Como tem sido noticiada, prossegue, esta semana (de 27 a 31.07.2016), na Polônia, a 31ª. Jornada Mundial da Juventude, com a participação animadora do Papa Francisco.
Desde o voo em direção à Polônio, ele não perde tempo: expressa sua posição crítica em relação ao caráter dos conflitos contemporâneos em curso, rechaçando a tese de uma suposta “guerra de religiões”. Ainda que, aqui e ali, possa passar algum traço de caráter (também) religioso – por exemplo: Islam contra cristãos -, o Papa acentua, a justo título, raízes escondidas ou pouco expressas pela mídia ocidental. Os graves conflitos atuais têm a ver, sobretudo, com as relações sociais, econômicas, políticas vigentes. Relações com as quais têm a ver o drama das migrações forçadas, a trágica situação dos refugiados, o inferno dos conflitos armados no Iraque, na Síria e região adjacente, a sangria das fontes naturais, o próprio desafio do terrorismo… De repente, de modo vulpino, tudo se transforma em “guerra de religiões”… cf.
Após uma acolhida calorosa pelos católicos poloneses e, em especial, pelos jovens participantes da Jornada Mundial da Juventude/2016, põe-se a cumprir uma sucessão de compromissos pastorais, além de participação em atos litúrgicos. Foi tocante sua reflexão, na homilia pronunciada em sua primeira celebração litúrgica. Nesta, enfatiza o contraste entre os valores do Reino de Deus e os valores de nossa cultura. Desde a inserção de Deus em nossa história, por meio do Seu Filho Jesus de Nazaré, “nascido de uma mulher”, manifestam-se opostos tais valores. Enquanto era esperado um Messias onipotente, chefe de exércitos, este Deus nasce pobre, frágil, sem poder, em forma de um bebê dependente de sua mãe. Mais: não apenas vive entre os pobres, vive também pobremente, assume a causa libertadora dos pobres, a ponto de não hesitar investir contra os poderosos do seu tempo – fossem eles autoridades religiosas ou políticas -, razão por que seria perseguido, preso, torturado, crucificado entre condenados. Sua primeira homilia pode ser (re)escutada pelo “link”:
https://www.youtube.com/watch?v=KpUSQZNdzWw
https://www.youtube.com/watch?v=KpUSQZNdzWw
A escuta desta homilia me remeteu a um canto que, durante a Semana Santa, se costuma entoar: “Eles queriam um grande rei / Que fosse forte e dominador / E por isso não creram nEle / E mataram o Salvador”.
Não menos impactante foi sua homilia, pronunciada durante a Missa, da qual estiveram a participar padres, religiosos, religiosas e seminaristas. A íntegra desta homilia pode ser lida, por meio do “link”:
Desta homilia, vale destacar vários pontos, dentre os quais:
– sua leitura profundamente contextualizada da Sagrada Escritura, revelando assim sua profunda espiritualidade;
– a forma didática como procede à sua reflexão, ao distribuir sua reflexão em três aspectos diretamente inspirados na leitura do trecho lido, extraído do Evangelho de João: “um lugar, um discípulo e um livro”
– a forma didática como procede à sua reflexão, ao distribuir sua reflexão em três aspectos diretamente inspirados na leitura do trecho lido, extraído do Evangelho de João: “um lugar, um discípulo e um livro”
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Como em tantos outros aspectos, também neste, saltam à vista afinidades múltiplas entre a intuição analítica do Papa Francisco e a de figuras proféticas como a do Pe. José Comblin. Em seu livro póstumo, O Espírito Santo e a Tradição de Jesus.São Bernardo do Campo, SP: Nhanduti Editora, 2012. Comblin desmascara e denuncia as garras cruéis de poderosos representantes da religião secular, que é a do deus Mercado (inclusive citando os exemplos do General Videla, da Argentina, e do ex-presidente Bush, a cometerem atrocidades, justamente em nome desse deus… (cf. pp. 462ss).
A quem não acompanha mais de perto as intervenções do Papa Francisco, e com frequência recebe mensagens da lavra deste papa, pode parecer um exagero ou uma superestimação da figura do bispo de Roma, por parte de quem envia tais mensagens. Apresso-me, de minha parte, em garantir-lhes que não é o meu caso. O empenho em compartilhar falas e textos de Francisco, Bispo de Roma, tem a ver com a densidade e relevância, para o nosso tempo, de seus gestos, de suas falas, de seus escritos. Como gostaria de que os destinatários e destinatárias dedicassem um tempinho a testarem essa minha avaliação! Não haveriam de se decepcionar!
A caminho dos seus 80 anos, o Bispo de Roma tem-se mostrado incansável missionário, a peregrinar pelos quatro cantos do mundo, a anunciar e testemunhar o Reino de Deus e Sua justiça. Nesses três anos e meio de exercício do papado, a despeito dos profundos limites impostos por uma instituição pesada, “auto-referenciada”, o Bispo de Roma tem surpreendido, mais do que os católicos e reformados, parcelas significativas do mundo atual, pela força e fecundidade evangélicas do exercício de sua missão.
Fala mais por seus gestos do que por palavras e escritos. Desde esta característica, tem-se mostrado como um autêntico discípulo de Jesus de Nazaré. Nas pegadas dEste, Francisco não se apresenta, em primeiro lugar, como um defensor do “establishment” – nem eclesiástico nem “cristão”, nem da ordem macrossocial hegemônica. Anuncia o “Reino de Deus e Sua justiça”: a primazia dos pequenos e mais vulneráveis, o cuidado com as ovelhas perdidas, a ira profética contra os poderosos deste mundo e suas maquiavélicas tramas de poder, a conversão, o perdão, a misericórdia, o valor das coisas “miúdas” do cotidiano, a alegria como uma das qualidades mais marcantes dos cristãos, a cultura do encontro, do diálogo, o constante chamamento à construção de pontes entre os humanos em conflito, a insistência de seu convite aos católicos e aos cristãos, de “saírem em missão”, preferindo uma Igreja que se arranhe pelo caminho a uma Igreja adoecida pelo mofo das sacristias… Sobre este tema, o Papa é recorrente, em gestos, palavras e escritos. Inclusive, por ocasião de sua participação na 31ª. Jornada Mundial da Juventude, cf. sua homilia:
https://www.youtube.com/watch?v=1LwulF7pCUM
https://www.youtube.com/watch?v=1LwulF7pCUM
a qual pode ser lida, em sua versão escrita, no “link”:
Duas curiosidades sublinho, de passagem, acerca de seu empenho e desempenho. Uma primeira: a absoluta surpresa de sua eleição – ou mais precisamente: de que, eleito papa, viesse a comportar-se assim. Nada na recente conjuntura eclesiástica acenava para semelhante desfecho. Pelo contrário: após mais de três décadas de pontificados típicos, as chances maiores acenavam, antes, para um contiuísmo. Mais uma vez, ao longo da história do Povo de Deus, a ação imprevisível do Espírito Santo!
Como apreciaria ver semelhante empenho e desempenho mostrados por Francisco, acompanhados mais de perto por tantas figuras de leigas, de leigos, de religiosas, de religiosos, de diáconos, de padres, de bispos… Por ex., que atenção têm merecido de nossa parte seus principais escritos – “Evangelii Gaudium” e “Laudato si”
Olinda, 30 de julho de 2016
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