “Excommunicatio sententiae latae” – se diz colaborador da Igreja e do Papa, onde reside sua pretensa colaboração?
– Quem divide mesmo a Igreja e escandaliza o mundo?
– Seguindo fielmente nossa consciência de cristãos-católicos, com base no espírito do Evangelho (“Eu não vim para condenar o mundo, mas para salvar o mundo”, João 12, 47); no espírito do Concílio Vaticano II, na proposta pastoral e no testemunho evangélico do Papa Francisco, será que devemos levar a sério essa medida, e sentir-nos todos excomungados pelo capricho de uma única pessoa ávida de poder, ou devemos antes seguir resistindo e lutando por urgentes reformas das estruturas caducas, desprovidas de sensilidade evangélica e histórico-contextual?

O autor é membro de Kairós/Nós Também Somos Igreja – Brasil)

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