sexta-feira, 2 de setembro de 2016

Em busca de balizamento ético-político (também) em tempos de embates eleitorais

Nosso agir se acha constantemente desafiado pelos nossos limites humanos, em contínua tensão com nossas potencialidades. Seres finitos, inacabados, e, ao mesmo tempo, vocacionados a nos completarmos enquanto humanos, estamos continuamente sujeitos a deslizes éticos, razão da necessidade de maior autovigilância, tendo em vista os apelos que sentimos em direção a um processo menos imperfeito de humanização.
Nossos limites se apresentam mais vulneráveis em contextos especiais, como o que nos envolve em virtude, por exemplo, dos embates político-eleitorais. Nossas paixões aquí se acendem sobremaneira. E eis-nos, não raro, a cometer sucessivos deslizes, inclusive no exercício de análise, de modos diversos:
– ora omitindo ou negando valores nos adversários;
– ora carregando nas tintas positivamente em relação aos nossos candidatos, omitindo seus limites;
– ora ampliando desproporcionalmente os defeitos alheios, ao tempo em que passamos ao largo em relação aos dos nossos candidatos;
– ora atrevendo-nos a extrair de premissas dos adversários conclusões mais amplas do que nos permitem as mesmas premissas, ao tempo em que fazemos o inverso, quando se trada dos nossos; e assim por diante.
Tal situação se complica sobremaneira, quando os/as analistas gozam de especial referencia no plano ético, uma vez que bem maior é seu poder de influência no referido processo. Nossa pergunta é: será que não nos é possível aprimorar nossa autovigilância ético-política, em todos os tempos, mas especialmente nos contextos mencionados?
Com o propósito de contribuir para realimentar ese debate, permito-me levantar alquns questionamentos, em busca de balizamento ético de nossas análises:
– No exercício de apreciação crítica das situações sob análise, será que estamos atentos a utilizar, com o desejável rigor ético-político, a mesma “régua” para as distintas partes em embate eleitoral?
– Como costumamos fazer – até excessivamente! – em relação às forças a que nos aliamos, será que, na apreciação crítica das forças adversas, tratamos de ver o conjunto de suas propostas programáticas, ou espertamente pinçamos os pontos que nos interessam à crítica contundente, omitindo às vezes pontos essenciais das propostas adversárias, do que resulta, não raro, a completa desfiguração da essência da proposta em exame?
– Será que muitos dos vícios apontados, a justo título, e criticados nas forças adversárias não são também compartilhados, em grande parte, pelas forças que apoiamos, e que espertamente omitimos, ignoramos ou negamos?
– Será que nos sentimos verdadeiramente livres para analisar críticamente nossos aliados, se e quando direta ou indiretamente deles recebemos alguma forma de benefício? Nessa condição, teríamos a melhor oportunidade de um pronunciamento ético, disposto a reconhecer acertos, sem omitir nem vícios vícios apresentados?
– Até que ponto uma convivência orgánica e por demais próxima com seus representantes nos permitiría o mínimo de distanciamento necessário para o livre e responsável exercício da crítica, da denuncia profética, quando é o caso?
– Será que, pondo-nos tão íntimos dos representantes das forças que apoiamos, não corremos o risco de um envolvimento afetivo eticamente comprometedor, a ponto de nos tornamos mais fiéis aos amigos do que à causa que abraçamos, mais “amigos de Platão do que de bons critérios de discernimento, parafraseando o conhecido dito “Λατρεύω Πλάτωνα, αλήθεια, περισσότερο” (“Amicus Plato sed magis amiga veritas”):?

– Onde mesmo se faz mais fecunda e necessária a contribuição de intelectuais de reconhecida referência: desgastando-se à toa em intervenções temerárias, suscetíveis de sucessivos deslizes e contradições (até em relação a escritos e análises recentes) ou seguir contribuindo com sua capacidade ética de problematização e chamamento à reinvenção, em busca, não de um novo Governo ou de um novo Estado, mas de uma nova sociedade, alternativa à barbarie do Capitalismo?

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